Morreu Maria João Abreu, uma apaixonada pelo teatro de revista, um fenómeno da televisão

A actriz de 57 anos morreu esta quinta-feira, confirmou ao PÚBLICO fonte do Hospital Garcia de Orta. O funeral realiza-se no sábado, na Igreja São João de Deus, em Lisboa.

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DR/Facebook

A popular actriz de teatro e televisão Maria João Abreu, de 57 anos, morreu esta quinta-feira, confirmou ao PÚBLICO fonte do Hospital Garcia de Orta. Encontrava-se internada, desde o dia 30 de Abril, no Hospital Garcia de Orta, em Almada, depois de ter sofrido um AVC hemorrágico, na sequência da rotura de um aneurisma cerebral.

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A popular actriz de teatro e televisão Maria João Abreu, de 57 anos, morreu esta quinta-feira, confirmou ao PÚBLICO fonte do Hospital Garcia de Orta. Encontrava-se internada, desde o dia 30 de Abril, no Hospital Garcia de Orta, em Almada, depois de ter sofrido um AVC hemorrágico, na sequência da rotura de um aneurisma cerebral.

A actriz, relatou a SIC na altura, sentiu-se mal e desmaiou durante as gravações da novela que está a ser produzida para o canal, A Serra. Inicialmente, Maria João Abreu foi assistida no local, tendo sido posteriormente transportada para o Hospital Prof. Doutor Fernando Fonseca (Amadora-Sintra) e, dada a gravidade da situação, transferida para Almada. Aí foi submetida a várias cirurgias e ficou em coma induzido, na esperança de uma recuperação, que não viria a acontecer. 

O funeral da actriz realiza-se este sábado, na Igreja São João de Deus, em Lisboa, avançou a Lusa citando a SIC. O velório terá início às 11h00 e a missa de corpo presente está marcada para as 17h00, seguindo depois o corpo para o crematório no Alto de São João, pelas 18h00.

A imensa popularidade de Maria João Abreu, resultado da assiduidade com que fez televisão e assim entrou diariamente nas casas dos portugueses, foi sublinhada pelo Presidente da República, que, em nota publicada no site da Presidência da República, se confessou “emocionado” perante a notícia da morte da actriz. “O humor, a emoção e a empatia ligam-nos aos outros, até aos outros que não conhecemos, como é o caso dos actores e das actrizes. Maria João Abreu, que nos deixou precocemente, escolheu essa abordagem, talvez por ser a abordagem que lhe era mais natural: a comédia, a projecção dos nossos afectos e dos nossos problemas, a proximidade humana”, escreveu Marcelo Rebelo de Sousa, notando que “o seu intenso currículo em televisão (novelas, séries, programas de entretenimento e de comédia) tornaram-na uma figura que representava para muitos portugueses a familiaridade de quem está connosco porque se parece connosco.”

Também a coordenadora do Bloco de Esquerda, Catarina Martins, que durante anos fez carreira no teatro (foi co-fundadora da companhia Visões Úteis), lamentou a morte daquela que considerou “uma das actrizes mais amadas” de Portugal, uma “excelente profissional” e “uma extraordinária pessoa de luta solidária”. “Vai-nos fazer falta com certeza”, lamentou.

A ministra da Cultura, Graça Fonseca, lembrou, por sua vez, que Maria João Abreu era “uma das intérpretes mais queridas pelo público português e uma figura inesquecível da televisão e dos palcos”. A nota de condolências enviada às redacções destaca o percurso de 30 anos desta “actriz destemida e versátil, capaz de nos surpreender e encantar em todos os registos, da revista ao experimental” e o empenho com que se dedicou na revitalização do teatro de revista.

“O seu trabalho televisivo”, ressalva ainda Graça Fonseca, “nunca a impediu de marcar presença nos palcos, que assumia como a sua grande paixão”, e nos quais se mostrou “uma actriz sensível, multifacetada e inteligente, cujo talento e dedicação eram reconhecidos no modo como respondia aos textos aos quais se entregava”.

“A cultura portuguesa perde hoje uma das suas actrizes mais marcantes, que sempre aceitou a sua popularidade não como um pedestal, mas como uma forma de constantemente se desafiar e de arriscar e inovar nos palcos. Maria João Abreu destacou-se também pelo seu lado humano, de mulher generosa e atenta às causas sociais, às quais se dedicava com o mesmo empenho que colocava no seu trabalho e com a empatia que todos lhe reconheciam”, sublinha a nota do Ministério da Cultura. 

Da SIC, estação para a qual estava a gravar também a série Patrões Fora, chegou um agradecimento a “uma mulher e actriz extraordinária, com um talento ímpar na arte de representar” que ficará “para sempre" na memória. Recordando a sua participação em produções como Trapos e Companhia, Jardins Proibidos ou Morangos com Açúcar, a TVI despediu-se também esta tarde, “com a mais profunda consternação”, desta actriz “de excelência” cuja morte deixa o país “mais pobre, assim como o teatro e a ficção portuguesa”.

Do teatro à televisão

Nascida em Lisboa em 1964, Maria João Abreu iniciou a sua carreira profissional no teatro, uma paixão que nunca abandonou (muito recentemente, em 2019, víramo-la protagonizar uma peça da Companhia de Teatro de Almada, Fenda), mas foi a televisão que lhe granjeou a popularidade, graças a produções como Médico de Família. Ao longo dos anos participou em mais de 60 programas, entre telefilmes, séries e telenovelas.

