A Galeria dos Uffizi de Florença vai processar site pornográfico por uso indevido de algumas das suas obras-primas
Actriz porno Cicciolina é uma das “guias” da visita a Classic Nudes, que o Pornhub propõe a seis dos mais importantes museus do mundo.
Foi já em meados deste mês que o site pornográfico Pornhub decidiu associar-se à campanha de regresso aos museus, passados os dias mais difíceis da pandemia da covid-19. Para tal, criou o guia Classic nudes (Nus clássicos), com o qual propõe visitas guiadas à arte erótica em seis dos mais importantes museus do mundo: a Galeria dos Uffizi, em Florença; o Louvre e o Museu de Orsay, em Paris; o Museu do Prado, em Madrid; a National Gallery, em Londres; e o Metropolitan, em Nova Iorque.
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Foi já em meados deste mês que o site pornográfico Pornhub decidiu associar-se à campanha de regresso aos museus, passados os dias mais difíceis da pandemia da covid-19. Para tal, criou o guia Classic nudes (Nus clássicos), com o qual propõe visitas guiadas à arte erótica em seis dos mais importantes museus do mundo: a Galeria dos Uffizi, em Florença; o Louvre e o Museu de Orsay, em Paris; o Museu do Prado, em Madrid; a National Gallery, em Londres; e o Metropolitan, em Nova Iorque.
Só que estas instituições parecem não estar de acordo com a “bondade” nem com a suposta missão artística e pedagógica da iniciativa. E a primeira a protestar foi a Galeria dos Uffizi de Florença, da qual o Pornhub cita uma dúzia de obras, sem qualquer pedido ou aviso prévio, e muito menos consentimento.
O Nascimento de Vénus, de Botticelli; e a Venus de Urbino, de Ticiano, são duas das pinturas citadas pelo site pornográfico, dito o mais visitado no mundo neste género. A primeira serve mesmo de apresentação do guia Classic nudes, com a bem conhecida actriz porno húngaro-italiana Ilona Staller (aka Cicciolina) a recriar e comentar a obra que Botticelli realizou no final do século XV. Escondendo o envelhecimento do seu corpo — Cicciolina tem quase 70 anos de idade — com recurso a um collant cor de pele, a antiga deputada em Itália e ex-mulher do escultor Jeff Koons assume o lugar da Vénus na reconstituição da pintura, ao mesmo tempo que comenta: “A pornografia pode não ser considerada arte, mas, definitivamente, algumas obras de arte podem ser consideradas pornografia”.
A outra guia de Classic nudes é Asa Akira, também actriz e realizadora americana de cinema porno, que, com algum humor à mistura, vai apresentando e interpretando num audiotour algumas da centena de obras “visitadas” pelo Pornohub. Sobre O Nascimento de Vénus, por exemplo, explica que, antes de Botticelli, “praticamente ninguém pintava um nu feminino na arte ocidental desde o tempo do Império Romano”...
Respeitar a lei
Citado pela agência italiana AdnKronos, o director da Galeria dos Uffizi, Eike Schmidt, lembrou que o Pornhub “não pediu, nem obteve autorização” para usar as imagens das suas obras-primas; e contactou já a MindGeek Holding, a empresa luxemburguesa proprietária do site, a exigir a sua retirada.
Um porta-voz do museu de Florença invocou, de resto, a legislação italiana, que exige o consentimento expresso dos museus para a utilização da imagem das suas obras, para reivindicar esse recuo: “Trata-se de um dos muitos casos de uso comercial das nossas imagens, sem autorização. Actuamos sempre da mesma maneira: há uma lei específica, e queremos que ela seja respeitada”.
Não são conhecidas as reacções dos outros museus — que a AdnKronos diz não terem também sido consultados pelo Pornhub —, mas é bem provável que elas venham no mesmo sentido da dos Uffizi. A menos que o Louvre acredite que a presença de A rapariga em repouso, de François Boucher, possa vir a reflectir-se de forma séria e sustentada no regresso dos seus visitantes — ou o Museu de Orsay (A Origem do Mundo, de Courbet), o Prado (A maja nua, de Goya), o Metropolitan (Nu masculino, de Edgar Degas), a National Gallery (Adão e Eva, de Jan Gossaert)…
Atentos ao ar dos tempos, os responsáveis pelo Pornhub decidiram também “criticar” o eurocentrismo manifesto nas colecções dos grandes museus ocidentais, em que as obras expostas são maioritariamente de artistas brancos. Assim, criaram uma sétima secção, intitulada Outra perspectiva, que oferece a vista de obras provenientes da China, Índia e Japão e também do continente americano, representando corpos de diferentes raças e cores.