Cheias fazem 168 mortos no centro da Europa. “É verdadeiramente devastador”
“Em algumas áreas, não víamos tanta chuva há 100 anos”, alertou Andreas Friedrich, um meteorologista alemão, sobre aquele que é o pior desastre natural a atingir o país nos últimos anos. Cerca de 1300 pessoas estão desaparecidas em Ahrweiler, a sul de Colónia. Bélgica, Luxemburgo e Países Baixos também foram afectados pelo mau tempo. Bélgica pediu assistência à UE.
“Nunca vimos um desastre destes, é verdadeiramente devastador": a primeira-ministra do estado da Renânia-Palatinado, Malu Dreyer, caracteriza assim as cheias “catastróficas” que atingem a Alemanha, mas também a Bélgica, Luxemburgo e Países Baixos. As imagens são esclarecedoras quanto à dimensão da tragédia que já causou mais de 168 mortes nestes quatro países. E os responsáveis avisam que o número de óbitos deverá subir nas próximas horas, quando ainda há mais de mil desaparecidos. Em muitos locais, carros, ruas e casas ficaram completamente submersos, com as equipas de socorro a terem um trabalho muito dificultado nos salvamentos.
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“Nunca vimos um desastre destes, é verdadeiramente devastador": a primeira-ministra do estado da Renânia-Palatinado, Malu Dreyer, caracteriza assim as cheias “catastróficas” que atingem a Alemanha, mas também a Bélgica, Luxemburgo e Países Baixos. As imagens são esclarecedoras quanto à dimensão da tragédia que já causou mais de 168 mortes nestes quatro países. E os responsáveis avisam que o número de óbitos deverá subir nas próximas horas, quando ainda há mais de mil desaparecidos. Em muitos locais, carros, ruas e casas ficaram completamente submersos, com as equipas de socorro a terem um trabalho muito dificultado nos salvamentos.
Na Alemanha, o número de mortes aumentou para 141 durante a tarde este sábado. É a maior tragédia natural a afectar o país nos últimos anos. “Em algumas áreas, não víamos tanta chuva há 100 anos”, alertou Andreas Friedrich, um meteorologista alemão, em declarações à CNN.
Das 141 pessoas que morreram na Alemanha, pelo menos 12 eram moradores de um lar para pessoas com deficiência física; foram surpreendidos pelas enchentes durante a noite.
“Tivemos dois ou três dias em que choveu sem parar. Ou talvez quatro, perdi a conta”, diz Klaus Radermacher, habitante de Schuld, uma das regiões mais afectadas. “Vi a pizzaria a ficar inundada, meia hora depois foi a padaria. Há um acampamento aqui perto: as caravanas e as botijas de gás passaram por aqui a boiar. Não tivemos qualquer hipótese de reacção. Veio tão depressa, nunca vi algo assim”, lamenta Klaus, que vive nesta cidade alemã há 60 anos.
Vinte e quatro mortes na Bélgica
O mau tempo que afecta o centro da Europa fez também 27 mortos na Bélgica, que já decretou um dia de luto nacional pelas vítimas das cheias. Há pelo menos 103 pessoas desaparecidas. “Terça-feira, dia 20 de Julho, será um dia de luto nacional. Um momento para reflectir sobre o pesado número de mortes, mas também para celebrar as explosões de solidariedade e o sentimento de união da população”, escreveu o primeiro-ministro, Alexander De Croo, no Twitter.
Horas antes, dizia em conferência de imprensa, que estas “são circunstâncias excepcionais” que a Bélgica “nunca viveu. “O que deveriam ter sido lindos dias de Verão de repente transformaram-se em dias escuros e extremamente tristes”.
Vários distritos de Maastricht, nos Países Baixos, tiveram de ser evacuados e também foram duramente atingidos. As autoridades belgas recomendaram que os habitantes da zona sul e leste do país não viajassem. “As águas estão a subir mais e mais. É assustador”, disse Thierry Bourgeois, habitante da cidade de Liège, à Sky News.
Esta quinta-feira, a subida do rio Meuse levou as autoridades a recomendar a milhares de pessoas que abandonassem as suas casas. Os cidadãos foram aconselhados a deslocarem-se para as zonas altas da cidade, de modo a ficarem em segurança.
“Trabalhamos, renovamos tudo e agora estamos a perder tudo o que temos. Agora temos que começar do zero e trabalhar aos poucos para colocar tudo em ordem”, disse Sylvia Calvo Lorente, de 33 anos, enquanto examinava os danos causados pelas águas em várias habitações da pequena cidade de Trooz, perto de Liège.
Na cidade de Verviers, mais a leste, o rio que transbordou ainda corria pelas ruas e as pessoas tentavam cautelosamente remediar os danos em lojas, casas e carros em ruínas. “Conseguimos ultrapassar a covid-19, esperávamos agora conseguir reerguer-nos”, disse um lojista já em lágrimas.
Várias cidades e vilas ficaram submersas, incluindo Pepinster, perto de Liège, onde cerca de dez casas desabaram.
Operações de socorro dificultadas
Em muitas das áreas da Alemanha por onde passaram as águas restam apenas destroços, com as autoridades a terem um trabalho difícil na procura por sobreviventes. Nas últimas horas, várias casas afectadas pela água desabaram, após sofrerem danos estruturais irreparáveis. Ahrweiler ficou debaixo de escombros, com um jornalista da AFP a dizer que a cidade parece ter sido atingida por um tsunami. Euskirchen, um pouco mais a norte, é provavelmente uma das regiões mais afectadas pelas cheias, com 20 mortes já confirmadas. O centro da cidade parece um campo de ruínas, com as fachadas das casas literalmente arrancadas pelas cheias.
