Nesta casa, o Tejo é o artista, e pinta a subida do nível das águas
A Casa de Água quer abrir a discussão sobre as alterações climáticas e a forma como já estão a mudar os lugares onde habitamos. Fica em exposição na galeria Antecâmara, em Lisboa, até 30 de Junho.
Ao entrar na galeria Antecâmara, na rua de Cabo Verde, em Lisboa, o ambiente sonoro dá-nos a sensação de um mergulho no mar. No centro da sala, existe uma pequena casa que convida à entrada, construída com chapas metálicas já enferrujadas. Avançamos para o interior, um espaço apertado, quase claustrofóbico, e o som do oceano é abafado por vozes humanas, barulhos familiares, do quotidiano de todas as casas.
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Ao entrar na galeria Antecâmara, na rua de Cabo Verde, em Lisboa, o ambiente sonoro dá-nos a sensação de um mergulho no mar. No centro da sala, existe uma pequena casa que convida à entrada, construída com chapas metálicas já enferrujadas. Avançamos para o interior, um espaço apertado, quase claustrofóbico, e o som do oceano é abafado por vozes humanas, barulhos familiares, do quotidiano de todas as casas.
As paredes de metal desta Casa de Água estiveram suspensas em vários lugares no cais de Olho de Boi, em Almada, e a diferentes profundidades. “Aí, sujeitas às oscilações das marés”, foram “desenhadas pelo próprio Tejo, cujas águas oxidam o metal”, explicam, em comunicado, os responsáveis pela exposição, Rui Soares Costa, Pedro Campos Costa e João Galante.
“Esta poética da acção do Tejo, o rio como artista, quer tornar visível, alertar e discutir a subida do nível das águas do mar”, uma consequência das alterações climáticas. Idealmente, estas peças regressarão, daqui a vários anos, talvez décadas, exactamente aos mesmos locais onde foram mergulhadas pelo artista Rui Soares Costa, e tornar-se-ão marcadores para assinalar a subida do nível das águas.
A Casa de Água ficará, até ser de novo mergulhada no Tejo, em constante transformação e degradação, sempre diferente, ainda que o processo seja lento e quase imperceptível.
“Geralmente, gostamos de coisas que não estejam a ser destruídas, que não estejam a morrer, não estejam caóticas. Que exista ordem. Aqui, não. Aqui temos de lidar com o caos, algo que não controlamos, muito mais forte do que nós”, explica o arquitecto Pedro Campos Costa, em entrevista ao P3. “Aqui, o artista é a natureza e há uma esperança de que possamos trabalhar com ela, em vez de a tentarmos domar.”
Esta exposição é a primeira da trilogia Três casas para a humanidade, acolhida pela galeria Antecâmara. À Casa de Água, seguir-se-á a Casa de Tempo e a Casa de Ar. A Casa de Tempo será feita de açúcar, efémera, e rapidamente consumida. A Casa de Ar não existirá fisicamente, terá apenas um formato digital. A proposta é abrir a discussão sobre os lugares onde habitamos e a sua transformação.
“Há pessoas que vão ter de sair do sítio onde vivem. Lisboa vai começar a sentir isto, mais cedo ou mais tarde. É preciso planear a cidade, há uma responsabilidade técnica e política no planeamento para a subida do nível das águas”, diz Pedro Campos Costa. “Este é um desafio actual da humanidade, não é do futuro, é de hoje, agora.”
Foi para tentar responder a estes desafios que se uniram três amigos, de três disciplinas, a partir de uma proposta de Rui Soares Costa. Rui trabalhou as peças metálicas, Pedro construiu a casa e João produziu o “som hipnotizante” que a habita. “Interessam-me trabalhos colaborativos, é isso que alimenta a minha própria disciplina. A riqueza é a pluralidade de perspectivas”, defende o arquitecto.
A exposição é gratuita e fica até 30 de Junho na galeria Antecâmara, em Lisboa. Para que vá além de um público-alvo que se pode tornar um nicho, estão a ser pensadas sessões e workshops didácticos para os alunos das escolas na freguesia de Arroios.
“Não é com esta casa que vamos resolver o problema da subida das águas, mas gostávamos que, a partir dela, as pessoas falassem sobre o tema”, conclui Pedro Campos Costa, curador do projecto Antecâmara.