Fornecedores de marcas de roupa acusados de penalizar quem protesta contra os militares na Birmânia
Empresa contratada pela Primark acusada de fechar trabalhadores em fábrica de roupa para que não se manifestassem, e de depois despedir quem foi protestar.
Uma fábrica que fornece roupa para marcas ocidentais como a britânica Primark fechou cerca de mil trabalhadores nas suas instalações para impedir que fossem participar em protestos contra a junta militar na maior cidade da Birmânia, Rangum, segundo testemunhos recolhidos pelo diário britânico The Guardian.
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Uma fábrica que fornece roupa para marcas ocidentais como a britânica Primark fechou cerca de mil trabalhadores nas suas instalações para impedir que fossem participar em protestos contra a junta militar na maior cidade da Birmânia, Rangum, segundo testemunhos recolhidos pelo diário britânico The Guardian.
Trabalhadores da fábrica GY Sen dizem que os seus supervisores quiseram impedir que faltassem ao trabalho para se irem manifestar no dia 18 de Fevereiro. Depois de várias horas fechados, os cerca de mil empregados conseguiram sair do local.
Os trabalhadores denunciam ainda que cerca de 20 foram depois despedidos por terem falhado turnos para participar no movimento de desobediência civil, em que muitas pessoas em vários sectores do país se têm vindo a recusar a trabalhar.
Um porta-voz da GY Sen negou as alegações. A Primark disse apenas estar a levar a cabo uma investigação à fábrica, que foi iniciada a 5 de Março, depois de um sindicato local ter expressado preocupações, mas não deu detalhes sobre que tipo de preocupações. E acrescentou que não iria fazer encomendas ao fornecedor antes da conclusão da investigação.
Trabalhadores da indústria do vestuário, na maioria mulheres jovens, têm estado na frente de manifestações de oposição aos militares, e têm seguido em frente com os protestos apesar de estes estarem a ser reprimidos por uma campanha de terror intimidação, diz ainda o Guardian.
Andrew Tillett-Saks, organizador sindical que trabalha com sindicatos na Birmânia, diz que o facto de os trabalhadores e trabalhadoras da industria do vestuário terem recentemente criado sindicatos para lutarem por melhores condições de emprego fez com que conseguissem responder com mais rapidez e organização quando a junta militar afastou o governo eleito em Novembro e deteve a líder de facto do país, Aung San Suu Kyi, no final de Janeiro.
Mas muitos já foram obrigados a sair de casa porque não receberam salários em Fevereiro e não conseguem pagar a renda.
Apesar disso, não consideram desistir de lutar contra a ditadura militar: “sob este regime, temos de temer tudo”.
O sector do vestuário empregava cerca de 700 mil pessoas antes da pandemia, e representava 30% das exportações do país. Durante o último ano, no entanto, mais de 10 mil trabalhadores birmaneses foram despedidos abruptamente durante a pandemia.
Empresas de vestuário, já normalmente questionadas sobre as condições de trabalho em países como a Birmânia, estão agora indecisas sobre como lidar com o cenário pós-golpe. A Federação dos Trabalhadores Industriais da Birmânia apelou às marcas que condenem o golpe e que se assegurem de que ninguém é castigado por fazer greve.
Enquanto isso, continuavam a morrer pessoas nos protestos: pelo menos mais seis foram mortos este sábado, segundo a agência Reuters. Dois num protesto em Mandalay, a segunda cidade, outra em Pyay, no centro do país, e duas ainda em Rangum, atingidas a tiro pela polícia.
Um dos manifestantes na cidade de Pyay diz que as forças de segurança impediram a passagem de uma ambulância que ia prestar assistência aos feridos, e que um dos feridos graves acabou por ficar em estado crítico na sequência do atraso. Mais tarde, morreu.
Os protestos assinalavam também a morte de Phone Maw, um estudante que foi morto pelas forças de segurança num campus universitário em 1988 e que levou a enormes protestos nesse ano – que foram esmagados pela junta militar, tendo morrido cerca de 3 mil pessoas na repressão.
Foi nessa altura que Suu Kyi surgiu como uma figura de luta contra a ditadura, acabando por passar grandes parte de duas décadas em prisão domiciliária. Em 2008 foi libertada no início de lentas reformas levadas a cabo pelos militares, e o seu partido venceu as eleições tanto em 2015 como em 2020.
Mas os militares resolveram parar o processo de democratização, e invocando irregularidades na eleição de Novembro, tomaram, de novo, o poder.