Cerca de 1300 pessoas estão desaparecidas no cantão mais atingido, Bad Neuenahr-Ahrweiler, a sul de Colónia. Como as redes de telemóveis entraram em colapso em algumas das regiões afectadas pelas cheias, famílias e os amigos não conseguem encontrar os seus familiares e amigos. Também fugas de gás têm colocado em causa os resgates das equipas de socorro.
Entretanto, mil soldados foram mobilizados para ajudar nas operações de resgate e limpeza das cidades e aldeias nos estados da Renânia do Norte-Vestefália e Renânia-Palatinado, que oferecem todos o mesmo espectáculo desolador: ruas e casas debaixo de água, carros virados, árvores arrancadas.
Cerca de 114 mil residências na Alemanha ficaram sem energia na sexta-feira e as redes de telemóvel móvel entraram em colapso em algumas regiões afectadas pelas chuvas, o que dificultou a procura por pessoas desparecidas.
Em muitas áreas afectadas, as estradas ficaram intransitáveis depois de serem arrastadas pelas enchentes. As equipas de resgate tentaram chegar aos moradores de barco ou helicóptero e tiveram que comunicar entre si através de walkie-talkie.
“A rede entrou em colapso. As infra-estruturas entraram em colapso. Os hospitais não podem receber ninguém. Os lares de idosos tiveram que ser evacuados “, disse uma porta-voz do governo regional de Colónia.
Já esta sexta-feira de manhã, houve novos colapsos de casas em Erftstadt, perto de Colónia, e as equipas de salvamento estavam a trabalhar para ajudar os residentes que tinham regressado apesar dos avisos, disse o governo de Colónia no Facebook. Segundo as autoridades, muitas pessoas que ainda se encontravam nas casas estão agora desaparecidas.
Uma barragem perto da fronteira belga, a Rurtalsperre, transbordou durante a noite, enquanto outra, a Steinbachtalsperre, estava instável e obrigou a que se desalojassem 4500 pessoas. O parlamento da Renânia do Norte-Vestefália irá realizar esta sexta-feira uma reunião de emergência.
“Receio que só vejamos a extensão total da catástrofe nos próximos dias”, avisara já a chanceler, Angela Merkel, na quinta-feira à noite, em Washington, onde cumpre uma visita oficial. O ministro do Interior alemão Horst Seehofer disse à Spiegel que o governo federal pretende prestar apoio financeiro às regiões afectadas o mais rapidamente possível.
"Tivemos sorte, sobrevivemos"
Demorou apenas alguns minutos para os habitantes de um bairro próspero de um dos países mais ricos do mundo se verem entregues à força das águas do rio que, na cidade de Schuld, já levou casas e tudo o que encontrou pela frente. “Foi terrível não poder ajudar as pessoas. Acenavam-nos das janelas enquanto as casas à sua esquerda e à sua direita desabavam. Tivemos sorte, sobrevivemos”, disse um morador, Frank Thel, à agência Reuters.
A região, a sul de Bonn, uma antiga cidade universitária que durante 40 anos foi a capital da Alemanha Ocidental, é famosa pelos vinhos e pela beleza dos vinhedos inclinados. Agora, depois do dilúvio, os moradores têm de tentar resolver os problemas causados pelas águas sozinhos, disse Thel.
Embora os serviços de emergência e o exército já tenham sido mobilizados, ainda não conseguiram diminuir o rasto de devastação. “A limpeza, pelo que consigo ver, está a ser feita por vizinhos e agricultores a usar tractores”.
Quando as águas começaram a subir na quarta-feira, Michael Lang, um comerciante de vinhos da região, utilizou o Facebook para alertar os amigos sobre as enchentes iminentes. “Vou evacuar agora. Cuidem-se”, escreveu. Na sexta-feira, junto ao seu bairro, Lang não conseguiu conter as lágrimas. “Foi-se tudo. A nossa casa ainda está de pé, mas nada mais”.
Efeitos das alterações climáticas
A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, afirmou esta sexta-feira que este desastre natural deixa claro que é urgente tomarmos medidas fortes para mitigar os efeitos das alterações climáticas.
“É [pela] intensidade e duração destes acontecimentos que a ciência nos diz que é uma indicação clara das alterações climáticas e que mostra a urgência em agir”, afirmou a responsável aos jornalistas.
Em apenas 48 horas caíram 148 litros de chuva por metro quadrado em algumas das zonas afectadas, escreve o The Guardian, um valor abismal quando vemos que a média para todo o mês de Julho é de apenas 80 litros por metro quadrado.
Bélgica pede ajuda à UE
A Bélgica pediu esta sexta-feira ajuda aos seus parceiros da União Europeia (UE) através do Mecanismo Europeu de Protecção Civil, anunciou esta sexta-feira a Comissão Europeia, que aguarda um pedido da Alemanha.
Em resposta ao pedido das autoridades belgas, três países ofereceram já apoio, tendo a França enviado já barcos e helicópteros, com equipas a trabalhar no terreno.
“A UE está pronta a oferecer toda a ajuda necessária aos países afectados pelas intempéries”, disse o porta-voz da Comissão Europeia, Stefan De Keersmaecker, acrescentando que, para isso, basta apenas que Berlim active este mecanismo, a exemplo do que já fez a Bélgica.
Números actualizados às 19h de 17 de Julho