Imprensa perde mais de 22 milhões no primeiro semestre com partilha ilegal
Jornais são partilhados em grupos de Whatsapp e Telegram. Estado foi lesado em mais de 1,3 milhões de euros em IVA.
O director-executivo da Visapress disse à Lusa esta quarta-feira que a imprensa portuguesa perdeu 22 milhões de euros no primeiro semestre deste ano com a partilha ilegal de jornais e revistas nas redes sociais.
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O director-executivo da Visapress disse à Lusa esta quarta-feira que a imprensa portuguesa perdeu 22 milhões de euros no primeiro semestre deste ano com a partilha ilegal de jornais e revistas nas redes sociais.
"A partilha ilegal [de jornais e revistas] tem impactado nestes primeiros seis meses de uma forma muito significativa as vendas em banca, para não falar já do que aconteceu o ano passado, e tem vindo a acontecer, das partilhas nas redes sociais, principalmente naqueles softwares de conversação como o Telegram e o WhatsApp”, afirmou Carlos Eugénio, director-executivo da Vitapress à Lusa.
A entidade responsável pela gestão colectiva dos direitos de autor imanentes dos jornais, revistas e jornalistas analisou os principais grupos de Telegram que partilham jornais e revistas, e concluiu que a imprensa nacional, nos primeiros seis meses de 2021, deixou de arrecadar mais de 22 milhões de euros em publicações vendidas em banca.
A partilha de publicações nestas plataformas “prejudicam gravemente a venda em banca (...) e as subscrições no digital e o valor de 22 milhões de euros desde o início do ano até esta data prende-se com o número de partilhas que são feitas na Internet”, sublinhou.
Carlos Eugénio apontou que há grupos no Telegram que têm vindo a crescer “de forma exponencial”, o que é preocupante. “Até porque a ineficácia da legislação que existe e a falta de rapidez que existe naquilo que é a legislação vigente, aquilo que é a necessidade de cessar as ilegalidades com os conteúdos que nós representamos, que é jornais e revistas, é gritante”, criticou.
"Acho que qualquer pessoa fica completamente baralhada quando, por exemplo, interpusemos uma providência cautelar, que é algo que tem de ser rapidamente decidido, e por meras questões processuais estamos desde Novembro à espera de uma decisão”, exemplificou.
Em média, diariamente, são partilhadas 88 publicações em grupos do Telegram. “Ou seja, a distribuição é tão massiva e é de uma forma tão rápida que estamos desde Novembro até esta data à espera que o tribunal ordene o Telegram a bloquear essas partilhas ou a fazer algo para que essas partilhas não aconteçam, é algo que, para os editores de imprensa, é completamente exasperante”, sublinhou.
Sobre o que pode ser feito para evitar a partilha de conteúdos editoriais não autorizados, o director-executivo adiantou que já está a ser feito.
"Aquilo que fazemos com base diária” é pedir ao Telegram, através dos meios que os próprios disponibilizam, e ao WhatsApp, sempre que são identificadas partilhas de publicações não autorizadas, como também a outras redes sociais, a “remoção desses mesmos conteúdos”.
Mas o “problema é que essas redes têm vontade própria e regem-se por objectivos próprios e têm regras criadas por eles e na sua maior parte ignoram olimpicamente os pedidos que nós fazemos”, contou Carlos Eugénio.
"Portanto, se não conseguimos pela via que eles nos oferecem fazer o pedido e a demonstração de que é necessária a remoção daquele conteúdo porque é ilegal, temos que olhar para aquilo que a lei nos dá e tentar ir ao encontro daquilo que a lei nos pode ajudar”, disse.
"Todavia, acreditamos que precisamos de uma lei que nos dê maior rapidez, uma lei que seja mais eficaz, mais eficiente principalmente, e que nos ajude a cessar as ilicitudes tão rapidamente quanto possível porque hoje em dia como todos sabemos a Internet é um segundo e a lei não está de todo enquadrada para que aconteça a remoção dos conteúdos com a rapidez que nós precisamos”, apontou o director-executivo.
Além disso, este tipo de situações faz com que exista “uma sensação do consumidor de que não tem de pagar para ter notícias de qualidade, o que é muito grave”, acresce que “acredita que está a roubar aos ricos quando nós sabemos que cada vez mais os meios de comunicação em Portugal são pobres”, referiu.
Em última análise, este tipo de práticas empobrece “todo o ecossistema jornalístico” e afecta a democracia, considerou.
A Visapress classifica de imprescindível o projecto de Lei 706 para o combate à pirataria, que afirma estar parado neste momento.
"Vimos com muita satisfação o projecto de Lei 706, que esteve a ser discutido na especialidade, que poderia ser um dos caminhos para o bloqueio imediato de remoção de conteúdos de uma forma mais coerciva, mas como último rácio para todos os esforços que nós tínhamos de desenvolver no sentido de chamar as organizações, detentoras das plataformas”, já que os denominados piratas o fazem de forma reiterada.
Ou seja, “tentamos sempre fazer com que as plataformas removam de livre vontade”, salientou.
"Estávamos muito contentes com a velocidade que esse projecto de Lei estava a ser discutido”, mas “percebemos agora que parece que parou, estagnou”, a qual se fosse aprovada, “tal como está, poderia ser um garante da defesa dos nossos direitos numa velocidade muito significativa”, considerou o responsável da Visapress.
A resolução 191/2021, publicada na segunda-feira e que recomenda ao Governo o combate à pirataria de publicações jornalísticas, contribuindo para um jornalismo mais independente e plural, vem “no fundo sumarizar” as preocupações da Visapress.
"Até a própria Assembleia da República já percebeu que o Governo tem que fazer alguma coisa, tem de legislar, tem de ajudar a imprensa no que diz respeito à violência que é este roubo que diariamente acontece nas redes sociais”, sublinhou.
Com a partilha ilegal de conteúdos editorais não é só o sector dos media que perde dinheiro, mas também o Estado, que recebe menos receita fiscal.
A Visapress estima que o Estado tenha sido lesado, não tendo arrecadado mais de 1,3 milhões de euros em IVA no primeiro semestre deste ano.
Para Carlos Eugénio, tudo isto potencia também as notícias falsas porque “tudo isto leva a que todo o ecossistema das notícias seja um bocadinho adulterado em alguns pontos”. E deu o exemplo do que aconteceu no segundo confinamento, em que “exactamente nos softwares de conversação” surgiu um powerpoint das medidas que iriam ser aplicadas pelo Governo, o qual era “falso”.
Ou seja, “redes que na sua génese, por aquilo que fazem diariamente com jornais e revistas com qualidade aproveitaram para disseminar conteúdo que não era verdadeiro e isso também é muito preocupante”, alertou.
"Gostaríamos que o Governo de alguma maneira olhasse para a resolução da Assembleia da República, acelerasse na medida do possível a aprovação do Projecto de Lei 706 e ajudasse a imprensa a combater todas as ilicitudes que se passam na Internet e que estão a empobrecer cada vez mais as publicações periódicas, que por sua vez empobrecem a democracia em Portugal”, concluiu Carlos Eugénio.