Presidente da Associação de Tondela onde morreram 11 pessoas acusado de homicídio por negligência

Acusação do Ministério Púbico diz que o arguido sabia que a sede da associação tinha sofrido obras sem licenciamento, o edifício não tinha vistoria e as alterações do espaço impediram uma rápida e eficaz fuga das pessoas.

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Sergio Azenha (colaborador)

O presidente da Associação de Vila Nova da Rainha, no concelho de Tondela, está acusado de 11 crimes de homicídio por negligência e de um crime de ofensa à integridade física negligente grave.

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O presidente da Associação de Vila Nova da Rainha, no concelho de Tondela, está acusado de 11 crimes de homicídio por negligência e de um crime de ofensa à integridade física negligente grave.

Segundo o Ministério Público, o arguido tinha conhecimento que o edifício, onde em 2018 morreram 11 pessoas que estavam a participar num torneio de sueca, nunca tinha sido objecto de vistoria e foi alvo de várias obras sem licenciamento. Uma das intervenções foi a aplicação de material inflamável e combustível (poliuretano), cujo uso estava proibido desde 1989.

“Se o arguido na construção do edifício tivesse cumprido todas as normas de segurança, o que não fez, não obstante ter pleno conhecimento das exigências legais que tem que cumprir um estabelecimento aberto ao público em geral, ter-se-ia evitado seguramente a magnitude do incêndio e as consequências humanas e materiais que ele provocou”, lê-se na acusação a que o PÚBLICO teve acesso.

No despacho é ainda descrito que uma vez que o salão não era dotado de qualquer via alternativa de saída de evacuação de emergência, as pelo menos 60 pessoas presentes no primeiro piso “confluíram em pânico para a única saída com escadas de acesso ao piso térreo, de 19 degraus em granito, sem a largura necessária exigida por lei, e que culminavam numa porta de batente de uma folha de alumínio, que abria para o interior”.

A inexistência de uma saída de emergência impediu uma “rápida e eficaz” fuga das pessoas que morreram por asfixia, inalação de fumos tóxicos e queimaduras.

O caso aconteceu na noite de 13 de Janeiro de 2018. Como se conta na acusação, no piso superior, cerca de 60 pessoas disputavam o torneio, enquanto que no andar inferior estariam 15. A noite estava fria, a rondar os 0 graus centígrados, e a salamandra foi acesa. A determinada altura, devido ao excesso de carga térmica, a conduta de evacuação de fumos, entre o tecto falso e a cobertura, rebentou, “o que por irradiação ao material inflamável deu origem a um incêndio que rapidamente se propagou pelo tecto”. O local dispunha de duas lâmpadas de sinalização de saídas de emergência, mas o edifício não era dotado de extintores de incêndio.

A “violação de normas legais sobre a construção, licenciamento, segurança e a omissão dos comportamentos adequados por parte do arguido foi causa adequada, para que o incêndio eclodisse e se propagasse rápida e violentamente, num edifício com as características descritas e que atingisse proporções que de outra forma não ocorreriam”, acrescenta o Ministério Público que conclui que o presidente da Associação tinha “perfeito conhecimento que o edifício não oferecia condições de segurança para a realização de um evento com a participação de 60 pessoas”.