Testemunha de Tancos diz que Marcelo garantiu falar com PGR sobre a retirada da investigação à PJ Militar
O Presidente da República negou em diversas ocasiões ter conversado com Luís Vieira sobre entrega da investigação à Polícia Judiciária. Capitão Bengalinha foi ouvido como testemunha durante mais de seis horas no julgamento dos 23 arguidos que decorre em Santarém.
Uma testemunha ouvida nesta segunda-feira no julgamento de Tancos corrobora a versão várias vezes defendida pelo ex-director-geral da PJM, coronel Luís Vieira, e sempre desmentida pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, de que o chefe de Estado garantira numa reunião em Tancos poder interceder junto da ex-procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal.
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Uma testemunha ouvida nesta segunda-feira no julgamento de Tancos corrobora a versão várias vezes defendida pelo ex-director-geral da PJM, coronel Luís Vieira, e sempre desmentida pelo Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, de que o chefe de Estado garantira numa reunião em Tancos poder interceder junto da ex-procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal.
“O Presidente disse que falaria com a Procuradora-Geral da República e que o ministro iria falar com sua congénere da Justiça [Francisca Van Dunem]”, numa reunião em que o chefe de Estado mostrou interesse em conhecer aspectos relacionados com a investigação ao furto de Tancos, afirmou o capitão João Bengalinha, oficial investigador da Polícia Judiciária Militar (PJM), que está a ser ouvido segunda-feira como testemunha no processo de Tancos.
João Bengalinha, que foi o primeiro investigador do assalto a Tancos, também esteve nessa reunião, de 4 de Julho de 2016. A reunião foi diversas vezes mencionada no caso de Tancos pelo facto de o coronel Luís Vieira ter dito ao Presidente da República que não se conformava com a ordem dada pela então procuradora-geral da República, Joana Marques Vidal, de atribuir a responsabilidade da investigação – já então iniciada pela PJM – à Polícia Judiciária (PJ).
“O Presidente quis saber como estava a decorrer a investigação” e justificou as perguntas feitas ao coronel Luís Vieira dizendo que “gostava de estar a par das investigações”, afirmou o capitão Bengalinha, quando questionado pelo advogado Manuel Ferrador, que representa o coronel Luís Vieira, um dos principais arguidos de um conjunto de 23 militares e civis que estão a ser julgados pelo Tribunal Judicial de Santarém desde Novembro de 2020.
Na reunião com Marcelo Rebelo de Sousa e o ministro Azeredo Lopes, nas instalações de Tancos, realizada cinco dias depois do assalto, e em que estavam igualmente presentes o então chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas, general Pina Monteiro, e chefes militares dos vários ramos das Forças Armadas, o coronel Luís Vieira queixou-se igualmente de a PJ não ter comunicado à PJM o teor de uma denúncia recebida dois meses antes de que um assalto estaria a ser preparado.
“Nesse dia foi referido [pelo coronel Vieira] que a PJ já estava na posse de informação de que um assalto [a uma instalação militar] estaria a ser preparado”, afirmou João Bengalinha.
“O CEMGFA, general Artur Pina Monteiro, reagiu. Disse que se esta informação [transmitida por Luís Vieira] era fidedigna, isto era de uma enorme gravidade”, acrescentou João Bengalinha. “E transmitiu que as Forças Armadas dispunham de níveis de segurança que podem ser aumentados em situações de alerta e que era inadmissível isso [a comunicação da PJ à PJM] não ter acontecido”.
Esta informação já tinha sido referida pelo coronel Luís Vieira, ex-director-geral da PJM, em defesa própria num processo (que resulta do processo de Tancos) em que está a ser julgado por violação do segredo de justiça. Luís Vieira foi ouvido nesse julgamento a 10 de Março e descreveu esse interesse de Marcelo na investigação e a garantia que teria dado que iria falar com a procuradora-geral da República, como já antes fizera no âmbito do próprio processo de Tancos.
O Presidente da República negou em diversas ocasiões ter conversado com Luís Vieira sobre isso. A PJ defende-se dizendo que a informação foi transmitida informalmente a um elemento da PJM, e justifica não ter havido avanços na investigação (formalmente aberta com um inquérito da PJ em Abril de 2017, antes do assalto) por ter visto recusado pelo juiz de instrução criminal o seu pedido para a realização de escutas telefónicas.