Reunião do Infarmed: esta semana deverão ser administradas 277 mil vacinas

Até ao fim desta semana, 28% do pessoal das escolas deverá ser vacinado. Crianças não parecem ter um “papel relevante” no risco de infecção nas famílias, defendeu Henrique Barros. Reunião que junta peritos e políticos decorreu nesta terça-feira.

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Vice-almirante Gouveia e Melo, coordenador da task force de vacinação contra a covid-19 LUSA/MÁRIO CRUZ

O responsável pela task force ​que coordena o processo da vacinação contra a covid-19 em Portugal, o vice-almirante Gouveia e Melo, afirmou na reunião do Infarmed que decorreu nesta terça-feira, para analisar a situação epidemiológica nacional, que Portugal já recebeu 1,7 milhões de vacinas destinadas ao continente e 95 mil para os arquipélagos. Dessas, já foram administrados 1,3 milhões. Esta semana vão ser administradas 277 mil vacinas. Pelo menos 63 mil são da AstraZeneca – para compensar a semana em que não foram administradas vacinas daquela farmacêutica.

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O responsável pela task force ​que coordena o processo da vacinação contra a covid-19 em Portugal, o vice-almirante Gouveia e Melo, afirmou na reunião do Infarmed que decorreu nesta terça-feira, para analisar a situação epidemiológica nacional, que Portugal já recebeu 1,7 milhões de vacinas destinadas ao continente e 95 mil para os arquipélagos. Dessas, já foram administrados 1,3 milhões. Esta semana vão ser administradas 277 mil vacinas. Pelo menos 63 mil são da AstraZeneca – para compensar a semana em que não foram administradas vacinas daquela farmacêutica.

Ainda de acordo com Gouveia e Melo, não há alterações significativas relativamente à previsão das fases de vacinação. Pelo menos 70% das pessoas serão vacinadas com a primeira dose até ao fim do Verão – sendo que isso pode mudar ligeiramente.

“Estamos num ritmo crescente de administração de vacinas”, afirmou. Esse ritmo vai, no segundo trimestre, atingir as 95 mil a cem mil vacinas aplicadas por dia, e poderá aumentar até cem mil vacinas por dia em Julho, de acordo com o gráfico que Gouveia e Melo mostrou.

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Na segunda quinzena de Abril, o país deverá receber a vacina da Janssen (Johnson & Johnson).

Até ao fim desta semana, 28% do pessoal das escolas deverá ser vacinado

Até ao final da semana, 28% dos docentes e não docentes das escolas deverão estar vacinados. O vice-almirante Gouveia e Melo disse ainda que, no final desta semana, estarão vacinados um milhão de portugueses com a primeira dose e meio milhão com a segunda dose da vacina, se todas as previsões se verificarem.

Estes números mostram “a capacidade de vacinação” e gestão do stock: “As vacinas que nos estão a chegar são todas administradas no prazo de uma semana”, afirmou. De acordo com Gouveia e Melo, prevê-se que, até ao final da semana, estejam vacinados quase todos os trabalhadores e utentes de lares e trabalhadores dos serviços essenciais. As previsões apontam para 90% de vacinação em ERPI (estruturas residenciais para idosos). “Estão praticamente todas cobertas, tirando as que estão a sair de surtos”, afirmou. Nas pessoas com mais de 80 anos, as previsões apontam para 83% até ao final desta semana; nas pessoas com mais de 50 anos com comorbilidades, 67%; nos profissionais de saúde, 94%; nos profissionais de serviços essenciais, 99%; e nos docentes e não docentes de escolas, 28% “ficarão vacinados no fim-de-semana”.

Vacinação terá um “papel central” na resposta à pandemia

Também a participar na sessão, o epidemiologista Henrique de Barros, do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto, falou sobre a vacinação e a efectividade vacinal, tendo apresentado dados que têm por base a experiência do Centro Hospitalar Universitário de São João, no Porto, que conta com cerca de 7000 funcionários, dos quais aproximadamente mil tiveram covid-19 e 4700 foram depois vacinados a partir de 27 de Dezembro.

“No início, os funcionários do hospital tinham muito mais infecção do que a população geral, mas, nesta altura, os profissionais de saúde eram muito mais testados do que a população em geral”, explicou Henrique de Barros. “Depois há uma certa aproximação e depois, após o início da vacinação, a infecção decresce mais cedo nestes profissionais do que no resto do país”, acrescentou.

O especialista destacou que “o número de casos observados é cerca de metade dos casos que esperaríamos se estas pessoas não tivessem sido vacinadas” e que, em termos de efectividade vacinal, os resultados indicam a existência de sete casos de infecção nos vacinados para cada cem casos nos não vacinados.

