Fundação Júlio Pomar e Galeria 111 trocam acusações sobre empréstimo de obras

Para voltar a colaborar com a Fundação Júlio Pomar, a Galeria 111 exige um pedido de desculpas.

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A Fundação Júlio Pomar, que gere um acervo e promove exposições sobre a obra do artista, acusou esta semana a Galeria 111, cujos proprietários são herdeiros da Colecção Manuel de Brito, de recusarem ceder obras para uma exposição em Lisboa.

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A Fundação Júlio Pomar, que gere um acervo e promove exposições sobre a obra do artista, acusou esta semana a Galeria 111, cujos proprietários são herdeiros da Colecção Manuel de Brito, de recusarem ceder obras para uma exposição em Lisboa.

Numa mensagem colocada na rede social Facebook na terça-feira, assinada pelo presidente da Fundação Júlio Pomar, Alexandre Pomar, este queixa-se da alegada recusa da Galeria 111 em ceder “quaisquer obras” para uma exposição no Atelier-Museu Júlio Pomar, e aponta justificações “insólitas e inaceitáveis” por parte de Rui Brito e Arlete Alves da Silva, entretanto negadas pelos dois galeristas, que exigem um pedido de desculpas.

A próxima exposição do Atelier-Museu Júlio Pomar “está em preparação e já se recebem as obras solicitadas a vários coleccionadores e proprietários, mas, pela segunda vez, a Galeria 111 recusou ceder quaisquer obras — o que antes sucedera quando da exposição dedicada ao retrato, em 2020, depois da boa colaboração anterior”, indica Alexandre Pomar um texto colocado pela Fundação, a 15 de Junho.

“Não parece haver nenhum contencioso com o museu da Câmara Municipal de Lisboa [Atelier-Museu Júlio Pomar] nem com a Fundação Júlio Pomar (são entidades totalmente distintas) nem com a memória do artista, a família, herdeiros, etc. As justificações — de acordo com correspondência trocada — são insólitas e inaceitáveis, mas a recusa da Galeria 111 (e/ou da chamada Colecção Manuel de Brito), expressa pelo actual director da Galeria, Rui Brito, e por Arlete Alves da Silva, não foi ultrapassada, e sobre isso se irá dizer adiante alguma coisa, contando que o equívoco se desfaça numa próxima oportunidade”, acrescenta.

O filho do conceituado artista falecido em 2018, aos 92 anos, escreve ainda: “O museu não se irá pronunciar, mas cabe-nos trazer a público um comportamento que é impróprio de uma entidade galerística credenciada”, e adianta que “duas obras que permanecem na família de Manuel de Brito serão expostas, o que, além do mais, dará bom testemunho da longa relação do galerista e coleccionador com Júlio Pomar”.

Contrapartida financeira

Contactado pela agência Lusa, o galerista Rui Brito reagiu aos comentários do presidente da Fundação Júlio Pomar dizendo que a recusa de obras “não sucedeu”, e que actualmente enfrenta constrangimentos e dificuldades em agilizar a resposta aos muitos pedidos de cedência de obras da Colecção Manuel de Brito para várias instituições, uma vez que muitas sofreram, nesse processo, “um grande desgaste, tendo sido necessários muitos restauros e algumas [...] foram mesmo danificadas”.

“Devemos referir que alguns destes pedidos de empréstimos são feitos com prazos que não são aceitáveis para o tipo de instituições em causa”, indica o galerista, numa resposta por correio electrónico às perguntas da Lusa.

Neste caso específico do Atelier-Museu Júlio Pomar, “tendo em conta o número de obras que nos foi pedido, propusemos uma contrapartida financeira pelo empréstimo das obras, prática corrente nos dias de hoje, proposta que foi liminarmente recusada, sem qualquer justificação, nem houve qualquer tipo de contraproposta por parte da Fundação” Júlio Pomar.

“Depois disso, houve algumas trocas de mensagens com Alexandre Pomar, que usou um tom inaceitável de ameaça e difamação. Foi com muita surpresa e desagrado que vimos o post no facebook da Fundação Júlio Pomar, até porque tanto eu como a minha mãe [Arlete Alves da Silva] fazemos parte do Conselho de Fundadores da referida Fundação”, lamenta.

