Governo deixa cálculo das despesas do teletrabalho para a negociação colectiva

Pelo Código do Trabalho, os gastos com Internet e telefone devem ser assegurados pelos empregadores. Ministra do Trabalho diz que o cálculo deve ser consensualizado através de negociação colectiva.

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Ana Mendes Godinho vai apresentar uma proposta legislativa para regular condições laborais nas plataformas digitais Enric Vives-Rubio

O Governo entende que, à luz do Código do Trabalho, as empresas têm de pagar as despesas relacionadas com Internet e telefone aos trabalhadores que actualmente exercem a sua actividade a partir de casa, mas, como a lei não regula como é que esses encargos são calculados, o executivo considera que esta matéria deve ser regulada através da negociação colectiva, para ter em conta as especificidades dos vários sectores de actividade.

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O Governo entende que, à luz do Código do Trabalho, as empresas têm de pagar as despesas relacionadas com Internet e telefone aos trabalhadores que actualmente exercem a sua actividade a partir de casa, mas, como a lei não regula como é que esses encargos são calculados, o executivo considera que esta matéria deve ser regulada através da negociação colectiva, para ter em conta as especificidades dos vários sectores de actividade.

A ministra do Trabalho, Ana Mendes Godinho, apresentou aos parceiros sociais, nesta quarta-feira, as linhas gerais do Livro Verde sobre o futuro do trabalho, documento que recomenda que a regulamentação do teletrabalho salvaguarde o princípio de que este regime não implica um “acréscimo de custos para os trabalhadores”.

No final da reunião, que se realizou por videoconferência, a ministra foi questionada em conferência de imprensa sobre como é que, neste momento, antes de essas alterações existirem, as empresas devem calcular essas despesas.

Ana Mendes Godinho entende que estas questões devem ser “analisadas sectorialmente”, porque, diz, não pode haver uma solução igual para todos tendo em conta que as despesas podem ser “aferidas de uma forma diferente” tendo em conta as funções dos trabalhadores.

“Essa matéria não é regulada ao pormenor pela lei [Código do Trabalho]. É enquadrada; aliás, [o Código] até identifica as despesas que podem ser consideradas e que não devem ser imputadas ao trabalhador. Naturalmente, a nossa opção — aliás, no próprio Livro Verde isso consta como uma linha de orientação — é [a de] que as matérias sejam o mais possível reguladas em sede de negociação colectiva”, disse a ministra do Trabalho.

Ana Mendes Godinho disse que as questões das despesas não são matérias em relação às quais se possa dizer “de uma forma igual para todos — de uma forma de banda larga” — como é que se deve proceder para fazer esse cálculo. “Devem ser analisadas caso a caso”. Os aspectos a regular, justificou, têm de ter em conta as especificidades dos vários sectores de actividade ou os tipos de funções que são exercidas pelos trabalhadores.

A negociação colectiva é um processo de diálogo em que, de um lado, está uma (ou mais) organizações de trabalhadores e, do outro, uma (ou mais) empregadores ou organizações de entidades patronais, que as duas partes negoceiam “com o objectivo de alcançar um acordo colectivo que regule os termos e as condições de emprego e as relações” laborais, como, por exemplo, salários, horas de trabalho, férias e matérias de segurança e saúde, sintetiza um documento da Organização Internacional do Trabalho.

A questão da responsabilidade pelo pagamento do acréscimo de despesas passou a ser discutida de forma mais intensa no último ano por causa do aumento do número de pessoas em teletrabalho, dado que há dúvidas sobre quais são as obrigações das entidades patronais relativamente a alguns gastos, como os acréscimos de consumo de electricidade ou de gás.

Acordo e mais excepções

A interpretação que o Governo faz do Código do Trabalho é a de que as empresas têm de pagar a Internet e telefone, mas não as despesas de água, electricidade ou gás.

Na base dessa leitura está o Artigo 168.º do Código do Trabalho, segundo o qual, “na falta de estipulação no contrato”, os instrumentos de tecnologias de informação e comunicação usados no teletrabalho “pertencem ao empregador, que deve assegurar as respectivas instalação e manutenção e o pagamento das inerentes despesas”.

Quanto à forma de cálculo destes dois encargos — Internet e telefone —, a ministra afirma que não tem havido “sinalização junto da ACT [Autoridade para as Condições do Trabalho] de reclamações sobre esta matéria e, portanto, naturalmente, deve ser cada vez mais regulada em termos de negociação colectiva e de acordo”.

A ministra reafirmou ainda que, fora o período excepcional neste período da pandemia, em que o teletrabalho é nalguns casos obrigatório, uma imposição legal quando as funções são compatíveis, esta modalidade só se deve aplicar quando há acordo entre o empregador e o trabalhador. No entanto, o Livro Verde sobre o futuro do trabalho que o Governo apresentou aos parceiros propõe um alargamento das situações em que uma pessoa tem esse direito “independentemente de acordo com o empregador”, de forma total ou parcial, “nomeadamente no âmbito da promoção da conciliação entre trabalho e vida pessoal e familiar” no caso dos trabalhadores com deficiência ou incapacidade.

Ana Mendes Godinho não disse se o executivo irá apresentar uma proposta legislativa (ou se será o PS, o partido do Governo, a fazê-lo para acompanhar outros partidos que já estão a trabalhar nos seus próprios projectos legislativos). A ministra disse que as alterações têm de passar pelo Parlamento e comprometeu-se a envolver os parceiros sociais para encontrar consensos em relação aos assuntos relacionados com o teletrabalho.

Já relativamente à regulação das condições de trabalho nas plataformas digitais (como a de estafetas que entregam produtos comprados através de aplicações como a Uber Eats ou a Glovo), Ana Mendes Godinho disse que o Governo assumirá uma proposta legislativa “em curto prazo”.

O documento entregue aos parceiros sociais ainda é pouco concreto. Coloca o objectivo de se criar “uma presunção de laboralidade para estes trabalhadores e um sistema contributivo e fiscal adaptado a esta nova realidade”.