“Paidestro”, o braço direito da mãe e dos filhos
Escrevi pela primeira vez a palavra padrasto e soou-me francamente mal. Tenho de arranjar outra palavra para essa função, “paidestro”, por exemplo, assim parece alguém que pode ser o braço direito da mãe e dos filhos.
Contei ao meu companheiro que tenho medo de não ser boa mãe. Tenho medo de não estar suficientemente disponível e atenta, de ter falta de paciência, de ser bruta e de responder torto. Nunca se deve ser bruto com ninguém em circunstância alguma, muito menos com um filho.
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Contei ao meu companheiro que tenho medo de não ser boa mãe. Tenho medo de não estar suficientemente disponível e atenta, de ter falta de paciência, de ser bruta e de responder torto. Nunca se deve ser bruto com ninguém em circunstância alguma, muito menos com um filho.
O meu companheiro riu-se e não deu importância, “claro que és boa mãe”, mas o filho não é dele, ainda não temos filhos em comum, e talvez ele não entenda a angústia que carrega um progenitor ao sentir que pode estar a falhar naquela que é a coisa mais importante da sua vida: a educação de um filho.
O menino só começa agora a ser um bocadinho o filho dele, mas ainda não o é. A nova dinâmica da casa não é fácil para todos. Desde que o meu namorado se mudou para cá, o menino começou a fazer birras como fazia aos três anos, e está quase no 3.º ano da escola; é muito desconcertante assistir ao seu choro e gritaria sem motivo. É agressivo comigo, chama-me “má” sempre que é contrariado e deu-me um pontapé na canela com tanta energia que tive de ir buscar forças não sei onde para não lhe dar uma palmada de volta. Sou contra a violência, acho que não é solução para nada. Mas foi difícil controlar o ímpeto desse gesto. Consegui respirar fundo, deixá-lo berrar algum tempo e depois ter uma conversa muito séria entre mãe e filho.
No seu quartinho e ao meu colo confessou, numa torrente de choro e ranho, que prefere estar sozinho comigo, que quer a minha atenção, que o meu namorado não faz parte da família porque não somos casados. Expliquei-lhe que não é o casamento que faz uma família, que o mais importante é sermos todos amigos e gostarmos muito uns dos outros. Não ficou convencido e eu fiquei a cismar. Não no casamento, mas no facto do menino não querer alguém perto de mim, expressando a sua rejeição através do antiquíssimo formato edipiano.
À mesa tem de se sentar sempre entre nós os dois, no sofá a mesma coisa, e fica claramente tenso quando assiste a um gesto de afeição do meu namorado em relação a mim. Disse ao padrasto com todas as letras que “a mãe é minha”, e tivemos de lhe explicar que gostamos muito uns dos outros, de formas diferentes, e que ninguém tira lugar a ninguém. Escrevi pela primeira vez a palavra padrasto e soou-me francamente mal. Talvez porque no dicionário um dos significados atribuídos é “um pai que não cuida bem dos filhos”.
Tenho de arranjar outra palavra para essa função, “paidestro”, por exemplo, assim parece alguém que pode ser o braço direito da mãe e dos filhos. Felizmente, os miúdos são incompreensíveis e temperamentais; se por um lado não quer o “paidestro” cá em casa, por outro, quando ele não está aqui connosco, diz que tem saudades dele. Não se entende. Talvez precise de tempo para se adaptar.
Todos estamos a precisar que passe tempo para crescermos juntos, mesmo com os inevitáveis solavancos e turras. Talvez seja esse tempo de convívio que faz de uma segunda união onde há filhos uma família, mesmo sem haver casamento. Embora não tenha nada contra matrimónios, como tinha há uns anos. Mudei de ideias sobre esse assunto, acho bonito o ritual e o compromisso público. E até gostava de usar um vestido comprido e caríssimo, de ser uma grande pirosa nesse dia e de o partilhar com quem mais amo. Se isso fizer o meu filho e a nossa família mais felizes, não vejo motivos para não o fazer.