Rui Brito vê desta forma a postura da Fundação apresentada na rede social: “Inaceitável e difamatória, que condenamos, e até que a Fundação apresente e publique um pedido de desculpa formal à Galeria 111, a mim, à minha mãe e à minha irmã, não iremos colaborar mais com a Fundação Júlio Pomar”, garante.

“Esta decisão deixa-nos naturalmente muito tristes por ser um artista de referência da nossa Colecção, e pela relação de proximidade e amizade que sempre tivemos com o Júlio Pomar, e lamentamos muito que a Fundação tenha decidido tomar esta posição”, acrescenta.

Nas explicações, o galerista diz ainda que existe “uma clara confusão entre a Galeria 111 e a Colecção Manuel de Brito”.

Desde 1946 que a Galeria 111 presta um serviço de divulgação e comercialização de artistas plásticos: “O seu fundador, Manuel de Brito, paralelamente à sua actividade de galerista, tornou-se um coleccionador de arte moderna e contemporânea, e as duas actividades sempre foram bem separadas.”

“A Galeria tem obras de Júlio Pomar para comercialização, mas nenhuma dessas obras foi requisitada pela Fundação Júlio Pomar para esta exposição, pelo que, desde já, não entendemos a referência ao nome da Galeria 111 e a uma eventual recusa de obras que não sucedeu”, destrinça.

Quando Manuel de Brito morreu, em 2005, a colecção foi distribuída pelos seus herdeiros, e a Galeria 111 continuou a actividade com a direcção do filho, Rui Brito, e da mãe, viúva do coleccionador.

Ao longo da vida, Manuel de Brito (1928-2005) — um dos primeiros e maiores galeristas e livreiros do país — reuniu cerca de duas mil obras de arte, desde escultura, pintura e desenho, criando uma das maiores e mais importantes colecções privadas de arte do país.

De acordo com Rui Brito, mais de 300 obras de vários artistas foram incorporadas na colecção deste o falecimento do coleccionador Manuel de Brito, incluindo a célebre pintura Almoço do Trolha, de Júlio Pomar.

“Sempre procurámos colaborar com todas as instituições museológicas ao longo dos anos, emprestando centenas de obras da colecção. Durante o período da duração do protocolo com a Câmara Municipal de Oeiras, que terminou em 2018, foi mais fácil agilizar essas colaborações, porque tínhamos uma equipa para tratar da colecção. Durante esse período, de mais de 11 anos, a colecção sofreu um grande desgaste, tendo sido necessários muitos restauros e algumas obras foram mesmo danificadas”, relatou, sobre o período em que esteve no Palácio dos Anjos, em Algés.

Acrescentou que grande parte da colecção está actualmente num espaço dedicado para esse efeito, no armazém da Galeria 111 e, “neste momento, não tem estrutura para dar resposta às muitas solicitações de empréstimo que surgem quase semanalmente”.

“Desde a abertura do novo espaço da Galeria 111, em Fevereiro de 2020, que o fluxo de trabalho cresceu exponencialmente, e nem eu, nem a minha mãe, conseguimos dar resposta aos pedidos de empréstimos, nem achamos que a nossa actividade galerística deva ser sacrificada pela nossa gestão da colecção privada para que esta seja um “pronto-socorro” de algumas instituições”, considera o galerista.

Adianta ainda que “está a ser criada uma estrutura neste momento para lidar com a colecção”, e os herdeiros vão dispor de um espaço no Campo Grande para esse fim, esperando que, “nessa altura, seja mais fácil darmos seguimento a alguns dos pedidos”.

O protocolo assinado para 11 anos de cedência do Palácio dos Anjos, pela Câmara Municipal de Oeiras, liderada por Isaltino Morais, para a criação do Centro de Arte Manuel de Brito, e realização de exposições da colecção, terminou em Novembro de 2017. As negociações foram sendo adiadas, acabando por não ser renovado.

O CAMB foi inaugurado em Novembro de 2006 com a exposição antológica dedicada à pintora portuguesa Menez (1926-1995).