João Paulo Batalha: “O risco é que a Operação Marquês acabe como o Casa Pia”
Antigo presidente da TIAC questiona lentidão da Justiça neste caso, contestando justificação de Ivo Rosa para não levar Sócrates a julgamento por fraude fiscal. Magistrado disse que antigo primeiro-ministro não tinha obrigação de declarar dinheiro alegadamente recebido como suborno.
Quando José Sócrates foi detido no aeroporto de Lisboa, a 21 de Novembro de 2014, João Paulo Batalha estava na direcção da Transparência e Integridade - Associação Cívica (TIAC). Esta sexta-feira, sete anos após a detenção do antigo primeiro-ministro, foi conhecida a decisão do juiz de instrução Ivo Rosa, que deixou cair o julgamento por corrupção, João Paulo Batalha, que esteve no cargo de presidente da TIAC entre 2017 e 2020, questiona as justificações apresentadas pelo magistrado.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Quando José Sócrates foi detido no aeroporto de Lisboa, a 21 de Novembro de 2014, João Paulo Batalha estava na direcção da Transparência e Integridade - Associação Cívica (TIAC). Esta sexta-feira, sete anos após a detenção do antigo primeiro-ministro, foi conhecida a decisão do juiz de instrução Ivo Rosa, que deixou cair o julgamento por corrupção, João Paulo Batalha, que esteve no cargo de presidente da TIAC entre 2017 e 2020, questiona as justificações apresentadas pelo magistrado.
“A ideia de que não há crime fiscal, apesar de a lei dizer explicitamente que as pessoas têm de declarar os seus rendimentos – incluindo o das actividades ilícitas –, porque seria auto-incriminação é bizarra. Se não serve para isso, então o crime fiscal não serve para nada”, começa por dizer João Paulo Batalha, em declarações ao PÚBLICO.
Ivo Rosa entendeu que José Sócrates não podia ser julgado pelo crime de fraude fiscal, considerando que não estava obrigado a declarar o dinheiro que teria alegadamente recebido como suborno. Caso o fizesse, estaria a “proceder à sua auto-incriminação”.
“Se a interpretação do juiz Ivo Rosa prevalecer, podemos riscar esse crime [de fraude fiscal] do Código Penal”, afirma João Paulo Batalha, que voltou a criticar a morosidade deste processo. “No final de processo, daqui a muitos anos, pode levar a que os cidadãos não tenham confiança no resultado. O grande risco é que a Operação Marquês acabe como o caso Casa Pia: mesmo depois de chegar ao fim, ninguém confia na decisão que foi tomada. As pessoas mantêm as suas convicções íntimas sobre quem é culpado ou inocente.
Relativamente à prescrição de dois dos três crimes de corrupção de que José Sócrates era acusado, João Paulo Batalha distribui a responsabilidade por dois sectores.
“Vai ter de ser clarificado como é contabilizada a prescrição, mas é uma questão política e sobre a organização do sistema judicial. Enquanto José Sócrates foi primeiro-ministro ninguém ‘lhe tocou’, ninguém o investigou e o tempo estava a contar. Há responsabilidades a dois níveis. [Temos de] arrumar o sistema judicial para que seja eficaz — que não está a ser. Mas também percebemos que o Estado era, na altura dos factos em que Sócrates era primeiro-ministro, completamente incapaz de detectar estes problemas e de reagir”, conclui.
Em Setembro de 2020, Susana Coroado substituiu João Paulo Batalha na presidência da TIAC. Em declarações ao PÚBLICO, a responsável também deixa alertas, ressalvando contudo que ainda terá que se esperar pelo recurso do Ministério Público
“Estou ainda surpreendida com esta decisão. É grave, vai ter inevitavelmente consequências para a investigação e julgamento da corrupção em Portugal”, explicou ao PÚBLICO, após a leitura de decisão instrutória.
Na leitura às declarações de Ivo Rosa, Susana Coroado considera que o magistrado tentou responsabilizar a classe política: “O que me surpreendeu mais foi o facto de durante anos termos ouvido o poder político sacudir a água do capote e dizer: ‘À Justiça o que é da Justiça’. Hoje o que o juiz Ivo Rosa veio dizer é que há muita coisa que é há muita coisa que não é da Justiça, mas sim da Política. Devolve a responsabilidade ao poder político, que terá de se pronunciar”