PÚBLICO abre portas à discussão sobre os cânones da crítica literária
Terceiro curso da iniciativa Academia Público destina-se a todos os interessados em literatura portuguesa, para debates sem amarras ou ideias feitas
Por que razão se gera tanto consenso à volta de determinados escritores, ou de uma obra? Que “direito” lhes foi atribuído para entrarem na galeria dos imortais, dos clássicos incontornáveis? Nomes como Eça de Queiroz, Fernando Pessoa ou Luís Vaz de Camões figuram nesta espécie de panteão da literatura portuguesa. Mas, porque não discutir os seus livros e abrir a discussão para lá dos muros da apreciação intelectual? É precisamente para alargar o campo do debate a todos quantos se interessam, ou querem saber mais, sobre o património literário português, que a Academia Público acaba de lançar o curso de crítica literária “O Cânone: dez lições de literatura portuguesa” (as inscrições já estão abertas na página do curso). A terceira iniciativa da Academia é totalmente online, com dez sessões entre os dias 25 de Março e 27 de Maio, e resulta de uma parceria com a editora Tinta da China e a Fundação Cupertino de Miranda.
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Por que razão se gera tanto consenso à volta de determinados escritores, ou de uma obra? Que “direito” lhes foi atribuído para entrarem na galeria dos imortais, dos clássicos incontornáveis? Nomes como Eça de Queiroz, Fernando Pessoa ou Luís Vaz de Camões figuram nesta espécie de panteão da literatura portuguesa. Mas, porque não discutir os seus livros e abrir a discussão para lá dos muros da apreciação intelectual? É precisamente para alargar o campo do debate a todos quantos se interessam, ou querem saber mais, sobre o património literário português, que a Academia Público acaba de lançar o curso de crítica literária “O Cânone: dez lições de literatura portuguesa” (as inscrições já estão abertas na página do curso). A terceira iniciativa da Academia é totalmente online, com dez sessões entre os dias 25 de Março e 27 de Maio, e resulta de uma parceria com a editora Tinta da China e a Fundação Cupertino de Miranda.
O ponto de partida deste curso de crítica literária é o livro O Cânone, um conjunto de ensaios coordenado por António M. Feijó, João R. Figueiredo e Miguel Tamen. Cada sessão decorre entre as 18h30 e as 20h00, às quintas-feiras, e tem uma estrutura simples: apresentação do tema pelo docente convidado, seguindo-se um debate aberto a todos os participantes. As aulas são todas gravadas para consulta. Os inscritos recebem gratuitamente o livro O Cânone, uma visita guiada à Torre Literária, em Famalicão, um almoço no final e certificado de participação emitido da Fundação Cupertino de Miranda.
“A ideia é que as pessoas que colaboraram no livro possam debater com um público não especializado”, explica Miguel Tamen, que diz haver autores “incontroversos”, mas também outros “menos consensuais”, como Florbela Espanca, ou as Três Marias (Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta, Maria Velho da Costa). Padre António Vieira, Vitorino Nemésio, Camilo Castelo Branco e Cesário Verde completam o lote de autores a analisar (mais os três mencionados no início do texto). A primeira sessão é dedicada ao livro O Cânone.
As dez sessões serão leccionadas por um corpo docente de indiscutível mérito, cujo objectivo é proporcionar a todos os alunos várias abordagens ao mesmo tema. “Não nos interessa nada mitificar ou desmistificar este ou aquele escritor. O que nos interessa é questionar. Por exemplo: não há assim tanta crítica literária em torno da obra de Eça de Queiroz, em proporção com a quantidade de pessoas que apreciam a sua obra”, diz Miguel Tamen.
Livros com sentimentos dentro
“O Cânone: dez lições de literatura portuguesa” assume, pois, a condição de espaço livre de debate, um apontar de caminhos para melhor entender alguns dos melhores escritores portugueses de sempre e pensar a literatura.
Mas, porque são considerados clássicos, ou obras-primas? “Porque, de alguma forma, moldaram a nossa forma de olhar o mundo, de nos entendermos melhor a nós próprios e aos outros. Neste caso, dou o exemplo dos romances. Quanto à lírica de Camões, qual é a sua importância? Dotou a língua portuguesa de uma nova abordagem, com temas até então pouco ou nada presentes na literatura portuguesa”, responde João R. Figueiredo, autor de várias obras sobre Camões e professor na Universidade de Lisboa.
“Há autores que descrevem sentimentos. E se, por exemplo, um autor escreveu determinado livro há 200 anos e descreve os sentimentos de hoje de forma tão actual, se calhar, vale a pena ler... Com este curso pretende-se proporcionar um conhecimento mais aprofundado dos autores, um ponto de partida para se começar a ler as suas obras com um outro olhar”, acrescenta.
João R. Figueiredo realça não haver “nenhum ânimo iconoclasta em relação a qualquer escritor. Algumas ideias sobreviveram aos tempos pelas melhores razões, outras pelas piores, que adquiriram um estatuto que não se percebe muito bem.” “O que faremos nas aulas será ler textos com os alunos e analisá-los. Por que razão aquela palavra está ali e não outra, o porquê da repetição de palavras... e veremos que os textos são muito mais ricos do que a sua redução a simples lugares-comuns.”
Saber o que é a literatura
António M. Feijó aponta outro dos caminhos que se pretende trilhar ao longo do curso, como seja perceber o porquê de um autor/obra ter um determinado estatuto numa época concreta. “Guerra Junqueiro foi considerado um dos maiores poetas do início do século XX, até mesmo por Fernando Pessoa, mas hoje é pouco falado. O ponto interessante é saber porque é que uns permanecem e outros desaparecem. A contemporaneidade é aleatória? Que tipo de circunstâncias influem? Qual a relação entre a circunstância e a obra? Uma coisa é o valor intrínseco da obra, outra é perceber o que é a literatura, como analisar a obra”, explica.
Que frutos se quer colher no final das dez sessões? “Frutos? Nada, a não ser um melhor conhecimento da literatura portuguesa, os efeitos práticos na vida das pessoas da crítica literária”, sintetiza João R. Figueiredo. Miguel Tamen dar-se-á por “muito satisfeito se, no final, houver um grupo de pessoas que mudem de opinião acerca dos autores, que tenham uma visão nova sobre eles”.