Comissão técnica aconselha vacinação de jovens dos 12 aos 15 anos com comorbilidades

Peritos ouviram pediatras e optam, para já, por uma vacinação mais criteriosa destes jovens. Posição final ainda não foi entregue à DGS.

Foto
Rui Gaudêncio

A maioria dos peritos da Comissão Técnica de Vacinação defende que os jovens entre os 12 e os 15 anos só sejam vacinados contra a covid-19 se tiverem comorbilidades de risco para a doença. Segundo apurou o PÚBLICO, essa posição foi dominante após audições de peritos, sobretudo da área da pediatria. No entanto, esta pode não ser a posição final da comissão técnica, que enviará em breve um parecer à Direcção-Geral da Saúde (DGS) sobre o assunto.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

A maioria dos peritos da Comissão Técnica de Vacinação defende que os jovens entre os 12 e os 15 anos só sejam vacinados contra a covid-19 se tiverem comorbilidades de risco para a doença. Segundo apurou o PÚBLICO, essa posição foi dominante após audições de peritos, sobretudo da área da pediatria. No entanto, esta pode não ser a posição final da comissão técnica, que enviará em breve um parecer à Direcção-Geral da Saúde (DGS) sobre o assunto.

Em cima da mesa continua a estar a possibilidade de recomendar a vacinação universal para esta faixa etária ou optar por aconselhá-la apenas aos jovens que tenham doenças de risco, tal como fez o Reino Unido. Estão a ser pesados os benefícios e os riscos de cada decisão sobre várias ópticas, não só sobre o aspecto da saúde física, mas também mental e emocional.

Segundo fonte conhecedora do processo, a vacinação universal não é recomendada, nesta altura, pelo grupo de 11 peritos da comissão técnica, mas, com a aquisição de mais conhecimentos e o esclarecimento de uma série de dúvidas sobre os benefícios e riscos, o aconselhamento pode passar por esse ou por outro caminho. Não há unanimidade nesta decisão dentro da própria comissão, ressalva a mesma fonte.

“Não há decisões nesta pandemia que não tenham vantagem e inconvenientes. Não há nada que seja claramente ideal. E nas crianças é particularmente difícil porque é complicado avaliar riscos e benefícios quando se sabe pouco. Não existe nenhum país que tenha estado a vacinar estas faixas etárias em massa para se conseguir ver o que acontece. Sabemos os riscos da vacina e os riscos de hospitalização e doença grave nas crianças, mas, em ambos os casos, são fenómenos raros e, como tal, é difícil perceber para onde pesa mais a balança”, disse ao PÚBLICO a mesma fonte.

Foto
Filipa Fernandez

A comissão defende também que esta questão continue a ser acompanhada e que sejam seguidas as regras gerais que já foram adoptadas nas restantes faixas etárias. 

O ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues, disse, no dia 14 de Julho, que espera que até ao início do próximo ano lectivo, em Setembro, os alunos mais jovens possam ser vacinados contra a covid-19.

Antes, em entrevista à TVI, no dia 5, a ministra da Saúde disse que os jovens com idade inferior a 18 anos deverão começar a ser vacinados contra a covid-19 na última semana de Agosto, se o Governo conseguir manter o plano de vacinação previsto. Marta Temido salientou que a Comissão Técnica de Vacinação está a apreciar como é plano se vai adaptar à “população mais jovem que tem especificidades pediátricas”.

O que estão a fazer os países

A possibilidade de vacinar ou não os jovens dos 12 aos 15 anos já vinha a ser analisada desde que a Food and Drug Administration (FDA), que regula o sector farmacêutico nos Estados Unidos, anunciou, em Maio, que as crianças entre os 12 e os 15 anos já podiam receber a vacina da Pfizer-BioNTech. Mas o parecer começou a ser acelerado quando a mesma vacina recebeu luz verde da Agência Europeia de Medicamentos (EMA) para ser administrada a crianças entre os 12 e os 15 anos.

Até agora, em Portugal, 2037 jovens entre os 16 e os 17 anos receberam duas doses da vacina da Pfizer e 3090 recebeu a primeira dose, segundo os dados da DGS da passada terça-feira.

São vários os países que já avançaram em passo acelerado para a vacinação de crianças e jovens. Alguns recomendam a vacinação universal desta faixa etária, enquanto outros vão vacinar apenas os jovens com comorbilidades. O Reino Unido, por exemplo, decidiu esta semana que vai vacinar apenas menores com certos problemas de saúde. Em França, por outro lado, começaram a ser vacinados em Junho todos os jovens maiores de 12 anos.

Num documento que divulgou a meio de Julho, o Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças (ECDC, na sigla em inglês) lembrava que, depois de ter obtido autorização para a administração da vacina a maiores de 12 anos de idade, a Pfizer já iniciou ensaios clínicos com crianças entre os cinco e os 11 anos de idade, usando doses mais pequenas da vacina. Os resultados são esperados em Setembro. Mais atrasado está o ensaio da mesma farmacêutica para testar a eficácia e a segurança da vacina abaixo dos cinco anos de idade. Em meados de Junho, 14 países, dentro e fora da Europa, estavam a discutir a possibilidade de a vacina passar a ser administrada abaixo dos 12 anos de idade.

A Comissão Técnica de Vacinação contra a Covid-19 foi criada por despacho assinado pela directora-geral da Saúde, Graça Freitas, a 4 de Novembro, e tem como função emitir pareceres técnicos sobre as vacinas contra a covid-19 que forem sendo disponibilizadas no mercado nacional e internacional, recomendar grupos-alvo da vacinação e a sua priorização, e propor e acompanhar o desenvolvimento de estudos sobre a vacinação e as vacinas contra a doença utilizadas em Portugal.

Pediatras divididos

As vantagens de vacinar as crianças contra a covid-19 dividem os especialistas, que se unem na expectativa de uma recomendação das autoridades de saúde sobre a matéria.

Em declarações à Lusa, Jorge Amil Dias, presidente do Colégio da Especialidade de Pediatria da Ordem dos Médicos, considera que, actualmente, “não é uma emergência vacinar as crianças”, porque “a população que está em maior risco é a população adulta”. E, portanto, aconselha “prudência” antes de se recomendar a vacinação universal. O colégio reclama “evidência sólida” que garanta “que as vacinas são eficazes” e “inteiramente seguras”. 

No mesmo sentido vai José Gonçalo Marques, coordenador da Unidade de Infecciologia e Imunodeficiências do Hospital de Santa Maria e membro da comissão técnica de vacinação da DGS, que respondeu à Lusa por escrito. “A vacinação de crianças e adolescentes saudáveis deve ser clara nos objectivos e ter por base a razoabilidade e a proporcionalidade dos custos e riscos de vacinar”, frisa.

José Gonçalo Marques recorda que, “no panorama nacional dos internamentos hospitalares por SARS-CoV-2, os menores de 18 anos representam uma ínfima parte”. Acresce que “a avaliação não está finalizada e surgiram alertas de possíveis complicações cardíacas da vacinação, também muito raras, mas que nos devem fazer aguardar”, avisa.

O médico mencionou ainda a dimensão ética da decisão de vacinar ou não as crianças, “sobretudo nesta situação em que o benefício directo pode não ser significativamente superior aos riscos da vacinação, e o benefício indirecto ser ainda questionável”.

Para a Organização Mundial de Saúde, imunizar as crianças não deve ser uma prioridade, atendendo a que milhões de idosos continuam sem acesso à vacina nos países mais pobres.


Notícia actualizada às 19h38. O parecer da Comissão Técnica ainda não seguiu para a DGS.