Pfizer diz que Governo brasileiro ignorou cinco propostas para a compra de vacinas

Desde Agosto que o Governo federal tinha vindo a receber propostas da farmacêutica que podiam ter acelerado o início do processo de vacinação.

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Carlos Murillo enumerou as propostas da Pfizer junto do Governo brasileiro ADRIANO MACHADO / Reuters

Ao longo de 2020, a farmacêutica Pfizer fez pelo menos cinco propostas para a venda de vacinas ao Governo brasileiro que foram ignoradas em Brasília. A revelação foi feita pelo ex-responsável da farmacêutica no país durante a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Senado que investiga a conduta do Governo federal na pandemia.

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Ao longo de 2020, a farmacêutica Pfizer fez pelo menos cinco propostas para a venda de vacinas ao Governo brasileiro que foram ignoradas em Brasília. A revelação foi feita pelo ex-responsável da farmacêutica no país durante a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Senado que investiga a conduta do Governo federal na pandemia.

Entre Agosto e Novembro, a farmacêutica dirigiu-se ao executivo com cinco propostas diferentes para a venda de 70 milhões de doses da vacina contra o vírus SARS-CoV-2, algumas das quais previam o envio do primeiro pacote ainda em 2020. O processo de vacinação no Brasil só viria a começar em meados de Janeiro, não com vacinas da Pfizer, mas com a CoronaVac, a vacina desenvolvida numa parceria entre o Instituto Butantan, de São Paulo, e um laboratório chinês.

O depoimento de Carlos Murillo, actual director-geral da Pfizer na América Latina, confirma o que já se sabia quanto à recusa do Governo de Jair Bolsonaro em fechar acordos para a aquisição de vacinas, mas representa o testemunho com o impacto mais forte desde o início da CPI.

Um dos pontos principais que os senadores se propuseram inquirir é o papel do Governo federal na aquisição de vacinas. O relato de Murillo mostra que imobilidade de Bolsonaro e dos seus ministros durante os meses mais cruciais, em que a maioria dos países estava a negociar com as farmacêuticas, comprometeu o arranque do processo de vacinação no Brasil.

O Governo havia justificado a recusa em aceitar as propostas da Pfizer, acusando a farmacêutica de propor condições “leoninas”, mas Murillo garantiu que o que estava em cima da mesa era idêntico ao que foi apresentado a outros países.

Só em Março é que o Ministério da Saúde aceitou comprar cem milhões de doses da vacina da Pfizer, cuja maior parte (84 milhões) só deverá chegar ao Brasil a partir de Julho. Murillo esclareceu que, se as primeiras ofertas tivessem sido aceites, o Brasil já teria tido disponíveis 18,5 milhões de doses da vacina do laboratório alemão, contra 2,2 que foram entregues até agora.

Um estudo publicado esta semana, citado pela revista Veja, calculou que, se as primeiras propostas da Pfizer tivessem sido aceites, quase 14 mil idosos brasileiros com mais de 80 anos que morreram nos últimos meses poderiam ter sido vacinados a tempo.

A CPI tem-se debruçado sobre a conduta do Governo federal no combate à pandemia e tenta averiguar se existiu uma estratégia concertada de promoção do contágio natural da população para atingir a “imunidade colectiva”. Outra das linhas de investigação tenta apurar se o Governo foi negligente na aquisição de vacinas.

No final dos trabalhos, se se concluir que houve má gestão ou potenciais crimes cometidos, a comissão pode enviar um pedido de abertura de inquérito pelo Ministério Público Federal.