A transformação digital da biologia chegou e veio para ficar
A biologia moderna não é só feita nos laboratórios tradicionais, usando pipetas, tubos de ensaio e microscópios. Está cada vez mais nos laboratórios computacionais, onde se desenvolvem e aplicam os algoritmos para extrair informação dos dados biológicos e onde se criam modelos que permitem simular sistemas biológicos e gerar novos dados.
A rapidez com que as vacinas contra a covid-19 foram desenvolvidas são prova dos extraordinários avanços da ciência nas últimas décadas. Um dos pontos fortes da ciência moderna, que nos permite avançar tão rapidamente, é a colaboração entre áreas e o surgimento de novas disciplinas, na interface entre as áreas tradicionais do saber. A biologia computacional é um caso exemplar, pois usa métodos matemáticos, físicos e computacionais, conjugados com o conhecimento biológico, para entender a vida.
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A rapidez com que as vacinas contra a covid-19 foram desenvolvidas são prova dos extraordinários avanços da ciência nas últimas décadas. Um dos pontos fortes da ciência moderna, que nos permite avançar tão rapidamente, é a colaboração entre áreas e o surgimento de novas disciplinas, na interface entre as áreas tradicionais do saber. A biologia computacional é um caso exemplar, pois usa métodos matemáticos, físicos e computacionais, conjugados com o conhecimento biológico, para entender a vida.
O código genético do vírus responsável pela covid-19, o SARS-CoV-2, foi partilhado apenas 12 dias depois do reporte da doença. Este código é uma “impressão digital” do vírus. Permite-nos saber a que família pertence e que características tem, e possibilitou às farmacêuticas começarem de imediato a trabalhar nas vacinas que hoje temos. Isso não seria possível sem os algoritmos computacionais capazes de decifrar este código, para além do conhecimento de vírus similares.
Os mesmos algoritmos foram usados na deteção de novas variantes, e são essenciais para seguirmos as alterações no vírus. Também na epidemiologia, a biologia computacional tem um papel fulcral. É através de simulações computacionais, usando modelos matemáticos, que os epidemiologistas conseguem prever a evolução da pandemia e o efeito das medidas. Para combater o vírus, precisamos de conhecer a imagem clara de como ele é e das suas estruturas, o que só é possível através de técnicas de microscopia eletrónica ou de cristalografia de raios-X. Processar e analisar essas imagens não é fácil e depende de algoritmos computacionais.
A partir das estruturas das proteínas que constituem o vírus, podemos desenhar e testar fármacos (novos ou já aprovados) com recurso à biologia computacional. Estudos, como os que estamos a fazer no ITQB NOVA [Instituto de Tecnologia Química e Biológica da Universidade Nova de Lisboa], usam a simulação computacional para obter um mapa detalhado dos alvos do vírus que queremos bloquear e para prever os fármacos que melhor se encaixam nesses alvos, tornando o processo muito mais rápido e menos dispendioso. A colaboração entre métodos computacionais e experimentais, como o estudo que foi desenvolvido pelo IGC [Instituto Gulbenkian de Ciência] e o ITQB NOVA, permitem-nos prever quais são as variantes que representam maior risco. Estes exemplos mostram a importância da transformação digital da biologia.
A biologia computacional nasceu da nossa ambição de compreender a vida em toda a sua complexidade, bem como de desenvolver medicamentos, abordagens médicas e compostos de valor acrescentado, de forma mais eficiente e sustentável. A biologia moderna não é só feita nos laboratórios tradicionais, usando pipetas, tubos de ensaio e microscópios. É feita também nos laboratórios computacionais, onde se desenvolvem e aplicam os algoritmos para extrair informação dos dados biológicos, e onde se criam modelos que permitem simular sistemas biológicos e gerar novos dados.
Ainda estamos no começo. A transformação digital da biologia continuará, alimentada por uma transformação digital da sociedade, que tem gerado algoritmos poderosos, abordagens eficientes para lidar com grandes dados e avanços na robótica e inteligência artificial. Uma transformação que não é feita apenas por máquinas, mas também por especialistas na área. É esta a missão de cursos como o novo Mestrado em Biologia Computacional e Bioinformática (MBCBi) da Universidade Nova de Lisboa: formar investigadores que falem com fluência as linguagens da biologia e da informática que construam pontes entre os dois mundos, aceitando os desafios que temos pela frente e sendo atores dessa transformação.
Os autores escrevem segundo o novo acordo ortográfico