Não há teatro fora da vida, a vida não é teatro
Talvez valha a pena dizer que hoje não há teatro. O chamado ‘teatro online’ não é teatro. Pode ser — e é, certamente, muitas vezes — um objecto artístico de muito ou igual valor a um objecto teatral. Mas o teatro, para acontecer, não dispensa a presença viva e simultânea, em tempo e espaço, do que o faz e do que assiste. Teatro sem gente não é teatro.
Eu não sei se no momento actual faz muito sentido comemorar o Dia Mundial do Teatro. A Humanidade padece de duas gravíssimas pandemias: a que leva o nome de covid-19 e uma outra sem nome (ou de muitos nomes) e que é em boa parte responsável pela primeira. Digo a pandemia que se espelha nessa primeira na voragem com que o Hemisfério Norte açambarca as vacinas, tal como açambarca já a água.
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Eu não sei se no momento actual faz muito sentido comemorar o Dia Mundial do Teatro. A Humanidade padece de duas gravíssimas pandemias: a que leva o nome de covid-19 e uma outra sem nome (ou de muitos nomes) e que é em boa parte responsável pela primeira. Digo a pandemia que se espelha nessa primeira na voragem com que o Hemisfério Norte açambarca as vacinas, tal como açambarca já a água.
Talvez, neste tempo de tantos equívocos, valha a pena dizer que hoje não há teatro. O chamado ‘teatro online’ não é teatro. Pode ser — e é, certamente, muitas vezes — um objecto artístico de muito ou igual valor a um objecto teatral. Mas o teatro, para acontecer, não dispensa a presença viva e simultânea, em tempo e espaço, do que o faz e do que assiste, mais a representação do que é feito e não o feito em si.
Estes equívocos de hoje são os mesmos que fazem crer que a vida pode ser vivida em avatares. São os mesmos que emudecem a grandeza da Arte e a trivializam. São os mesmos que iludem a realidade por todos os jeitos artificiais. É, no fundo, o equívoco entre o que somos e o que fingimos ser. Como se o fingir ser do teatro tivesse trocado com o ser da vida os lugares.
Se as máscaras que salvaguardam medidas sanitárias passassem a ser encaradas como as de Pierrot ou Arlequim, o teatro sim, estaria morto. Porque o teatro fala do Ser Humano, não o substitui. O grande palco da vida não é o pequeno palco que a evoca. São, isso sim, companheiros inseparáveis. Teatro sem gente não é teatro.
Mas é bom que o teatro saiba que sem vida deixa de o ser. Eu só desejo que, à medida que tenhamos janelas para aspirar a vida, mesmo que por períodos mais adiante de novo interrompidos, o teatro retire para si mesmo a lição dessa sua condição frágil e humana. Para vir falar da vida: tanto faz que exaltando o belo, quanto denunciando o que vai mal. Mas sem ausência do género humano nele. Porque também sem isso não há teatro.
E quando deixar de haver teatro, é sinal de que o Ser Humano já iniciou definitivamente a sua própria extinção. Isto sim é o que me parece que vale a pena invocar neste Dia Mundial do Teatro.