Ex-Presidente Jorge Sampaio lamenta aumento de totalitarismos e de populismos

Jorge Sampaio esteve na apresentação do livro “A Minha Terra é Linda - Histórias dos Estudantes Sírios em Portugal”.

Foto
Jorge Sampaio, ex-Presidente da República Francisco Romao Pereira

O antigo Presidente português Jorge Sampaio lamentou nesta quinta-feira, em Lisboa, a degradação generalizada das relações internacionais e um retrocesso nas democracias, bem como o aumento de regimes autoritários e a “força crescente” dos populismos.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

O antigo Presidente português Jorge Sampaio lamentou nesta quinta-feira, em Lisboa, a degradação generalizada das relações internacionais e um retrocesso nas democracias, bem como o aumento de regimes autoritários e a “força crescente” dos populismos.

Sampaio falava na sessão de apresentação do livro “A Minha Terra é Linda - Histórias dos Estudantes Sírios em Portugal”, um conjunto de 30 depoimentos de alunos do ensino superior que, ao abrigo de bolsas de estudo, vieram estudar para universidades portuguesas para fugir à guerra na Síria, que se prolonga há mais de 10 anos.

“A segunda década deste século tem sido marcada por turbulências crescentes no plano global, por uma degradação generalizada das relações internacionais e por um retrocesso das democracias”, afirmou o antigo chefe de Estado português, que dirige a Associação Plataforma Global de Estudantes Sírios (APGES).

No Auditório do Instituto de Defesa Nacional (IDN), em Lisboa, Sampaio, Presidente entre 1996 e 2006, considerou que o retrocesso “é visível” no “aumento” de regimes autoritários, na “força crescente” dos populismos e no “acumular de disfuncionamentos vários” nos mecanismos democráticos.

“Estes têm tardado em ajustar-se aos desafios trazidos pelas profundas transformações em curso em todos os planos, da economia ao trabalho, passando pelas alterações climáticas, pela saúde pública, pelos canais de comunicação digital e pela organização social, em geral”, afirmou.

O presidente da APGES destacou também a questão das migrações, “em especial as forçadas”, que se encontra entre os desafios mais prementes devido sobretudo ao número e à longa duração dos conflitos em curso, mas também por causa da “insegurança crescente” e das “gritantes desigualdades de oportunidades” em todo o mundo.

“Os jovens são dos grupos mais afectados pelas situações de emergência humanitária, tanto mais que o acesso à educação ainda é visto nestes contextos de crise como um luxo dispensável. Em tempos de guerra, ameaça e insegurança, o acesso ao ensino superior é, ao invés, um instrumento de protecção, um vector de resiliência e um verdadeiro valor-refúgio que permite alimentar a esperança no futuro”, prosseguiu.

Ao fazer a “ponte” para a situação dos estudantes sírios a frequentar instituições de ensino superior em Portugal, Sampaio sublinhou que a APGES, ao apostar na educação universitária em situações de emergência humanitária, tem procurado dar corpo às iniciativas que têm vindo a ser desenvolvidas desde 2014.

“Modestamente, é o que nós, na APGES, temos procurado fazer com o programa de bolsas de estudo e emergência, numa primeira fase, focado em estudantes sírios, mas, agora, já aberto a qualquer estudante oriundo de sociedades afectadas por conflitos”, explicou.

Desde 2014, foram concedidas mais de 650 bolsas de estudo anuais e já 135 boleiros sírios concluíram licenciaturas, mestrados ou doutoramentos, a grande maioria em Portugal, mas também no Líbano, Jordânia, Egipto, França, Alemanha, Canadá e Estados Unidos.

Em Portugal foram acolhidos cerca de 300 estudantes sírios - 135 estão actualmente a finalizar o curso, 130 estão já empregados e apenas cinco procuram emprego, avançou, por seu lado, Helena Barroco, coordenadora do projecto.

O “livrinho de histórias”, tal como refere o próprio Jorge Sampaio no prefácio da obra, sob a chancela da Âncora Editora, que a publicou, juntamente com a Norprint - A Casa do Livro, gratuitamente, reúne depoimentos na primeira pessoa de alguns dos bolseiros do programa de bolsas de estudos de emergência, bem como relatos sobre a forma como a iniciativa foi desenvolvida ao longo dos anos pela APGES.

Com 139 páginas, “A Minha Terra é Linda - Histórias dos Estudantes Sírios em Portugal” teve na génese um triplo objectivo: contar a história da iniciativa e partilhar histórias pessoais dos estudantes, contribuir para mobilizar mais apoios e apelar a que mais iniciativas de inclusão e integração possam ocorrer.

Para o financiamento das bolsas de estudo, a APGES conta com um grupo variado de parceiros e sócios, entre Governo, entidades públicas, comunidade académica, sector privado, fundações e ainda de particulares, bem como, hoje, com uma receita adicional pela venda do livro, ao preço de cinco euros.

No livro são avançadas duas curtas notas prévias de leitura, sublinhando-se que os títulos da maior parte das histórias correspondem a canções bem conhecidas, pelo que “se tenha optado pela não tradução, aconselhando-se o leitor a procurar associar cada capítulo às melodias” em causa.

Por outro lado, os textos escritos pelos estudantes, bem como as referências que lhes são feitas, apenas estão identificados com os nomes próprios, “podendo estes ter sido alterados por razões óbvias”.

Na iniciativa participaram também os secretários de Estado portugueses dos Negócios Estrangeiros, Francisco André, e da Ciência Tecnologia e Ensino Superior, João Sobrinho Teixeira, bem como a antiga jornalista do jornal PÚBLICO, Francisca Gorjão Henriques, que deixou recentemente o jornalismo para se dedicar à causa e que apresentou hoje o livro.