A escola que se ilumina

A escola não necessita de grandes mudanças legislativas ou intervenções governamentais. A melhoria passa pela atitude e pela criação de incentivos que ponham em prática programas simples com poder de transformação qualitativa.

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Daniel Rocha

A divulgação dos resultados de desempenho, ao criar listagens ordenadas, serviu o ensino privado contribuindo para aumentar a sua capacidade de recrutamento de alunos no seio das classes médias-altas. O maior contributo dos rankings para a educação no seu todo é a visibilidade que dá ao tema e a possibilidade de se discutir a educação no espaço público.

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A divulgação dos resultados de desempenho, ao criar listagens ordenadas, serviu o ensino privado contribuindo para aumentar a sua capacidade de recrutamento de alunos no seio das classes médias-altas. O maior contributo dos rankings para a educação no seu todo é a visibilidade que dá ao tema e a possibilidade de se discutir a educação no espaço público.

Após mais de um ano de pandemia, que criou um enorme stress no sistema de ensino, importa refletir sobre as aprendizagens que daqui podemos retirar e de que modo estamos disponíveis para arriscar numa escola mais robusta e inclusiva.

Apesar dos enormes avanços de qualidade que os alunos portugueses revelaram nos últimos anos, ao ponto de o sistema se tornar um caso de estudo no seio dos países da OCDE, há ainda fragilidades às quais temos de estar atentos e aproveitar algumas das aprendizagens que o afastamento físico nos trouxe.

Deixo três ideias que podem ter impactos na qualidade do ensino pós-pandemia, contribuindo para que o humanista Perfil do Aluno à Saída da Escolaridade Obrigatória possa ser mais real:

  1. Com a aquisição de computadores em escala, 400 mil já entregues a alunos e professores, é o momento de modernizar as metodologias e centrar a escola nos alunos. O último inquérito TALIS (momento em que a OCDE questiona os docentes) mostra que em Portugal as metodologias expositivas continuavam a ser as preferidas (90% dos professores concordam) em detrimento de práticas com maior envolvimento dos alunos. A pandemia ensinou-nos que os alunos conseguem bons níveis de trabalho autónomo, quando orientados nesse sentido, e que mecanismos de feedback sobre a qualidade do trabalho e formas de melhorar são instrumentos poderosos de aprendizagem. Utilizar as ferramentas informáticas que facilitam este tipo de atividade deve ser um caminho a manter vivo, mesmo depois do regresso ao presencial. Voltar à sala de aula não tem de significar voltar a fazer como dantes.
  2. A proximidade que se estabeleceu com os encarregados de educação e o mútuo reconhecimento do esforço educativo deve ser outra oportunidade a não perder. As escolas devem aproveitar a quebra de barreiras de desconfiança para liderar projetos de proximidade, organizando programas em que a participação dos pais seja efetiva e não apenas nas reuniões com o diretor de turma ou festas de fim de ano. Conhecimento acumulado ao longo de mais de 50 anos aponta para ganhos de aprendizagem com custos relativamente baixos, em particular entre alunos provenientes de meios mais desfavorecidos. Alguns estudos referem ganhos a nível da disciplina e atitude dos alunos face à escola, de aumento de autoestima e expectativas para o futuro. Estes programas de aproximação poderiam cruzar-se com a formação de adultos, contribuindo para aumentar a escolarização na faixa etária dos 25 aos 50 anos (que são os pais), que é ainda deficitária. Pais mais educados contribuem de forma direta para a melhoria da qualidade de aprendizagem dos seus filhos.
  3. Aproveitar as inúmeras parcerias que se foram estabelecendo ao longo da pandemia com as câmaras municipais, juntas de freguesia, associações da sociedade civil e sociedades do conhecimento para manter vivos projetos que permitam a formação de indivíduos mais completos e atentos ao meio que os rodeia. A formalização de parcerias, para além da caridade em momento de emergência, traria para o centro da escola novos saberes nas artes, cultura e ciências. Estas parcerias representariam ganhos em ambos os sentidos – para os alunos e para os artistas e restante comunidade. A escola pode ter um papel relevante para que a cultura saia da crise em que mergulhou através da introdução de visitas de estudo ao património envolvente. Se todos os alunos fossem ao teatro duas vezes por ano e visitassem museus outras tantas, estariam a contribuir com o aumento de três milhões de espectadores para cada uma das atividades, mais do que duplicando o número de espectadores que foram ao teatro em 2019.

A escola não necessita de grandes mudanças legislativas ou intervenções governamentais. A melhoria passa pela atitude e pela criação de incentivos que ponham em prática programas simples com poder de transformação qualitativa.

Os últimos 20 anos marcam um longo caminho de progresso, queremos continuar a ver Portugal como um exemplo de boas práticas. Devemos ter a inteligência de inovar e aprender com os momentos em que somos obrigados a sair da zona de conforto. Este é o significado de ver a luz ao fundo do túnel.

A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico