BBC sob pressão depois de descobertas “falhas” na entrevista a Diana de 1995
Governantes, jornais, críticos e apoiantes estão de acordo num ponto: a emissora pública de radiodifusão britânica precisa de uma urgente reestruturação.
O Governo britânico prometeu, esta sexta-feira, examinar a forma como a BBC foi gerida, após um inquérito ter condenado a forma como a emissora pública obteve a polémica entrevista com a princesa Diana em 1995. O anúncio surge depois de o príncipe William, filho mais velho de Diana e segundo na linha de sucessão ao trono, ter tecido duras críticas à corporação britânica de radiodifusão.
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O Governo britânico prometeu, esta sexta-feira, examinar a forma como a BBC foi gerida, após um inquérito ter condenado a forma como a emissora pública obteve a polémica entrevista com a princesa Diana em 1995. O anúncio surge depois de o príncipe William, filho mais velho de Diana e segundo na linha de sucessão ao trono, ter tecido duras críticas à corporação britânica de radiodifusão.
Uma investigação independente concluiu, na quinta-feira, que o jornalista Martin Bashir mentiu e enganou com o objectivo de persuadir Diana a concordar com a entrevista, ao longo da qual a princesa revelou detalhes íntimos sobre a sua relação com o príncipe Carlos e sobre a sua vida no seio da família real.
A BBC foi também responsabilizada pela sua investigação “lamentavelmente ineficaz” às acções de Bashir, realizada no ano seguinte à emissão do programa, e por encobrir o caso. Bashir foi acusado de ter enganado o irmão de Diana, Charles Spencer, levando-o a pensar que Diana estava a ser espiada pelos seus funcionários e que não podia confiar nestes.
Numa declaração extremamente assertiva, William, agora com 38 anos, descreveu a forma como a entrevista foi obtida como “enganosa”. “É de uma tristeza indescritível saber que as falhas da BBC contribuíram significativamente para o medo, paranóia e isolamento [de Diana] de que me lembro desses últimos anos.” A princesa, que se divorciou oficialmente de Carlos em 1996, morreu num acidente de viação a 31 de Agosto de 1997.
O seu irmão mais novo, o príncipe Harry, disse que a entrevista fazia parte de uma série de práticas pouco éticas que acabaram por custar a vida à sua mãe. “A nossa mãe perdeu a sua vida por causa disto, e nada mudou”, disse, numa clara alusão à forma como a imprensa britânica o perseguiu, e à mulher, ao longo do último ano que o casal viveu no Reino Unido.
A BBC pediu desculpa pelas suas falhas, mas governantes, jornais, críticos e alguns apoiantes disseram que o episódio levanta várias questões para a emissora financiada pelo sector público — em Portugal, o paralelo serão as estações públicas de televisão e rádio, RTP e RDP.
Não fazer nada não é opção
O ministro da Justiça britânico, Robert Buckland, disse que “não fazer nada” não era uma opção à luz do inquérito do juiz jubilado do Supremo Tribunal do Reino Unido John Dyson. Já o ministro do Digital, Cultura, Media e Desporto, Oliver Dowden, disse que iria considerar se seriam necessárias mais reformas durante uma revisão aos estatutos da BBC, que estabelecem a missão da emissora de 98 anos, prevista para 2022, antes de ser renovada em 2027.
O assunto também não passou ao largo do primeiro-ministro. “Estou obviamente preocupado com as conclusões do relatório de lorde Dyson”, disse Boris Johnson à imprensa. “Só posso imaginar os sentimentos da família real e espero sinceramente que a BBC tome todas as medidas possíveis para garantir que nada como isto volte a acontecer.”
Para a BBC, o caso poderá ter consequências nefastas, já que alguns membros do Governo conservador britânico, Boris Johnson incluído, dizem que o modelo de financiamento da BBC, através de uma taxa cobrada a todas as famílias com uma televisão, está ultrapassado. E o assunto da forma como a entrevista a Diana foi obtida recorrendo a falsidades parece ser o gatilho certo para despertar o debate. “Tem de haver uma séria mudança estrutural de governação dentro da BBC”, considerou o antigo presidente da emissora, Michael Grade, à rádio BBC.
A classe também não parece com vontade de poupar a BBC, sobretudo os tablóides — afinal, alegam, no melhor pano cai a nódoa, recordando um escândalo de escutas ilegais, de há uma década, que conduziu ao fim do News of the World. “Há dez anos, quando o escândalo das escutas ilegais encerrou o News of the World, os jornalistas da BBC estavam entre os que mais barulho faziam a pedir sangue e desejosos por ver o The Sun também engolido”, recordo, quinta-feira, um artigo do The Sun, o tablóide gémeo do extinto News of the World de Rupert Murdoch. “A sua hipocrisia fedorenta não se perdeu em nós”, escreve-se.
Há quem, porém, tente deitar água na fervura, lembrando o aproveitamento que este caso pode gerar. “No meio da orgia de hipocrisia gerada pela declaração de William na imprensa, vale a pena reflectir o quão diferente é hoje a reportagem da BBC sobre os seus próprios fracassos do que a falta de tal reportagem pelos jornais sobre os seus próprios fracassos”, disse Alastair Campbell, chefe das comunicações do Governo de Tony Blair, o primeiro-ministro que ocupava, por altura da morte de Diana, o número 10 de Downing Street.
A polícia de Londres, que anteriormente excluiu uma investigação criminal ao processo de como a entrevista foi realizada, informou que os investigadores irão avaliar o conteúdo do relatório de Dyson para ver se há novas provas significativas.