As fotografias de Mário Cruz regressam a Portugal, com uma incómoda tonelada de lixo

Uma tonelada de lixo foi despejada no Museu de Lamas, em Santa Maria da Feira. A instalação, criada para o festival BasqueirArt, acompanha a exposição do fotógrafo Mário Cruz sobre a poluição no rio Pasig e quer tornar-se incómoda. O festival começa a 19 de Junho e termina a 22 de Agosto.

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A avalanche de lixo que produzimos em nossas casas vai entrar no Museu de Lamas, em Santa Maria da Feira, para incomodar e despertar uma “consciência colectiva”. “O que as pessoas vão ver no Museu é normalmente descrito como uma projecção de futuro muito negra. A verdade é que não é nenhuma projecção, é o presente”, defende Mário Cruz, um dos responsáveis pela instalação.

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A avalanche de lixo que produzimos em nossas casas vai entrar no Museu de Lamas, em Santa Maria da Feira, para incomodar e despertar uma “consciência colectiva”. “O que as pessoas vão ver no Museu é normalmente descrito como uma projecção de futuro muito negra. A verdade é que não é nenhuma projecção, é o presente”, defende Mário Cruz, um dos responsáveis pela instalação.

No final de um percurso onde o lixo será impossível de evitar, encontra-se a exposição Living among what's left behind (em português, “vivendo entre o que é deixado para trás") do fotojornalista que, em 2018, retratou o rio Pasig, em Manila, nas Filipinas, onde a acumulação de lixo na água é de tal forma extrema que é possível caminhar sobre os resíduos.

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Museu de Lamas

“Nós, portugueses, não vemos no dia-a-dia uma pequena parte do problema que encontramos quando visitamos esta exposição. Mas o que se está a passar em Manila afecta-nos, é um problema global”, diz Mário Cruz, premiado duas vezes no concurso World Press Photo, em conversa com o P3. “Em Portugal, procuramos o rio para nos tranquilizar. Nas Filipinas é o oposto. Quando vamos até ao rio Pasig não encontramos tranquilidade. Não vemos água, vemos lixo.”

Impressionado pela realidade que encontrou em Pasig decidiu que a levaria, guardada em fotografias, ao maior número de lugares possível. A exposição, que já passou por Oeiras, Roma, Bruxelas e Macau, atravessa o Atlântico em Setembro para chegar, também, à Colômbia.

“Eu caminhei sobre o rio, nunca pensei que pudesse andar sobre um rio de plástico. Isso transforma qualquer pessoa”, recorda. “Espero que a exposição incomode quem a vir, porque a mim só me interessa a fotografia que incomoda. O ideal era incomodar e transformar.” E, diz, no “caso da poluição ambiental”, a “arte tem um papel determinante nas discussões globais": “O Museu de Lamas, através do Basqueiral, teve a ousadia de aceitar este desafio.” O espaço poderá, ainda, ser em horário nocturno, para um “ambiente mais sombrio”. 

A instalação e exposição são parte do programa BasqueirArt, resultado da colaboração entre o Museu de Lamas e a associação cultural Basqueiro. A sustentabilidade ambiental é o tema escolhido para guiar a edição de 2021, por considerarem que é “uma questão incontornável da actualidade” e defenderem que uma abordagem artística funciona como “um meio de consciencialização e debate de ideias”.

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Museu de Lamas

Foi por isso que Susana Ferreira, directora do Museu de Lamas, aceitou que “cerca de uma tonelada de lixo” ficasse a decorar diferentes salas do espaço ao longo de dois meses. “Como estamos a viver uma pandemia, tínhamos de arrojar e decidimos apresentar instalações efémeras com recurso a lixo limpo, para motivar uma reflexão e discussão em torno de questões ambientais muito prementes”, declarou à Lusa.

A ala do Museu de Lamas dedicada à arte sacra é um dos cenários das sete criações com resíduos, assinadas por diferentes autores, que ficará coberto por plástico e cartão, mas também têxteis, brinquedos e peças informáticas. Os materiais em fim de vida foram recolhidos ao longo de meses por grupos da comunidade local e devidamente tratados para poderem entrar neste espaço. “Houve lixo que chegou a ir à máquina de lavar, para nunca se colocar em causa a conservação e a preservação do espólio integrado na nossa exposição permanente”, realça Susana Ferreira. 

O programa BasqueirArt funciona como extensão do festival de música Basqueiral, que, desde 2017, se realiza em Santa Maria da Feira, no distrito de Aveiro. A edição de 2021, que começa a 19 de Junho e termina a 22 de Agosto, incluirá concertos, sessões de cinema, instalações artísticas, um mural de arte urbana, entre outros espectáculos. Existem opções de entrada livre e outras a preços até cinco euros.