A Meatless Farm chegou a Portugal, mas não vai acabar com a carne. Quer é mais verde nos pratos
A empresa nasceu da vontade de “reduzir o consumo de carne a nível global” e criar produtos que se parecessem com ela, mas que não tivessem a mesma pegada ecológica. Hambúrgueres, almôndegas, panados e salsichas da marca já estão à venda em Portugal.
Quando Morten Toft Bech foi pai, tornou-se muito claro que “o mundo não dura apenas o teu tempo de vida, mas também o tempo de vida do teu filho, que, se tudo correr bem, serão 90 ou mais anos”. Depois, o tempo de vida dos netos, dos bisnetos, e por aí em diante. Percebeu que havia um problema na forma como estávamos a tratar o planeta e que isso podia comprometer o futuro das próximas gerações. Decidiu, por isso, criar uma empresa que tivesse como missão “reduzir o consumo de carne a nível global”.
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Quando Morten Toft Bech foi pai, tornou-se muito claro que “o mundo não dura apenas o teu tempo de vida, mas também o tempo de vida do teu filho, que, se tudo correr bem, serão 90 ou mais anos”. Depois, o tempo de vida dos netos, dos bisnetos, e por aí em diante. Percebeu que havia um problema na forma como estávamos a tratar o planeta e que isso podia comprometer o futuro das próximas gerações. Decidiu, por isso, criar uma empresa que tivesse como missão “reduzir o consumo de carne a nível global”.
“Parece bastante lógico agora, porque em 2021 a maioria das pessoas sabe que há uma correlação directa entre a produção de animais e o aumento do CO2. Mas há cinco anos isto não era assim tão sabido”, explica. Foi nessa altura, e da necessidade de mudar o panorama, que o empresário dinamarquês fez nascer a Meatless Farm, uma empresa que inicialmente produzia um produto que parecia carne picada, mas era produzido sem recurso a produtos de origem animal. Agora, a gama de produtos é muito mais vasta e já chegou a Portugal (já lá vamos).
Inicialmente, a produção dedicava-se a produtos à base de soja, mas rapidamente a Meatless Farm percebeu que tinha de se adaptar — afinal, “a monocultura da produção de soja” e uma dieta apenas à base dela não eram propriamente “saudáveis” — e passou a integrar outros ingredientes nos seus preparados, como as ervilhas, arroz e outras proteínas vegetais. É a mesma lógica que usamos quando fazemos uma salada: não colocamos apenas um tipo de vegetal, mas vários, porque todos eles têm valores nutricionais diferentes.
Tanto visualmente como no que toca à textura, os produtos da Meatless Farm são bastante semelhantes a carne, um objectivo traçado logo desde o início da criação da empresa. “Em 2016, hambúrgueres feitos de outra coisa que não fosse carne eram considerados algo chato. E tinham má reputação: os vegetarianos eram extremistas, e as pessoas comuns comiam carne”, contextualiza Morten. Por isso, era essencial que o aspecto do produto não afastasse pessoas que comem carne, mas, mais importante ainda, que fossem cozinhados da mesma forma. “Têm exactamente o mesmo modo de preparação, mas não há nenhum animal morto no processo, é melhor para o sistema digestivo e para o planeta.”
A ideia é mesmo fazer os produtos chegarem aos carnívoros (“Não posso ensinar nada a um vegetariano, eles já sabem o que é melhor para o corpo e para o planeta”) e convidá-los a inserir os produtos da Meatless Farm em algumas das suas receitas. Porque, considera, “não há nada de errado em comer carne”. O problema é que “uma embalagem de 400 gramas de um animal morto que viveu durante 28 meses até estar pronto para abate custe dois euros”, atira. E que a maioria das refeições seja feita à base de carne.
O próprio mercado já está a pedir este tipo de produtos, considera: “Acho que estamos a sair da pandemia com uma necessidade de comer melhor.” “E isso é algo que nós, enquanto indústria, temos de nos assegurar, que não produzimos apenas comida que parece carne, mas também que é melhor, mais saudável, mais limpa.” Por isso, diz-se “orgulhoso” que haja muitas pequenas empresas a enveredar pelo mesmo caminho que a Meatless Farm trilhou há cinco anos. “Significa que a indústria está a expandir e que a missão da Meatless Farm, de reduzir o consumo global de carne, está feita.”
Quanto à empresa de Morten, há passos que continuam a ser dados, num mercado que não pára de crescer. Recentemente, abriram uma nova fábrica em Calgary, no Canadá, deixando de ser dependentes no que toca à produção de TVP (Texturized Vegetable Protein ou Proteína Texturizada de Soja, em português).
O empresário quer ainda começar a investir na economia circular. Como? “Em Calgary, há uma grande indústria de CBD (canabidiol), que cria diferentes tipos de óleos de cannabis”, começa por explicar. O que sobra desse processo de produção é desperdício: “Não está a ser usado para nada e não tem ingredientes activos.” Ora, esse mesmo desperdício é “muito nutritivo” — e, salvaguarda, “obviamente não dá moca”. “O que estamos a pensar é usar esse desperdício para criar produtos que possam ser consumidos. E essa é a forma mais sustentável de comer.”
Depois de já estar presente em 24 países, a Meatless Farm chega agora a Portugal. Hambúrgueres, almôndegas, picado vegan, nuggets, panados e salsichas da marca podem ser encontrados na EasyGreen, na Green Beens e no Recheio MasterChef. A ideia é começar a introduzir os produtos nos supermercados, para posteriormente alargar a distribuição a cantinas e restaurantes.
Morten está confiante com o sucesso dos produtos em Portugal, ainda que, em 2019, segundo dados do INE, os portugueses tenham consumido cerca de 119 quilos de carne. Os pratos tradicionais, carregados tantas vezes de carnes e enchidos, também não intimidam o empresário: “Podem continuar a comê-los. É só uma questão de encontrar o equilíbrio.”
E, na verdade, segundo dados da Nielsen para o Centro Vegetariano, que a Meatless Farm partilhou com o P3, entre 2007 e 2017, o número de portugueses vegetarianos quadruplicou. O facto de Lisboa ter sido Capital Verde Europeia em 2020 também pesa. E os “flexitarianos” — pessoas que reduzem o consumo de carne sem se tornarem vegetarianas — também estão a crescer. Segundo estudos da consultora Lantern, em 2019 havia 620 mil pessoas a seguir esta dieta.
“Estou a ser realista. Não vamos mudar o mundo ao tornar-nos todos vegetarianos amanhã. Não vai acontecer. Por isso, temos que pensar num caminho possível”, afiança Morten. E o caminho pode começar aqui.