Porém, o especialista destacou ainda que o risco de infecção numa unidade hospitalar varia entre os assistentes operacionais (em que é muito mais alto), os médicos (um pouco mais baixo) e os enfermeiros (valor intermédio).

Segundo o estudo apresentado, a efectividade vacinal foi de 91%, sendo esta uma “extraordinária informação e segurança” que revela que “a vacinação em exercício foi igual ao valor descrito para a eficácia nos ensaios”. O que leva Henrique de Barros a concluir que “a vacinação é um processo efectivo de prevenção e tem um papel central no planeamento da resposta à infecção a curto prazo”, sendo “evidente que a diminuição dos casos em contextos específicos — como nos profissionais de saúde — será também observável na população em geral”.

Crianças não parecem ter um “papel relevante” no risco de infecção nas famílias

Henrique de Barros falou ainda sobre as crianças, as escolas e o risco de infecção. Nesse sentido, o especialista questionou se “será nas idades escolares que vamos agora passar a encontrar as infecções, até por causa da escolha de vacinação que fizemos, deixando estes grupos etários mais susceptíveis para o encontro com o vírus”.

Henrique de Barros deu o exemplo de Inglaterra e sublinhou que, nesse caso, “como se percebeu que as crianças e adolescentes não tinham um risco aparentemente aumentado de infecção nem de transmissão e que as escolas não estavam a contribuir para a transmissão, houve uma despreocupação com as atitudes e medidas de mitigação da infecção, o que gerou a ideia de que o fecho das escolas podia ter um papel determinante não só na diminuição do risco de infecção como também no combate à infecção”.

Porém, quando olhamos para os resultados de estudos feitos, “não a partir de dados agregados, mas a partir de estudos com pessoas em particular (dados primários) em crianças e adolescentes, eles mostram que há um menor risco de infecção nas pessoas com menos de 20 anos”. “Globalmente, as crianças e adolescentes têm um risco menor de infecção e, embora a evidência não seja forte, parecem também ter um papel menor do que o dos adultos na transmissão”, explicou.

Em Portugal, “na primeira onda praticamente toda a infecção aconteceu nas idades mais avançadas, e a proporção de crianças que ficaram infectadas foi muito pequena”. Já na segunda onda, em que houve uma abertura das escolas, depois o período de férias do Natal e posteriormente o fecho das escolas, “vemos que com as escolas abertas a infecção sobe e desce, sobe com as escolas fechadas, continua a subir e até faz um pequeno plateau com as escolas abertas e depois desce”.

“O que vemos quando olhamos não só para as idades escolares é que as pessoas mais velhas é que ficam infectadas primeiro, e parece haver uma concordância com a infecção na comunidade, e isto pode significar que, ao contrário de outros países, como foi o caso do Reino Unido, em Portugal as medidas de mitigação e protecção no ambiente escolar foram levadas muito a sério e, por isso, os nossos resultados são diferentes dos resultados de outros países em que isso não aconteceu”, concluiu.

Henrique de Barros destacou ainda que, em particular na região norte, “a evolução da infecção quer nas crianças quer nos adultos teve um curso completamente independente da abertura das escolas”.

Ter crianças no agregado não aumentou probabilidade de infecção

Henrique de Barros apresentou ainda um estudo feito com base em dados individuais, no qual os especialistas avaliaram as pessoas que participaram na Coorte EpiPorto e separaram os agregados familiares com crianças de diferentes idades e sem crianças.

Os resultados mostraram que “ter crianças no agregado familiar não aumentou — até pelo contrário — a probabilidade, o risco nem a frequência de infecção” pelo novo coronavírus. O especialista salientou que, neste estudo, não foram analisadas apenas as pessoas que tiveram um diagnóstico por PCR, “mas sim as pessoas que tinham um marcador de contacto com o agente infeccioso”.

Os resultados são “parecidos” quando olhamos para o primeiro volume dos diários da pandemia, que estudou as pessoas na sua fase inicial da infecção, havendo “diferenças significativas, mas uma frequência muito baixa de estar infectado no participante que viva num agregado com ou sem crianças”. “Aqui consideramos apenas crianças até aos nove anos e esse valor também não variava significativamente com a idade da pessoa que respondia ao inquérito”, acrescentou.

Quanto ao segundo volume dos diários da pandemia, verificou-se que “também não há diferenças ao longo de todo o ano (…) e essa diferença também não existe quando comparamos agregados mais pequenos ou maiores”. “Nos agregados com quatro ou mais membros, a frequência da infecção é exactamente igual, quer haja ou não crianças no agregado”, notou.

