Controlo das armas nos EUA recebe novo impulso na Câmara dos Representantes
Câmara baixa do Congresso norte-americano aprovou duas leis que reforçam a verificação dos antecedentes dos compradores de armas, mas a curta maioria do Partido Democrata no Senado pode ser insuficiente para que cheguem à secretária do Presidente Biden.
A Câmara dos Representantes dos EUA aprovou, esta quinta-feira, duas propostas de lei que apertam o controlo sobre a compra e venda de armas no país, ao estenderem a verificação de antecedentes criminais dos compradores a quase todos os tipos de transacções. Mas a iniciativa tem um caminho difícil no Senado, onde a curta maioria do Partido Democrata não garante vitórias sem o apoio de pelo menos uma dezena de republicanos.
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A Câmara dos Representantes dos EUA aprovou, esta quinta-feira, duas propostas de lei que apertam o controlo sobre a compra e venda de armas no país, ao estenderem a verificação de antecedentes criminais dos compradores a quase todos os tipos de transacções. Mas a iniciativa tem um caminho difícil no Senado, onde a curta maioria do Partido Democrata não garante vitórias sem o apoio de pelo menos uma dezena de republicanos.
A primeira proposta foi apresentada por um grupo de congressistas de ambos os partidos e teve, como se esperava, o apoio mais alargado das duas votações.
Com 227 votos a favor e 203 contra – incluindo oito republicanos –, a câmara baixa do Congresso norte-americano aprovou uma lei que obriga os vendedores de armas em exposições e através da Internet a pedirem ao FBI uma verificação dos antecedentes dos compradores.
A mesma lei proíbe a doação de armas entre familiares e amigos, ou em qualquer outra transacção privada, sem que antes os beneficiários sejam alvo de uma verificação de antecedentes a pedido de um vendedor autorizado. Uma das poucas excepções é “a oferta de armas, em boa-fé, entre cônjuges”.
De acordo com a lei em vigor, só as transacções feitas por vendedores de armas licenciados pelo governo federal são obrigados a pedir uma verificação de antecedentes dos compradores ao FBI.
As propostas aprovadas esta quinta-feira têm como objectivo tapar os buracos que são explorados em muitos estados onde os governos e os congressos locais não tomaram essa iniciativa. Se entrarem em vigor, as leis aprovadas esta quinta-feira terão de ser cumpridas por todos os estados norte-americanos.
Compra mais demorada
A segunda lei do dia foi aprovada com uma votação mais em linha com o equilíbrio de forças na Câmara dos Representantes, onde o Partido Democrata tem 220 congressistas e o Partido Republicano tem 211 (quatro lugares ainda não foram atribuídos).
Numa iniciativa do congressista democrata James Clyburn, da Carolina do Sul – onde o supremacista branco Dylan Roof matou nove pessoas numa igreja, em 2015 –, a proposta alarga de três para dez dias o período de espera pela resposta da verificação feita pelo FBI.
De acordo com a lei em vigor, um vendedor que esteja obrigado a pedir uma verificação de antecedentes pode seguir em frente com a transacção se o seu pedido não for satisfeito em três dias.
Foi isso que aconteceu no caso de Dylan Roof, que comprou a arma com que matou as suas vítimas porque o vendedor não recebeu uma resposta do FBI dentro do prazo legal. Se isso tivesse acontecido, o vendedor não poderia vender a arma porque Dylan Roof tinha uma condenação por posse de droga.
Na votação final, a proposta do congressista James Clyburn foi aprovada com 219 votos a favor e 210 contra, com dois democratas e dois republicanos a votarem contra a maioria dos seus partidos.
As duas leis aprovadas esta quinta-feira já tinham sido aprovadas na sessão legislativa anterior, em 2019, assim que o Partido Democrata conquistou a maioria nas eleições de Novembro de 2018. Mas, nessa altura, a maioria do Partido Republicano no Senado condenava ao fracasso qualquer proposta aprovada na câmara baixa sem o apoio dos seus congressistas.
Depois da aprovação na Câmara dos Representantes, as propostas de lei têm de ser também aprovadas no Senado para chegarem à secretária do Presidente dos EUA e serem promulgadas.
Pouca margem no Senado
Em termos práticos, a maioria conquistada pelo Partido Democrata no Senado – confirmada com as duas vitórias nas duas segundas voltas no estado da Georgia, a 5 de Janeiro – não aumenta de forma significativa as hipóteses de aprovação das leis que têm uma forte oposição da minoria republicana.
No Senado, onde democratas e republicanos têm 50 senadores cada – e onde uma vitória democrata em caso de empate depende do voto da vice-presidente dos EUA, Kamala Harris, que é a presidente do Senado por inerência –, a maioria das leis só é aprovada com um mínimo de 60 votos.
Isto porque qualquer senador pode invocar a figura do filibuster – um procedimento que, na prática, prolonga por tempo indefinido o período de debate e dificulta a chegada ao momento da votação final. Para quebrar esse “feitiço”, o Partido Democrata tem de convencer pelo menos dez senadores republicanos a levarem as propostas a votação – e só depois disso volta a funcionar a maioria simples de 51 senadores.
O futuro das duas leis aprovadas esta quinta-feira é, assim, tão complicado como foi o das várias propostas discutidas na última década, sem sucesso, por iniciativa do Partido Democrata – principalmente depois de um atirador ter matado 20 crianças na Escola Primária de Sandy Hook, em Dezembro de 2012.
Seis dos dez tiroteios com mais vítimas em escolas, cinemas e outros espaços públicos nos EUA aconteceram entre 2012 e 2019, num total de 199 mortos.
A última lei com impacto significativo no debate sobre as armas nos EUA foi aprovada em 1994, na Administração de Bill Clinton, com uma proibição do fabrico e da venda de vários modelos de armas semiautomáticas por dez anos. A lei expirou em 2004 e desde então não houve apoio suficiente no Congresso para a sua renovação.