Faculdades low cost
Dizer que os estudantes abandonaram os estudos durante a pandemia seria um eufemismo. O ensino superior abandonou os estudantes.
O período de pandemia tem levado o sistema de ensino a experimentar um novo modelo de funcionamento, aliando-se à evolução tecnológica, no qual o ensino à distância se tem vindo a impor. Isto vem abrir espaço para a crescente mercantilização do ensino: reduz-se o custo do ensino, aumenta-se o lucro e a educação consolida-se como um bem de consumo em oposição a um bem inalienável a todos e todas. Criamos as faculdades low cost, na qual as aulas se gravam dispensando os docentes, os custos associados ao ensino ficam ao encargo dos próprios estudantes e as assimetrias socioeconómicas cada vez mais acentuadas. Será este o futuro do ensino pós-covid 19?
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O período de pandemia tem levado o sistema de ensino a experimentar um novo modelo de funcionamento, aliando-se à evolução tecnológica, no qual o ensino à distância se tem vindo a impor. Isto vem abrir espaço para a crescente mercantilização do ensino: reduz-se o custo do ensino, aumenta-se o lucro e a educação consolida-se como um bem de consumo em oposição a um bem inalienável a todos e todas. Criamos as faculdades low cost, na qual as aulas se gravam dispensando os docentes, os custos associados ao ensino ficam ao encargo dos próprios estudantes e as assimetrias socioeconómicas cada vez mais acentuadas. Será este o futuro do ensino pós-covid 19?
Já conhecíamos os problemas estruturais do ensino superior em Portugal. O aumento progressivo da propina, que em 1991 subiu dos seis euros simbólicos para os 250, colocou-se como o primeiro grande ataque para um ensino que se queria universal, gratuito e acessível. O valor instaurado pela propina tinha como objectivo reverter para o acréscimo da qualidade do sistema. No entanto, isto não se verifica e as dinâmicas de desinvestimento estatal no ensino superior vêem-se revigoradas.
Portugal é um dos países que apresenta valores mais elevados de propina quando comparamos com o enquadramento europeu. Sendo que somos um país onde este encargo financeiro recai principalmente sobre as famílias, verificamos facilmente o modo como a pandemia e a redução abrupta destes rendimentos veio impactar os estudantes. Se a propina nunca fez sentido, com a pandemia ainda se veio mostrar um plano mais absurdo. Esta lógica confrontou-se com a realidade da ausência de condições materiais para o estudo, conjugada com as dificuldades técnicas que tornaram a formação dos estudantes deficiente quando comparada com a de outras estudantes num contexto pré-covid. Este problema agravará, certamente, a entrada destes milhares de estudantes no mercado de trabalho, onde enfrentarão a precariedade que os aguarda e que já é característica desta geração “à rasca”.
Os problemas da gentrificação urbana e da falta de alojamento estudantil também vieram agudizar muitas das dificuldades já sentidas por estudantes, em particular, deslocados.
Com esta mudança no paradigma social, estes espaços que definimos como emancipatórios e como mecanismos que visavam gerar igualdade social revelam-se como espaços para a manutenção económico-social, abertos para os mesmos de sempre e excluindo os mesmos de sempre. A pandemia criou condições para que deixássemos de olhar para instituições de ensino na sua transversalidade: com a obrigação de garantir apoio psicológico e como um espaço de criação de laços sociais, essenciais para a luta de defesa do ensino superior.
Dizer que os estudantes abandonaram os estudos durante a pandemia seria um eufemismo. O ensino superior abandonou os estudantes.