Sentir o pulsar do Porto num reservatório de água desenterrado
Desactivado há mais de duas décadas, antigo reservatório de água da Pasteleira acolhe agora artefactos, vestígios e fragmentos encontrados em escavações arqueológicas e edifícios do Porto. Já abriu o polo mais ocidental do Museu da Cidade
A peça mais contemporânea foi recolhida em escavações arqueológicas no Porto há apenas 15 dias e partilha morada com artefactos, vestígios e fragmentos desde o Paleolítico. No antigo depósito de água da Pasteleira abriu esta semana o mais recente e o mais ocidental polo do Museu da Cidade: o Reservatório. Uma viagem pelo Porto, num lugar que quer ser um três em um: museu, espaço de trabalho e mediação e reserva viva. Ali, diz a arqueóloga Joana Alves Ferreira, sente-se o “pulsar da cidade”.
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A peça mais contemporânea foi recolhida em escavações arqueológicas no Porto há apenas 15 dias e partilha morada com artefactos, vestígios e fragmentos desde o Paleolítico. No antigo depósito de água da Pasteleira abriu esta semana o mais recente e o mais ocidental polo do Museu da Cidade: o Reservatório. Uma viagem pelo Porto, num lugar que quer ser um três em um: museu, espaço de trabalho e mediação e reserva viva. Ali, diz a arqueóloga Joana Alves Ferreira, sente-se o “pulsar da cidade”.
Junto à entrada poente do Parque da Pasteleira, houve um tempo em que só a fachada imponente do Reservatório era conhecida. O depósito, inaugurado em 1986, esteve enterrado e permanecia sem qualquer uso desde 1998. A reabilitação assinada pelos arquitectos Alexandre Alves Costa e Sérgio Fernandez revelou belos arcos e colunas do século XIX, agora pintados de branco, e concebeu um anfiteatro na cobertura, com quatro lanternins e área para acolher eventos com algumas centenas de pessoas (assim a pandemia o permita).
Nuno Faria, director artístico do Museu da Cidade, vê neste polo “as raízes do fundamento da cidade” e orgulha-se de o ver dar corpo à concepção sonhada para o “seu” museu: um local que “não tem um centro e não é fechado sobre si mesmo” – e que continua em construção, com os próximos núcleos projectados para a Quinta da Bonjóia e para o Matadouro.
O Reservatório - com projecto museográfico de João Mendes Ribeiro e que acolheu uma primeira exposição, ainda em 2019, sobre o Douro - foi desenhado como um “labirinto do tempo”, sem linearidades ou narrativas únicas. Numa lógica horizontal, há uma organização topográfica por zonas da cidade onde se fizeram importantes escavações nos séculos XX e XXI (Barra do Rio e Plataforma Litoral, Frente Ribeirinha e Areias Altas, Morro da Penaventosa, Estradas e Caminhos). Numa lógica vertical, viaja-se pelo tempo, da contemporaneidade até ao paleolítico, percorrendo a época medieval, a época romana, a idade do bronze e a idade do ferro. “O espectador pode escolher como quer percorrer o espaço”, nota Nuno Faria, que no texto de apresentação apelida esta estação arqueológica como uma “máquina de ler a cidade”.
Tirar o arquivo do escuro
Optando por deixar de fora dispositivos multimédia ou realidade virtual, o Reservatório convoca o visitante para a “simplicidade” e é um espaço vivo: há cerca de 200 peças expostas, mas milhares em arquivo. E a qualquer momento novo material pode chegar, vindo de obras na cidade onde são feitas escavações arqueológicas, como acontece agora na empreitada da linha Rosa do Metro do Porto. As estantes que ocupam a parede do fundo do museu receberam já algum do material guardado e serão preenchidas ao longo do tempo. Até agora, “a maior parte dos objectos que saíam das escavações eram estudados e depois ficavam no escuro”, aponta Joana Alves Ferreira, congratulando-se por aquele espaço poder finalmente acolher estudantes e investigadores muitas vezes órfãos de local e objecto de trabalho.
Essa possibilidade de trazer para a luz peças invisíveis é razão de felicidade para a arqueóloga, que se confessa surpreendida com a quantidade de “peças singulares” guardadas nos arquivos que, até agora, só os técnicos tinham oportunidade de conhecer.
Um cepo de âncora em chumbo, provavelmente romano, encontrado por um praticante de caça submarina em 1995, cerâmica produzida na região encontrada na Casa do Infante, uma moeda sueva, de duas caras, raridade em toda a Península Ibérica (há apenas 200 conhecidas) ou uma caixa sepulcral encontrada na Casa Guerra Junqueiro são alguns dos exemplos.
Nesta viagem, há ainda duas horas de uma arquitectura sonora produzida por João Filipe Pais (que captou som de instrumentos dentro do Reservatório quando ele ainda estava vazio, usando a reverberação natural do edifício), vídeos produzidos pelo Teatro do Frio, mesas para trabalho de mediação com o público, onde é promovido um contacto directo com os materiais, fotografias de escavações arqueológicas e desenhos de Daniel Silvestre. Até domingo a entrada é gratuita.