Chelas é o Sítio onde os filhos do bairro se unem para defender uma identidade

Há uma nova associação em Chelas, Lisboa, que junta moradores para dinamizar o espaço público, a cultura e educação. Quer, sobretudo, recuperar o orgulho num bairro que ainda é visto com preconceito, por quem nunca lá entrou, mas, também, por quem lá cresceu.

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Adriano Finuras, Nuno Varela, Samuel Mira (Sam The Kid), Ricardo Gomes e Zé Silva. Daniel Rocha

Para quem nasceu e cresceu neste bairro de Lisboa, é urgente unir forças para travar o desaparecimento da palavra Chelas, substituída nas ruas, nos transportes, nos mapas, num processo semelhante ao da mudança nos antigos nomes das zonas que dividiam a área urbana de Marvila. Em frente ao local onde o colectivo Chelas é o Sítio se reúne, os sinais indicam que estamos no Bairro do Condado, a antiga Zona J.

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Para quem nasceu e cresceu neste bairro de Lisboa, é urgente unir forças para travar o desaparecimento da palavra Chelas, substituída nas ruas, nos transportes, nos mapas, num processo semelhante ao da mudança nos antigos nomes das zonas que dividiam a área urbana de Marvila. Em frente ao local onde o colectivo Chelas é o Sítio se reúne, os sinais indicam que estamos no Bairro do Condado, a antiga Zona J.

“Foi algo que deixámos passar. Sabemos que estamos a ser permissivos. A intenção de mudar o nome da Zona J veio de um lugar de preconceito, para apagar algo mal visto”, explica Samuel Mira, ou Sam The Kid. “Além de moradores, somos nativos, somos filhos, é a nossa identidade.” A identificação das zonas da freguesia de Marvila por letras do alfabeto foi alterada na década de 90. Contudo, ainda hoje, muitos jovens do bairro preferem usar os nomes antigos.

“Mudar o nome e não limpar as ruas, não arranjar os jardins, os prédios, não faz sentido. Sem uma intervenção social, urbanística, a zona continuará mal vista, os problemas continuarão cá”, acrescenta Ricardo Gomes, em entrevista do colectivo ao P3, no espaço da associação Torre Laranja, na Zona J, ou Condado.

Samuel Mira, Ricardo Gomes, Zé Silva, Adriano Finuras e Nuno Varela são apenas parte de um colectivo “feito por todos e para todos”, que quer “trazer mais valor” para Chelas, aproveitando o “potencial que a zona já por si oferece”, explicam, em comunicado. Em Maio de 2021, Chelas é o Sítio formalizou-se como associação sem fins lucrativos, uma sugestão do presidente da Câmara de Lisboa, Fernando Medina, que acompanhou o nascimento do projecto. 

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Daniel Rocha

A nova associação quer ajudar e incentivar os moradores de Chelas a não ficar de braços cruzados, tomar a palavra e tornar-se parte da evolução da freguesia onde vivem, para que não fiquem apenas dependentes dos órgãos executivos. Convoca, agora, toda a gente a participar na intervenção no espaço público, na criação de mais espaços verdes, mais equipamento urbano, iniciativas para dinamizar o desporto, a educação e a cultura.

Em Junho, levam os talentos de Chelas à Casa de Pedra, um restaurante gerido pelo Rock in Rio Lisboa, no Parque da Bela Vista. Ao primeiro concerto, de Danny The Dawg, segue-se o rapper Lewis, da Zona M, a 17 de Junho. Numa outra parceria com a Antena 3, serão divulgados artistas e espaços pouco conhecidos na freguesia de Marvila.

Também a sinalética à entrada da grande área do vale de Chelas será, em breve, transformada, para trazer de volta o nome do bairro e identificar espaços públicos. “Nós não estamos aqui para criar barreiras. O nosso objectivo é a inclusão”, defende Ricardo Gomes.

“É isto que nos dá a nossa identidade, o gosto de chegar aqui e saber que estamos em Chelas”, porque, afinal, Chelas é o sítio, Chelas é o berço, Chelas ‘tá no sangue, Chelas ‘tá nos genes, como escreveu, em 2001, Sam The Kid.

Estes miúdos podem ser o que quiserem

“Chelas é o Sítio não traz uma varinha de condão para resolver os problemas todos de Chelas e Marvila. Mas estamos cá para motivar as pessoas a fazê-lo”, porque, como explica Adriano Finuras, o principal propósito do trabalho do colectivo é recuperar o orgulho no nome de Chelas.

O primeiro passo, dizem, está dado: recuperar a identidade do bairro, em risco de ser apagada. O desafio é, agora, valorizá-la. “No meu trabalho, quando digo que sou de Chelas, pensam ‘Não, não podes ser’”, conta Ricardo Gomes. “As pessoas colocam um tecto [para o que podemos atingir] e esse tecto é muito baixo. Acabar o 9.º ano já é bom. As próprias escolas não puxam os jovens, não lhes dão mais ambição. Mas estes miúdos podem ambicionar o que quiserem. Podem ser o que quiserem.”

Para Ricardo, em poucos meses de trabalho deste colectivo, as perspectivas no bairro parecem já começar a mudar. “Vão começar a aparecer pessoas de Chelas [que escondiam a sua origem]. Nós crescíamos com este preconceito. [O estigma em relação a Chelas] ainda existe, de certeza. Acreditamos que, aos poucos, vai desaparecer.”