Atingida meta de doentes nos cuidados intensivos. “Voltámos a respirar e a trabalhar normalmente”
De mais de 900 doentes em estado crítico nos cuidados intensivos no início de Fevereiro passámos para 182 esta quinta-feira. Os hospitais da região de Lisboa e Vale do Tejo têm mais de metade destes doentes.
O “tsunami” que José Paxiuta temia quando os primeiros casos graves de covid-19 começavam a chegar aos hospitais acabou por acontecer no início deste ano, submergindo os serviços e deixando os profissionais de saúde exaustos. Aos 36 anos, o médico especialista em cuidados intensivos na unidade de urgência médica do Hospital de São José (Lisboa) nunca imaginou a dura prova que ia ter que enfrentar na terceira vaga de covid-19 – que afectou com particular intensidade a região de Lisboa e Vale do Tejo (LVT). “Foi mesmo um tsunami. Em comparação, a primeira vaga não passou de uma ondinha”, descreve.
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O “tsunami” que José Paxiuta temia quando os primeiros casos graves de covid-19 começavam a chegar aos hospitais acabou por acontecer no início deste ano, submergindo os serviços e deixando os profissionais de saúde exaustos. Aos 36 anos, o médico especialista em cuidados intensivos na unidade de urgência médica do Hospital de São José (Lisboa) nunca imaginou a dura prova que ia ter que enfrentar na terceira vaga de covid-19 – que afectou com particular intensidade a região de Lisboa e Vale do Tejo (LVT). “Foi mesmo um tsunami. Em comparação, a primeira vaga não passou de uma ondinha”, descreve.
Depois de semanas extremamente duras em Janeiro e Fevereiro, em que foi necessário ocupar outras áreas e arregimentar colegas de outras especialidades hospitalares, os internamentos nestas unidades de elevada complexidade foram caindo e a sensação agora é de alívio. “Voltámos a respirar e a trabalhar normalmente”, suspira.
Chegar às duas centenas de doentes com covid-19 internados em unidades de cuidados intensivos (UCI) era uma das metas traçadas pelo Presidente da República para o início do desconfinamento e foi atingida esta semana, antes ainda das previsões da maior parte dos epidemiologistas. Segundo os últimos dados divulgados pela Direcção-Geral da Saúde (DGS), esta quinta-feira havia 182 doentes com covid-19 em estado crítico internados em UCI, depois de, em 5 de Fevereiro, se ter atingido um pico (904).
É necessário recuar até Outubro passado para se chegar a um número mais baixo. Apesar da descompressão, a região de Lisboa e Vale do Tejo continua a ser a mais afectada, com mais de metade do total (95 doentes). Nos hospitais do Norte eram 48.
"Cheios de doentes"
Quem quase acertou nas previsões foi o presidente do colégio da especialidade de medicina intensiva da Ordem dos Médicos, José Artur Paiva, que antevia que seria possível chegar às duas centenas de doentes com covid-19 nas UCI entre 20 e 22 deste mês. Mas o director do serviço de medicina intensiva do hospital de São João (Porto) defende que este número é “um bocado irrelevante”. “Só é importante porque sabemos que, fatalmente, mesmo nos momentos de maior confinamento, temos 450 a 500 camas ocupadas por doentes não covid.”
Nesta terceira vaga, os hospitais foram alargando a resposta até a um ponto quase inimaginável. O São João chegou a ter 116 camas de cuidados intensivos, mais de metade das quais (60) para doentes com covid-19, duas enfermarias normais, a de cirurgia geral e a da cirurgia vascular, foram transformadas em UCI, recorda José Artur Paiva. Actualmente tem 72, com 16 dedicadas a doentes com covid.
Agora, sublinha o médico, os critérios determinantes para “regular os degraus” do desconfinamento têm que assentar em vários eixos. Desde logo, é preciso olhar para o número de novos casos, o Rt (índice de transmissibilidade) e a taxa de positividade dos testes. A “robustez” da resposta de saúde pública é outro eixo, que passa pela rapidez dos inquéritos epidemiológicos, do processo vacinal e da identificação das variantes.
Também é fundamental assegurar a capacidade da resposta hospitalar, sendo o indicador mais importante o número de internados em medicina intensiva. “Não podemos esquecer os doentes não covid”, alerta. É certo que a situação melhorou com uma rapidez assinalável, mas “os cuidados intensivos estão cheios de doentes”. Por um lado, porque os hospitais estão “em aceleração da recuperação de toda a patologia não covid e há muitas cirurgias complicadas que precisam de cuidados intensivos em pós-operatório”. Por outro, as necessidades aumentam também porque o desconfinamento leva a mais acidentes de trabalho e a mais acidentes de viação, logo a maior necessidade de medicina intensiva.
As camas “sustentáveis” (sem prejudicar as outras actividades) em UCI são 888 e devem funcionar com taxas de ocupação à volta de 85%, diz ainda. Com a pandemia, o investimento em medicina intensiva disparou e hoje Portugal está bem mais perto da média europeia. “Partimos de 6.3 camas por 100 mil habitantes e hoje temos 8.9 camas em medicina intensiva sustentáveis, que estão abertas e vão perdurar sem incomodar outras especialidades, mas ainda não estamos na média europeia, que ronda as 10”, contabiliza o especialista. No capítulo dos recursos humanos, porém, “a décalage é maior”. Continuam a faltar médicos e sobretudo enfermeiros.