Ainda se vota mas já se contam boletins nas contestadas eleições na Etiópia
Guerra, violência étnica, boicotes e desafios logísticos impediram o voto em mais de 100 dos 547 círculos eleitorais, mas o primeiro-ministro etíope celebra um “triunfo”.
Num reflexo da confusa realidade no país de 109 milhões de pessoas, as autoridades da Etiópia não conseguiram realizar as eleições nacionais e regionais em quatro das dez regiões do país. Em duas das regiões onde as eleições tiveram lugar, os observadores da oposição terão sido expulsos de muitos centros de voto, disse aos jornalistas em Adis Abeba o chefe da comissão eleitoral, Birtukan Midekssa. “A democracia não se constrói num dia. Estamos a construí-la tijolo a tijolo”, afirmou o primeiro-ministro, Abiy Ahmed, num comunicado.
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Num reflexo da confusa realidade no país de 109 milhões de pessoas, as autoridades da Etiópia não conseguiram realizar as eleições nacionais e regionais em quatro das dez regiões do país. Em duas das regiões onde as eleições tiveram lugar, os observadores da oposição terão sido expulsos de muitos centros de voto, disse aos jornalistas em Adis Abeba o chefe da comissão eleitoral, Birtukan Midekssa. “A democracia não se constrói num dia. Estamos a construí-la tijolo a tijolo”, afirmou o primeiro-ministro, Abiy Ahmed, num comunicado.
Guerra, violência étnica, boicotes da oposição, desafios logísticos… a Etiópia enfrenta quase tudo o que pode perturbar umas eleições. Acusado por organizações de direitos humanos, analistas e opositores de ter protagonizado um agravamento do autoritarismo, Abiy, que recebeu o Prémio Nobel da Paz em 2019 pelos acordos de paz com a Eritreia, descreve este voto como a “primeira tentativa da nação para realizar eleições livres e justas” após décadas de repressão.
“Não interessa quem vença, etíopes por todo o país votaram em quem escolheram, sem medo e sem pressões. Por causa disso, a Etiópia triunfa”, disse ainda Abiy. Espera-se que a sua formação, o Partido da Prosperidade, consolide o poder, mas enfrenta acusações de assédio, manipulação e ameaças de violência.
Para além da província de Tigré, a região do Norte de onde Abiy tenta desde Novembro expulsar do poder a Frente de Libertação do Povo Tigré (FLPT), num conflito que fez milhares de mortos, deslocou mais de dois milhões de pessoas e levou a fome à região, e onde não há data prevista para as eleições, só se votará a 6 de Setembro noutros 54 círculos eleitorais, devido a “irregularidades e problemas com os boletins de voto”.
As tensões que provocaram a guerra começaram precisamente pelo adiamento destas eleições, inicialmente previstas para Agosto do ano passado e adiadas por causa da pandemia de covid-19. Por causa disso, a FLPT considerou que Abiy passou a ser um primeiro-ministro ilegítimo e realizou as suas próprias eleições, que Adis Abeba não reconheceu.
Em várias partes da região ocidental de Benishangul-Gumuz, cenário de confrontos por causa de terras e recursos que provocaram a morte de centenas de pessoas desde o ano passado, a violência étnica impediu o registo de eleitores e não se votou. Também em Somali e Harar, disputas e problemas com os boletins levaram ao adiamento das eleições para Setembro.
As forças federais combatem ainda uma insurreição em Oromia, região mais populosa do país, onde a oposição anunciou um boicote em protesto contra a detenção de um dos seus líderes e o encerramento de sedes políticas, e enfrentam violências étnicas em Amhara. Vários partidos em diferentes regiões dizem ter sido impedidos de fazer campanha.
Berhanu Nega, chefe de um dos principais partidos da oposição, Cidadãos Etíopes pela Justiça Social, disse num vídeo divulgado pela formação que os seus observadores foram “expulsos” de muitos lugares. “Na região de Amhara e no Sul, verificámos um grave problema adicional com os nossos observadores a serem expulsos ou impedidos de entrar [nos centros de voto] logo pela manhã”, denunciou.
Ao todo, na segunda-feira à noite, o partido tinha apresentado 207 queixas, a maioria sobre este bloqueio dos seus observadores por parte de milícias regionais, algo que a Comissão Eleitoral já confirmou.
Na maior parte do país, problemas logísticos e atrasos levaram os responsáveis a prolongar a votação por três horas. Aliás, o que espantou muitos observadores, que temiam uma abstenção generalizada, foram as filas para votar. Em Sidama, onde faltaram os boletins de voto, continua a votar-se esta terça-feira. Os votos já começaram a ser contados, mas os primeiros resultados deverão demorar dias.