Alzheimer. Há uma nova pista sobre os neurónios velhos que perdem sinapses
Equipa de investigadores em Portugal identificou um novo mecanismo associado aos neurónios envelhecidos que pode abrir uma nova via terapêutica para travar a doença de Alzheimer.
Já se sabe que a idade é o maior factor de risco para a doença de Alzheimer na sua forma mais comum, de início tardio. Mais ainda há muito por esclarecer sobre o que acontece no cérebro à medida que a idade avança e que leva ao desenvolvimento desta doença neurodegenerativa. Uma equipa de investigadores do CEDOC, o centro de investigação da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa publicou um artigo na revista Journal of Cell Science com mais uma pista importante: ao envelhecerem connosco, os neurónios consomem mais uma substância que conduz à perda de sinapses. A mesma substância que está associada à doença de Alzheimer.
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Já se sabe que a idade é o maior factor de risco para a doença de Alzheimer na sua forma mais comum, de início tardio. Mais ainda há muito por esclarecer sobre o que acontece no cérebro à medida que a idade avança e que leva ao desenvolvimento desta doença neurodegenerativa. Uma equipa de investigadores do CEDOC, o centro de investigação da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa publicou um artigo na revista Journal of Cell Science com mais uma pista importante: ao envelhecerem connosco, os neurónios consomem mais uma substância que conduz à perda de sinapses. A mesma substância que está associada à doença de Alzheimer.
Em resumo, a equipa coordenada pela investigadora Cláudia Almeida identificou um “problema de consumo” nos neurónios envelhecidos que pode abrir uma nova via de interferir no desenvolvimento de Alzheimer. Antes de avançar, tal como refere o artigo, convém lembrar que “ao contrário de outras células cerebrais, a maioria dos neurónios nascem embrionariamente, não são submetidos à divisão celular e, portanto, têm uma idade cronológica igual à do organismo”. Ou seja, os neurónios envelhecem connosco.
Sabe-se também que na doença de Alzheimer há acumulação de uma proteína (beta-amilóide) que leva à perda de sinapses (e também à morte de neurónios). “Existe toda uma cascata complexa de eventos ligada a essa acumulação exagerada de beta-amilóide. Mas mesmo quando as pessoas não têm Alzheimer existe também a acumulação desta substância associada ao envelhecimento, numa altura em que também se pode verificar algum défice cognitivo”, começa por explicar ao PÚBLICO Cláudia Almeida. Também se sabe que o envelhecimento é um factor de risco para Alzheimer. Faltava ligar as duas coisas.
À procura de uma resposta a equipa observou neurónios de ratinhos no laboratório, em cultura de células. “Vimos que tinham acumulação de beta-amilóide ainda numa fase intracelular que precede a formação das placas extracelulares associadas à doença de Alzheimer. E vimos que esses neurónios perdem as sinapses só por envelhecerem em cultura”, refere a investigadora. Para ligar um fenómeno ao outro, os investigadores bloquearam a produção de beta-amilóide nos neurónios envelhecidos. “Fomos ver o que acontecia às sinapses e ficaram melhores. O número de sinapses aumentou nos neurónios envelhecidos.”
Mas era preciso dar outro passo atrás e tentar perceber como este excesso de beta-amilóide se acumula nos neurónios à medida que vão envelhecendo, esclarecer os mecanismos celulares. “Para já, o que nós descobrimos foi que os neurónios só por ficarem mais velhos têm um aumento enorme de endocitose da proteína precursora da amilóide (APP)”. Mas o que é que isso quer dizer? Simplificando, a equipa percebeu que os neurónios mais velhos têm um consumo aumentado de uma proteína específica que depois, no interior das células, produz a beta-amilóide. “Isto pode explicar porque é que o envelhecimento é um factor de risco para a doença de Alzheimer”, confirma Cláudia Almeida.
Os investigadores tentaram também usar um fármaco (aprovado para outra indicação clínica) que é capaz de travar este consumo de APP para o interior das células, a tal endocitose. Isso diminuiu a produção da beta-amilóide, confirma Cláudia Almeida. E preserva as sinapses nestes neurónios envelhecidos? “Ainda não chegámos aí. O próximo passo será procurar perceber se este bloqueio consegue reverter o número de sinapses. O que fizemos agora foi ao contrário: aumentamos a endocitose em neurónios jovens e vimos que isso levava a um aumento de beta-amilóide e a uma perda de sinapses.”
Agora vamos ao passo em frente. “Agora vamos testar inibidores da endocitose que interfiram de forma muito específica com a endocitose da APP neste ponto, porque a endocitose é necessária para outras funções sinápticas.” Além disso, a equipa está ainda a explorar “outros mecanismos associados ao envelhecimento que também afectam as sinapses” para encontrar o melhor alvo.
Numa pequena entrevista que acompanha a publicação do artigo, Tatiana Burrinha, a primeira autora deste trabalho e aluna de doutoramento, diz que um dos maiores desafios deste projecto foi compreender se a perda sináptica observada nos neurónios idosos se devia ao aumento da endocitose. “Fiquei superfeliz por ver que o aumento da endocitose diminuiu o número de sinapses em neurónios maduros, recapitulando o fenótipo dos neurónios envelhecidos”, revela. Não só foi possível detectar e seguir este consumo da proteína APP nos neurónios, mas a equipa também observou pela primeira vez que o envelhecimento modifica este consumo, destaca a jovem investigadora.