O sucesso no tempo de avaliação do concurso de projetos da FCT (e o camuflar da taxa de aprovações)
Os aspetos positivos e negativos do último Concurso de Projectos de Investigação Científica e Desenvolvimento Tecnológico (IC&DT) em todos os domínios científicos, divulgados a 28 de julho.
A comunidade científica nacional foi apanhada de surpresa com o anúncio feito esta quarta-feira pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT): passados pouco mais de quatro meses, estavam anunciados os resultados do último concurso de projetos em todas as áreas científicas.
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A comunidade científica nacional foi apanhada de surpresa com o anúncio feito esta quarta-feira pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT): passados pouco mais de quatro meses, estavam anunciados os resultados do último concurso de projetos em todas as áreas científicas.
Este é um facto histórico que merece ser louvado e a comunidade científica nacional só pode esperar que não seja caso único e que, de uma vez por todas, a FCT tenha conseguido encontrar um processo administrativo que permita aproximar-se das congéneres europeias em relação ao tempo necessário dedicado a todo o processo (administrativo e científico) associado à avaliação das candidaturas nacionais. Para melhor enquadramento, os anteriores concursos da FCT (de projetos e emprego científico) tinham demorado entre seis a nove meses nas fases de avaliação científica.
Se por um lado esta é uma boa notícia, receio que o bom desempenho da FCT na gestão deste concurso (no que diz respeito ao tempo necessário para a divulgação dos resultados) possa levantar um grave problema para todos os investigadores que tiveram a sorte de conseguir um projeto aprovado neste concurso, mas que fazem parte das centenas de projetos aprovados no concurso de 2017, ainda em execução. Isto pode resultar em projetos aprovados agora para financiamento, mas que as regras da FCT poderão levar a que sejam cancelados. Passo a explicar. Existem três razões que contribuem para este problema: (i) a necessidade de se contabilizar a dedicação dos investigadores para cada projeto submetido (um critério muito importante para a avaliação do projeto); (ii) o histórico dos processos de avaliação da FCT; (iii) e a pandemia da covid-19.
A dedicação dos investigadores aos projetos FCT é um assunto muito importante e ao qual dedicarei, oportunamente, mais atenção. Mas, de forma resumida, se um investigador se compromete a ter 100% do seu tempo de trabalho dedicado a um (ou mais projetos), não pode (ou não deve) assumir novos projetos, até que os anteriores terminem. Ora, pelo histórico dos concursos da FCT, diria que todos os investigadores estavam à espera de receber estes resultados mais para o final do ano e, portanto, assumiram os seus compromissos de dedicação a projetos com base nesse histórico.
Isto é relativamente importante devido ao concurso de projetos de 2017, que financiou um recorde de 1618 projetos (muito superior aos 551 projetos de 2021, ou 312 em 2020). Isto significa que temos uma boa parte dos investigadores associados a projetos de 2017, que já deveriam ter terminado, caso não tivesse surgido a pandemia. No entanto, devido aos vários estados de emergência que assistimos nos últimos dois anos, receio que o prazo de execução de grande parte desses projetos teve que ser prorrogado por mais meses, o que agora complica o início de novos projetos. Isso não seria um problema se a FCT contabilizasse a dedicação dos investigadores a projetos com uma base anual, tal como acontece em projetos europeus.
No entanto, a FCT continua a utilizar uma fórmula totalmente desatualizada, que assume um valor médio de dedicação, e que obriga um investigador a assumir uma dedicação a um determinado projeto, durante toda a vigência do projeto, mesmo quando, na realidade, o envolvimento do investigador possa ocorrer apenas durante uma fração da duração do projeto. Isto porque a FCT não está a ter em conta o facto de cada vez mais os projetos de investigação serem feitos em colaboração entre várias instituições, e que é perfeitamente normal que vários investigadores estejam envolvidos numa determinada fase do projeto, estando livres desse compromisso noutras fases. Espero que haja bom senso para resolver eventuais problemas e que se use este caso para se promover a necessária e importante reforma da contabilização da dedicação a projetos de investigação pela FCT.
Numa nota negativa, a FCT continua a comunicar as taxas de aprovação destes concursos de uma forma menos transparente para tentar, artificialmente, aumentar as taxas de sucesso destes concursos. Tal como amplamente criticado pela comunidade científica no ano passado, desde 2020 que a FCT passou a considerar, de forma errónea, que os projetos submetidos para avaliação cuja classificação seja inferior a Muito Bom, devem ser excluídos das estatísticas, como se as 1440 equipas de investigação cujos projetos tiveram uma classificação de Bom no concurso de 2021 não tivessem perdido meses a preparar as suas candidaturas.
Um olhar sério para os números divulgados esta quarta-feira permite concluir que apenas 6,2% (e não 8,7%) dos projetos de três anos e apenas 34,5% dos projetos exploratórios (e não 56,7%) foram aprovados para financiamento. Isto resulta num total de 11,3% de taxa de sucesso do último concurso e não de 16,3%, um valor mais próximo da média dos concursos da década anterior. Sim, devemos tentar atingir a meta dos 20% de taxa de sucesso dos projetos, mas esse objetivo só será possível com mais investimento em ciência, e não com manipulações estatísticas de mau gosto.
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico