PJ faz buscas na Câmara de Lisboa por suspeitas de corrupção no Urbanismo

Processos na mira da polícia são a Torre de Picoas, o Hospital da Luz, a Segunda Circular e o projecto para os terrenos da antiga Feira Popular, entre outros. Fernando Medina diz-se “tranquilo”.

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Miguel Manso

A Polícia Judiciária fez esta terça-feira buscas no departamento de Urbanismo da Câmara de Lisboa, no Campo Grande, e também nos Paços do Concelho. Os inspectores estiveram a analisar documentos relativos à Segunda Circular, à Torre de Picoas, ao Hospital da Luz, à reabilitação do Miradouro de São Pedro de Alcântara e à chamada Operação Integrada de Entrecampos, que abrange os terrenos da antiga Feira Popular, entre outros.

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A Polícia Judiciária fez esta terça-feira buscas no departamento de Urbanismo da Câmara de Lisboa, no Campo Grande, e também nos Paços do Concelho. Os inspectores estiveram a analisar documentos relativos à Segunda Circular, à Torre de Picoas, ao Hospital da Luz, à reabilitação do Miradouro de São Pedro de Alcântara e à chamada Operação Integrada de Entrecampos, que abrange os terrenos da antiga Feira Popular, entre outros.

A notícia foi avançada pelo Observador e confirmada pelo PÚBLICO junto de fonte da Polícia Judiciária, que acrescentou que as buscas estão relacionadas com suspeitas de corrupção e crimes conexos. 

A autarquia também confirmou ao PÚBLICO a realização das buscas. “O município facultou toda a documentação e prestou toda a colaboração ao Ministério Público e PJ, como sempre acontece quando solicitado”, informou fonte oficial.

Em declarações aos jornalistas nos Paços do Concelho na tarde desta terça-feira, o presidente da Câmara de Lisboa, Fernando Medina, disse-se “tranquilo” com o curso das buscas. “Estou tranquilo com tudo aquilo que conheço, com tudo aquilo sobre o qual tenho poder de decisão e dever de acompanhar e monitorizar. A instituição que está mais interessada num cabal esclarecimento é a câmara”, notou o autarca. 

Os oito processos urbanísticos e de obras que estão na mira das autoridades remontam a um período em que este pelouro pertencia ao arquitecto Manuel Salgado e em que Fernando Medina tinha já assumido a liderança do município. Aos jornalistas, o autarca fez questão de frisar, por diversas ocasiões, que estes são processos já “amplamente conhecidos e escrutinados” pelo executivo, pelas autoridades e pela própria comunicação social. 

“A Operação Integrada de Entrecampos foi um processo muito acompanhado pelos vereadores, na Assembleia Municipal e Lisboa e foi particularmente acompanhada pelo Ministério Público”, disse, lembrando que, no caso da Segunda Circular, a própria câmara avançou com uma queixa ao MP. Na verdade, o município avançou com uma denúncia relativa à actuação do empreiteiro nesse processo e os vereadores da oposição apresentaram uma queixa contra o município relativa à interrupção da empreitada de reabilitação da Segunda Circular. 

Fernando Medina disse ainda que o município vai avançar com uma queixa sobre as obras na Piscina da Penha de França, cujo imbróglio levou à quebra de contrato com o empreiteiro por, diz a câmara, não ter cumprido com o caderno de encargos. 

Segundo disse, nenhuma pessoa visada nas investigações “ocupa hoje funções no executivo”. O autarca reiterou ainda confiança nas pessoas que trabalham no município, seja no executivo ou nos serviços. “A Câmara de Lisboa é uma entidade idónea, assim como os seus quadros directivos e técnicos. Reafirmo a confiança nas pessoas que aqui trabalharam e trabalham”, insistiu. 

Medina disse estar a colaborar de forma “muita activa” com as autoridades para que tudo se esclareça. “Sou o primeiro interessado em apoiar a investigação para que ela decorra o mais rapidamente possível.” Disse ainda não ter informação de alguém ter sido constituído arguido na sequência destas novas buscas. 

Como o PÚBLICO noticiou em Julho de 2017, o Ministério Público está a investigar a construção da chamada Torre de Picoas, na Av. Fontes Pereira de Melo, a ampliação do Hospital da Luz e a interrupção da empreitada de reabilitação da Segunda Circular. Um outro inquérito, relativo à Associação de Turismo de Lisboa, foi entretanto arquivado. De acordo com a autarquia, que emitiu um comunicado ao princípio da tarde, “as diligências hoje efectuadas são as primeiras que a câmara tem conhecimento sobre estes processos.”

Já em 2017 algumas testemunhas davam conta de que a PJ fez perguntas sobre estes assuntos, mas também sobre o Plano de Pormenor da Matinha e sobre a reabilitação do Miradouro de São Pedro de Alcântara, que agora estão também a ser investigados pelas autoridades. Outros temas na mira da PJ são a aprovação de um prédio na Praça das Flores, as obras de reabilitação da Piscina da Penha de França, as Twin Towers e o Convento do Beato.

O ex-vereador do Urbanismo Manuel Salgado é uma figura central em todos estes processos. O arquitecto demitiu-se da presidência da Sociedade de Reabilitação Urbana (SRU) em meados de Fevereiro por ter sido constituído arguido num inquérito relacionado com a aprovação do Hospital CUF Tejo, em Alcântara. Já depois disso deu uma entrevista ao PÚBLICO em que se queixou de ter servido como “pára-raios” na Câmara de Lisboa.

Um comunicado conjunto do Ministério Público e da Polícia Judiciária explica que no âmbito desta operação, baptizada pelas autoridades como Olissipus, se realizaram diligências não só em Lisboa como também em Sintra, Cascais, Caldas da Rainha e no Alvor, envolvendo a participação de seis magistrados do Ministério Público e ainda de noventa inspectores e peritos. “Estarão em causa suspeitas da prática de crimes cometidos no exercício de funções públicas, relacionados com a área do urbanismo da Câmara de Lisboa, nomeadamente, abuso de poder, participação económica em negócio, corrupção, prevaricação, violação de regras urbanísticas e tráfico de influências”, detalha a nota de imprensa. 

Em causa estão não um mas oito inquéritos diferentes, dirigidos pelos seis procuradores do Departamento de Investigação e Acção Penal Regional de Lisboa. Estas investigações, algumas das quais frutos de denúncias apresentadas às autoridades, tiveram início em momentos diferentes, no período entre 2015 e 2019, mas reportam a factos que podem ser mais antigos. 

Esta terça-feira foram executados 28 mandados de busca, das quais dez domiciliárias e 18 não domiciliárias - ou seja, feitas a escritórios, nomeadamente de empresas - visando a recolha de documentação relacionada com as alegadas práticas criminosas. Também houve pelo menos uma casa de férias alvo das atenções da Judiciária, que teve no terreno inspectores de duas unidades, a de combate à corrupção e a de perícia tecnológica e informática, tendo sido apreendidos alguns telemóveis e computadores. Não foram constituídos arguidos nesta fase das investigações. 

Segundo o mesmo comunicado, as investigações prosseguem. O PÚBLICO não conseguiu falar até ao momento nem com Manuel Salgado nem com a advogada que o representa. Quando foi constituído arguido no caso do Hospital da CUF Tejo, este arquitecto remeteu-se ao silêncio, não tendo prestado declarações ao Ministério Público.

Moedas diz que suspeita “corrói” a democracia e lembra Sócrates

Em reacção às buscas que decorreram esta terça-feira nos serviços municipais, o candidato da coligação PSD/CDS-PP à Câmara de Lisboa, Carlos Moedas, disse que as recorrentes investigações à gestão urbanística têm vindo “a levantar suspeitas sobre a prática política da CML” e que tal “corrói” a democracia, arremessando José Sócrates para a discussão.

“Não são apenas os comportamentos do ex-primeiro-ministro José Sócrates que corroem o funcionamento da democracia. A suspeita em volta da actuação política na CML também corrói e, a confirmar-se, revela uma forma de governar a cidade que considero absolutamente inaceitável”, nota Moedas num comunicado enviado às redacções. 

Nessa nota, o antigo comissário europeudiz esperar que as diligências das autoridades “contribuam para apurar toda a verdade em relação a casos de gestão urbanística que há vários anos têm vindo a levantar suspeitas sobre a prática política” sobre a gestão da capital. “Até lá, enquanto o processo de investigação evolui, há uma sombra que paira sobre a prática de actos quotidianos da maior relevância e centenas de funcionários municipais ficarão fortemente desmotivados no exercício das suas funções. Em paralelo, os munícipes, particulares ou empresas, serão vítimas do ambiente de suspeição e receio que se instalará”, escreveu ainda. 

Notícia actualizada às 20h35: Acrescenta declarações de Carlos Moedas