“De alma cheia” na Zambujeira do Mar, a aldeia da minha praia
Conheço esta aldeia desde que nasci, local predilecto dos meus pais para uma fuga à monotonia das rotinas da cidade. Falo com o Palheirão e pergunto-lhe se sabe como vai estar o tempo, vai haver vento que estrague as ondas? O leitor Diogo Teixeira leva-nos a mergulhar na costa alentejana.
São 6h30 de um dia de Julho e o sol teima em não aparecer, remo em cima da prancha em direcção ao outside. Ainda não tenho os sentidos apurados, fruto da noitada a jogar cartas debaixo do alpendre exterior no Monte da Ti’ Madalena. A água fria desperta-me, os músculos retraem-se, uma onda cobre-me a cabeça. Sim, já acordei. Finalmente, chego ao ponto desejado, sento-me ao lado do meu amigo Palheirão e espero que uma onda me leve ao meu ponto de partida, o areal da praia da Zambujeira do Mar.
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São 6h30 de um dia de Julho e o sol teima em não aparecer, remo em cima da prancha em direcção ao outside. Ainda não tenho os sentidos apurados, fruto da noitada a jogar cartas debaixo do alpendre exterior no Monte da Ti’ Madalena. A água fria desperta-me, os músculos retraem-se, uma onda cobre-me a cabeça. Sim, já acordei. Finalmente, chego ao ponto desejado, sento-me ao lado do meu amigo Palheirão e espero que uma onda me leve ao meu ponto de partida, o areal da praia da Zambujeira do Mar.
Palheirão é um amigo de longa data. Conheço esta aldeia desde que nasci, local predilecto dos meus pais para uma fuga à monotonia das rotinas da cidade, campo e praia no mesmo saco. Falo com o Palheirão e pergunto-lhe se sabe como vai estar o tempo, vai haver vento que estrague as ondas? Escuta-me com cuidado e responde-me com o rebater de uma onda maior para que fique atento. Porém, permanece imóvel, imponente, um gigantesco calhau em xisto.
Regresso a terra para um pequeno-almoço reforçado, percorro as ruas da aldeia, casario baixo, paredes caiadas de branco, telhados cor de terra, azuis, rosa, amarelos debruam as portas e janelas. Gosto do burburinho dos afazeres da manhã, paro e contemplo o que me rodeia. Aqui o trabalho divide-se entre o pequeno comércio, a agricultura e a pesca. Encontro o Zé Boga e pergunto se foi ao perceve. Vida dura, a do pescador, escalar, galgar e descer falésias com cordas, mergulhar entre as rochas para arrancar os bichos com uma faca. Afinal, hoje não há marisco, temos de esperar pela maré vazia.
A aldeia tem-se alterado muito nos últimos anos. Terra de gente humilde, o turismo traz algum sustento por dois meses de Verão, mas o resto do ano ano é feito à custa da agricultura e pesca de subsistência. De há uns anos para cá as estufas tomaram conta da paisagem, dos homens e das suas vontades. Alfaces, tomates, flores e frutos vermelhos são os produtos mais cultivados, são exportados para todo o mundo, mas diz a ti Madalena que, apesar do bom dinheiro, está a matar os solos e a esgotar a água da região. As estufas já preenchem as terras costeiras entre Vila Nova de Milfontes e Odeceixe, milhares de hectares, trouxeram novos habitantes, muitos, asiáticos sobretudo.
Passar um dia nas bonitas praias desta aldeia é o suficiente para ficar com a alma cheia. A praia da Nossa Senhora ou a praia dos Alteirinhos, com as suas imponentes escarpas, já deram nomes a músicas e poemas. O resto do dia foi uma aventura pela rota dos pescadores, um trilho pedestre da rota vicentina que nos leva da Zambujeira a Almograve [e mais além], uma aldeia mais a norte. Num percurso com mais de vinte quilómetros, sempre junto à costa, aprecio as aves (muitas espécies diferentes!), as dunas vermelhas, os rochedos imponentes e a grande diversidade da vegetação.
Aqui o tempo passa devagar, numa rotina saudável, mas sem horas para acontecer. Amanhã volto ao meu encontro com o Palheirão.
Diogo Teixeira