A sua carreira como actriz remonta, no entanto, a 1983, quando, aos 19 anos, se estreou profissionalmente no Teatro Maria Matos, no musical Annie, de Thomas Meehan, dirigido por Armando Cortez. A este sucederam-se outros espectáculos de teatro de revista no Parque Mayer, género popular em que foi especialmente assídua, até participar, na Casa da Comédia, em O Último dos Marialvas, de Neil Simon, peça estreada em 1991, que lhe daria visibilidade e reconhecimento como actriz de comédia.

Passou ainda pelo Teatro Aberto, onde trabalhou com João Lourenço em As Presidentes, de Werner Schawb, e com José Carretas, em Coelho Coelho, de Celine Serreau. Com Manuel Cintra e José Carretas, fez também Bolero, apresentado no Centro Cultural de Belém.

Mas não foi só de reconhecimento que a sua carreira profissional foi feita. O teatro também lhe trouxe sofrimento, como contou no programa Alta Definição, em 2019, na qual confessou ter sido vítima de bullying, ao ponto de “ir parar ao hospital com um ataque de ansiedade”.

A sua vida profissional sofreu uma reviravolta em 1998, ano em que fundou, com o também actor José Raposo (com quem estava então casada, desde 1985), a produtora Toca dos Raposos, responsável por sucessos como a revista Ó Troilaré, Ó Troilará e o musical Mulheres ao Poder. Foi também nesse ano que tomou a personagem Lucinda, uma empregada doméstica com sotaque nortenho, na série televisiva Médico de Família (1998-2000), transformando-a numa das protagonistas da acção desta popular série da SIC.

O sucesso da série garantiu a sua presença na TV durante três temporadas e 118 episódios, ao longo de quase três anos de emissão. No cinema, a sua estreia deu-se em 1999, com o filme António, Um Rapaz de Lisboa, de Jorge Silva Melo, seguindo-se depois participações em obras como Amo-te Teresa, de Ricardo Espírito Santo e Cristina Boavida, Telefona-me, de Frederico Corado, e A Falha, de João Mário Grilo.

Mais recentemente, participou em filmes como Call Girl, de António-Pedro Vasconcelos, Florbela, de Vicente Alves do Ó, A Mãe é que Sabe, de Nuno Rocha, e Submissão, de Leonardo António. Ao longo dos seus mais de 35 anos de carreira, e apesar das muitas requisições para televisão, nunca deixou o teatro nem a revista, uma das suas grandes paixões, tendo co-protagonizado, em 2004, A Rainha do Ferro Velho, de Garson Kanin, encenada por Filipe La Féria, no Teatro Politeama.

Na década de 2000, entrou em produções como Tem a Palavra a Revista ou Já Viram Isto?!, no Teatro Maria Vitória, e em O Estádio da Nação, no Teatro Sá da Bandeira, no Porto, a que se seguiram comédias como As Encalhadas, numa versão de Ana Bola, ou Eu Conheço-te, de Heitor Lourenço, e Pobre Milionário, de Francis Veber, com Miguel Guilherme.

Num registo diferente fez também, nos Artistas Unidos, Cada Dia a cada Um a Liberdade e o Reino, uma concepção de Jorge Silva Melo a partir de textos de Almeida Garrett, Passos Manuel e Sá-Carneiro, entre outros autores. Em 2012, protagonizou a peça O Libertino, de Eric-Emmanuel Schmitt, dirigida por José Fonseca e Costa, no Teatro da Trindade e, dois anos mais tarde, entrava na “revista-musical” Portugal à Gargalhada.

Ainda em 2014, quando passavam 40 anos sobre o 25 de Abril, participou na encenação de Coragem Hoje, Abraços Amanhã, de Joana Brandão, peça concebida a partir de testemunhos, cartas e memórias de mulheres presas e torturadas pela PIDE, a polícia política da ditadura do Estado Novo. Na mesma altura, foi uma das “Mulheres de Abril”, no episódio da série Uma Calma e Lânguida Primavera, dirigido por Henrique Oliveira.

No percurso da actriz nos palcos, seguiram-se Uma Mulher sem Importância, a partir de Oscar Wilde, no Teatro Maria Matos, em 2015, e Boas Pessoas, de David Lindsay-Abaire, no Teatro Aberto, em 2016.

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Maria João Abreu, aqui ao lado de Marta Ferreira, é a padeira Sãozinha Grilo em A Serra DR/SIC

A sua última participação no teatro aconteceu em 2019, quando protagonizou Sonho de Uma Noite de Verão, no Tivoli, contracenando com José Raposo e com o filho de ambos, Miguel Raposo. Era também com o ex-marido que contracenava na telenovela A Serra e na série Patrões fora, ambas actualmente em gravações e em exibição. 

Golpe de Sorte, Sul, Paixão, Amor Maior, A Casa é Minha, Mar Salgado, Os Nossos Dias, Mundo ao Contrário, Sentimentos, Feitiço de Amor, Jardins Proibidos e Morangos com Açúcar foram outras produções televisivas que contaram com a sua participação.

Maria João Abreu esteve casada 23 anos com José Raposo, de quem teve dois filhos, Miguel Raposo e Ricardo Raposo. Em Setembro de 2012 voltou a casar-se, com o músico João Soares.

Notícia actualizada com informação sobre o funeral.