Letalidade nos casos diagnosticados tem permanecido à volta de 2%

Antes, Henrique de Barros tinha abordado a questão do risco de morte, sublinhando que “as mortes foram a primeira grande preocupação e dirigiram muitas das estratégias de resposta, tendo tido a longo prazo um papel muito relevante”.

Porém, antecipou, “talvez no fim deste ano seja o tempo de pensar no peso particularmente relevante de outras consequências adversas da infecção, como a continuidade de sinais e sintomas além dos três meses após a resolução biológica aparente da infecção”.

Globalmente, e de acordo com os dados que a Direcção-Geral da Saúde proporcionou, “vemos que ao fim de 50 dias após a notificação praticamente estabiliza o prognóstico e globalmente cerca de 2% das pessoas estão a falecer por causa de terem tido um diagnóstico de infecção”, disse o especialista, destacando que a letalidade tem rondado este valor desde o início da pandemia.

Porém, este valor é significativamente diferente de acordo com o sexo, sendo que no masculino o risco de morrer é significativamente maior do que no feminino. Em termos globais, de acordo com os dados apresentados, a letalidade ronda os 1,95%, passando para 1,7% nas mulheres e 2,27% nos homens.

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Este risco também aumenta com a idade, variando de valores abaixo de 2% para valores acima de 20% na faixa etária dos 90 e mais anos e para valores acima dos 12% na faixa etária dos 80 aos 89 anos.

Mais tarde, em jeito de conclusão, Henrique de Barros sublinhou que a letalidade para os casos diagnosticados tem permanecido em 2%, “mas há variações importantes de acordo com as regiões, momentos da evolução da pandemia e idade a que convém estarmos atentos para sermos mais incisivos na forma de responder” à pandemia.

Além disso, disse, os especialistas acreditam que haja cerca de três vezes mais casos de infecção do que aqueles que são diagnosticados, pelo que a letalidade em Portugal — para a infecção — rondará os 0,7%.

Letalidade varia de acordo com as regiões e variantes do vírus

Há também uma “grande variação” da letalidade entre as regiões. “Quando temos em conta o sexo dos doentes, a idade e ajustamos para a naturalidade — como forma indirecta de percebermos a nacionalidade ou o estatuto de migração —, vemos que há uma grande diferença entre as regiões, e é particularmente notório este menor risco de morrer na Região Autónoma da Madeira comparando com as outras regiões do país. Mas se assumirmos a região norte como o risco de base para comparação, vemos que o Centro, Lisboa e Vale do Tejo, o Alentejo e o Algarve têm valores mais altos. Pelo contrário, a Madeira tem um valor muito baixo: a estimativa pontual é cerca de metade do risco de morrer comparado com o Norte do país”, disse Henrique de Barros.

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Um outro gráfico mostra que a maior probabilidade de morrer ocorreu nos meses iniciais da pandemia, tendo sido Março e Abril os meses em que a letalidade foi mais alta. Depois, a letalidade “rapidamente” começou a diminuir, “mas os meses de Dezembro e Janeiro têm valores mais altos do que os valores observados durante o período que mediou entre Maio e Novembro do ano passado”.

“Isto mostra-nos que — embora estes dados não estejam fechados — os períodos de grande afluência e grande carga sobre o Serviço Nacional de Saúde podem ter tido um efeito na maior probabilidade de se morrer”, concluiu o especialista.

Quanto às variantes do SARS-CoV-2, no total apresentam um risco aumentado de mortalidade de 2%, com este valor a subir para 4,1% no que diz respeito à variante do Reino Unido, para 5,6% na variante de Espanha, 5,3% na variante da Califórnia, 5,4% na variante B.1.160 (do Luxemburgo / Noruega) e para 15,4% na variante brasileira P.2.

Os dados reunidos até “pouco antes do final do mês de Fevereiro” mostram que, “comparando com a generalidade dos casos, todas estas variantes têm aparentemente um risco aumentado de mortalidade”.

Porém, como é possível observar pelos intervalos de confiança das estimativas após ajustar para a idade, sexo, naturalidade dos doentes e região do país, “na realidade a variante mais frequente, a espanhola, é a que tem a letalidade mais alta”. “Mas é possível que quer a variante inglesa quer a brasileira venham a subir e a ter uma relevância importante quando os números forem maiores e as estimativas mais estáveis, pelo que é necessária uma vigilância para o risco de infecção e uma atenção maior para o risco de morrer”, notou.

A reunião do Infarmed, que junta peritos e políticos na análise da situação epidemiológica do país, decorreu nesta terça-feira.