Estratégia de testes rápidos deixa de fora mais de 84 mil alunos e 11 mil professores
Governo prevê gastar até 20 milhões de euros em testes rápidos, mas só inclui escolas públicas e creches das IPSS. O sector privado não foi contemplado. Por isso, professores e funcionários dos colégios ficam de fora. Ao contrário do que se passa no ensino público, onde é suposto a testagem abranger também os estudantes do secundário, tal não acontecerá no privado. Associação que representa o sector avisa que não se conformará com uma “discriminação inaceitável”.
Pelo menos perto de cem mil alunos e professores do ensino privado não vão ter direito a realizar testes rápidos de antigénio quando forem retomadas as aulas presenciais. Os quase 20 milhões de euros que o Governo destinou à operação abrangem apenas os estabelecimentos de ensino público e das Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS).
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Pelo menos perto de cem mil alunos e professores do ensino privado não vão ter direito a realizar testes rápidos de antigénio quando forem retomadas as aulas presenciais. Os quase 20 milhões de euros que o Governo destinou à operação abrangem apenas os estabelecimentos de ensino público e das Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS).
Os colégios são frequentados por 84.683 estudantes no ensino secundário — o único nível de ensino cujos alunos a estratégia da Direcção-Geral da Saúde prevê incluir na testagem maciça—, de acordo com os números mais recentes publicados pela Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência, que dizem respeito ao ano lectivo 2018/19.
No caso dos professores, de acordo com a dita estratégia nacional, serão testados todos, independentemente do nível de ensino. Segundo os dados oficiais, há 11.266 professores a dar aulas no sector particular e cooperativo, contabilizando todo o ensino básico e o secundário. E são esses que ficarão de fora da testagem. Estes dados dizem respeito apenas ao território continental, excluindo as regiões dos Açores e da Madeira, que têm autonomia na gestão do sistema de ensino.
Ou seja, são cerca de 96 mil os alunos e docentes que não estão incluídas no plano de realização de testes rápidos de antigénio. A estes alunos e professores juntam-se também cerca de 20 mil funcionários não docentes que trabalham nos colégios privados, segundo o relatório Estado da Educação 2019, publicado recentemente pelo Conselho Nacional de Educação.
O número total de pessoas no sector da educação sem direito a teste rápido pode ser ainda mais elevado. As contas feitas pelo PÚBLICO, com base nas estatísticas oficiais, excluem a educação pré-escolar, onde há 6700 educadores em estabelecimentos privados. No entanto, como os critérios definidos pelo Governo podem abranger pelo menos uma parte destes docentes, optou-se por excluí-los do somatório inicial.
O Conselho de Ministros deste domingo aprovou a despesa para a aquisição de serviços de realização de testes rápidos de antigénio no ensino. O investimento, que será feito pela Direcção-Geral dos Estabelecimentos Escolares (Dgeste) e pelo Instituto da Segurança Social (ISS), pode chegar a quase 20 milhões de euros. Segundo o comunicado emitido pelo Governo, esta verba abrange os testes a realizar em “estabelecimentos de educação e ensino públicos”, do pré-escolar ao ensino secundário, bem como as “respostas sociais de apoio à infância do sector social e solidário”, ou seja, as creches que são geridas por IPSS ou outras instituições particulares.
Colégios inconformados
A Associação de Estabelecimentos de Ensino Particular e Cooperativo (Aeep) já pediu uma clarificação do Governo, avisando que não se conformará com uma “discriminação inaceitável”. “A saúde das crianças e jovens que frequentam o ensino privado não tem o mesmo valor e dignidade que a dos que frequentam o ensino estatal?”, questiona a associação em comunicado.
Ao PÚBLICO, o director executivo da Aeep, Rodrigo Queiroz e Melo, sublinha que esta “não é uma questão educativa, mas de saúde pública”. Argumento semelhante é usado pelas bancadas parlamentares do PSD e do CDS, que nesta segunda-feira questionaram o Governo sobre esta decisão. “A exclusão das crianças e jovens que frequentam o ensino não público não só violaria flagrantemente o princípio constitucional da igualdade, como comprometeria a própria defesa da saúde pública”, defendem os sociais-democratas, num requerimento. “Esta matéria não é de política educativa, e não deve reflectir as habituais — e erradas — escolhas de base ideológica do Ministério da Educação”, argumenta, por seu turno, o CDS.
A Direcção-Geral da Saúde, a Dgeste e o ISS, enviaram às escolas e creches as orientações para o Programa de Rastreios Laboratoriais para SARS-CoV-2 nas Creches e Estabelecimentos de Educação e Ensino. Este plano operacionaliza as novas regras da estratégia nacional de testes para o novo coronavírus, que foi alterada no final de Fevereiro. A estratégia determina que todos os professores e funcionários dos vários níveis de ensino sejam sujeitos a testes rápidos no retomar do ensino presencial. Mas apenas serão testados os alunos do ensino secundário (10.º, 11.º e 12.º anos), ficando de fora do programa os mais novos, das creches ao 3.º ciclo do ensino básico. “Apesar de a transmissibilidade e dinâmica da infecção por SARS-CoV-2 ainda não ser totalmente conhecida nas crianças, alguns estudos têm sugerido uma menor transmissibilidade em idades mais baixas, pelo que a utilização de testes laboratoriais em programas de rastreio deve ser priorizada para os alunos mais velhos”, justifica-se na orientação conjunta.
Quando as actividades escolares presenciais recomeçarem, os professores e funcionários das escolas que estiveram infectados com o novo coronavírus nos últimos 90 dias não farão testes rápidos, mas os que já foram vacinados sim, por uma questão de “precaução”, prevê também o programa.
Também estão previstos rastreios periódicos nos concelhos com maior incidência de covid-19 (superior a 120 novos casos por cem mil habitantes no valor acumulado a 14 dias). Os professores, funcionários e alunos do ensino secundário farão um primeiro teste rápido de antigénio que será repetido 14 dias depois e, posteriormente, de 28 em 28 dias. Esta periodicidade será ajustada para um intervalo de sete a sete dias ou 14 a 14 dias em função do número de casos identificados nos testes. Com Alexandra Campos e Sofia Rodrigues