BE e PAN defendem que alunos e funcionários possam escolher casas de banho e balneários em função do género

Discussão terá lugar no início da próxima sessão legislativa. Objectivo dos partidos é pôr a Assembleia a confirmar a lei chumbada pelo Tribunal Constitucional em Junho.

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Rui Gaudencio

O BE propõe que o Parlamento aprove uma lei específica sobre o exercício do direito à autodeterminação da identidade de género nas escolas, face ao acórdão que declarou inconstitucional que esta matéria seja definida por regulamento. Também o PAN já entregou um diploma sobre o mesmo assunto.

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O BE propõe que o Parlamento aprove uma lei específica sobre o exercício do direito à autodeterminação da identidade de género nas escolas, face ao acórdão que declarou inconstitucional que esta matéria seja definida por regulamento. Também o PAN já entregou um diploma sobre o mesmo assunto.

Entre as medidas propostas por estes dois partidos, e que no essencial confirmam o diploma do Governo chumbado pelo Tribunal Constitucional em finais de Junho, está o direito de alunos e funcionários docentes e não docentes poderem escolher a casa de banho ou o balneário, em função do género assumido.

“As escolas devem garantir que a criança ou jovem, no exercício dos seus direitos, aceda às casas de banho e balneários, tendo sempre em consideração a sua vontade expressa e assegurando a intimidade e singularidade”, lê-se no diploma do PAN. Uma medida que, na opinião do BE, garante o “bem-estar” dos indivíduos.

Os dois partidos também querem assegurar o direito de alunos e funcionários serem tratados pelo nome que escolheram.

Em declarações à agência Lusa, a deputada do Bloco de Esquerda (BE) Fabíola Cardoso afirmou que o projecto de lei, que será entregue esta segunda-feira, tem como base “o quadro normativo que estava montado” com o despacho do Governo de Julho de 2019, mas introduz “pequenas diferenças cirúrgicas”.

Entre outras alterações, o projecto do BE prevê um “alargamento da aplicação deste regime a todo o pessoal das escolas, ao pessoal docente e não docente”, além dos alunos, e “a possibilidade do estabelecimento de parcerias com as associações LGBTI principalmente nas áreas da formação e de acções de sensibilização e de informação nas escolas”, referiu a deputada. As medidas promotoras do exercício do direito à autodeterminação da identidade de género deverão ser adoptadas pelas “escolas do ensino Pré-escolar, Básico, Secundário e Superior”.

O BE quer que esta iniciativa “seja discutida o mais rapidamente possível, no início da próxima sessão legislativa”, para que no próximo ano lectivo “o direito destas crianças, destes jovens seja de facto garantido em todas as escolas”, acrescentou Fabíola Cardoso.

Jornal de Notícias acrescenta que o diploma do Bloco defende que a inconstitucionalidade da lei n.º38/2018 criou uma “situação intolerável" e de “instabilidade nas escolas”, enquanto “geradora de lesões ao bem-estar e ao desenvolvimento saudável dos/as estudantes”, razão pela qual deve ser “com urgência colmatada”.

No caso do projecto de lei do PAN, entregue no Parlamento há uma semana, também vai no sentido de que as escolas devem adoptar medidas que promovam a “protecção adequada da identidade de género, expressão de género e das características sexuais das crianças e dos jovens”, além de formação para docentes e demais profissionais.

A lei declarada inconstitucional

O Tribunal Constitucional, num acórdão de 29 de Junho passado, declarou inconstitucionais os números 1 e 3 do artigo 12.º da lei de Agosto de 2018 sobre o direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género que remetiam para o Governo a definição das medidas administrativas a adoptar neste âmbito no sistema educativo.

Ao abrigo destas normas da lei de 2018, as medidas a adoptar “no sistema educativo, em todos os níveis de ensino e ciclos de estudo, que promovam o exercício do direito à autodeterminação da identidade de género e expressão de género e do direito à protecção das características sexuais das pessoas” foram definidas através de um despacho da Presidência do Conselho de Ministros e da Educação de Julho de 2019.

Segundo este acórdão do Tribunal Constitucional, suscitado por um pedido de fiscalização sucessiva de 85 deputados do PSD e do CDS-PP e de um deputado do PS, está em causa a violação da alínea b) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição, que estabelece que é da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre direitos, liberdades e garantias, salvo autorização ao Governo.

Face a este acórdão, o PAN apresentou na semana passada um projecto para alterar as normas da lei de 2018 que foram declaradas inconstitucionais, atribuindo à Assembleia da República, em lugar do Governo, a competência de aprovar a regulamentação das medidas a aplicar nas escolas, que inclui em anexo já a respectiva regulamentação, em termos semelhantes ao do despacho de Julho de 2019.

Questionada sobre as diferenças entre os dois projectos, Fabíola Cardoso respondeu que “a proposta do PAN pretende alterar a Lei n.º 38 de 2018, é uma outra maneira de resolver a situação”, mas considerou que o objectivo é o mesmo, “que é resolver este problema que foi criado por este acórdão do Tribunal Constitucional, de modo a garantir que o exercício deste direito seja uma possibilidade para os jovens nas escolas portuguesas”.

No seu entender, "não é necessário alterar a Lei n.º 38” e esse “seria um processo legislativo mais complexo, considerando as dificuldades que houve para se chegar a um texto comum”. De acordo com a deputada do BE, com a decisão do Tribunal Constitucional, neste momento existe “uma situação de desprotecção, de instabilidade nas próprias escolas”.

“Queremos evitar a desprotecção dos jovens nas escolas, queremos evitar que haja aqui um hiato e uma descontinuidade nas medidas que muitas escolas já estavam a implementar”, declarou.