100 anos — Do tempo sem tempo a Abril e aos dias de hoje
Esta luta tão generosa nem sempre teve na devida conta as concretas circunstâncias e a importância de uma política de alianças mais estratégica.
Os cem anos do PCP são muitos anos; um percurso extraordinário que logrou atravessar o século XX. No meio da noite mais negra resistiu à ditadura, espalhando as sementes da liberdade e o projeto de uma sociedade democrática tendo como horizonte o socialismo.
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Os cem anos do PCP são muitos anos; um percurso extraordinário que logrou atravessar o século XX. No meio da noite mais negra resistiu à ditadura, espalhando as sementes da liberdade e o projeto de uma sociedade democrática tendo como horizonte o socialismo.
Defendeu corajosamente o fim do colonialismo, da guerra colonial e pugnou pelo reconhecimento do direito à independência dos povos submetidos ao domínio português.
O PCP enfrentou a ditadura de Salazar/Caetano organizando um caudal de lutas (desde as mais modestas até às mais grandiosas) criando raízes profundas no país e ganhando influência e prestígio que na madrugada de 25 de Abril deram um forte impulso para que o povo português apoiasse o movimento militar e contribuísse para impedir que as forças da repressão agissem em defesa do regime derrubado.
Na revolução lutou para dar à democracia uma dimensão social e cultural para que a liberdade fosse acompanhada de conquistas sociais.
Esta luta tão generosa nem sempre teve na devida conta as concretas circunstâncias e a importância de uma política de alianças mais estratégica.
Independentemente do papel que PS teve ao longo do processo democrático/revolucionário, este partido é fundamental para uma política que corte com a direita, mesmo vacilando face ao grande patronato e aos mandarins de Bruxelas. Os acordos à esquerda assinados na ocasião do primeiro governo do PS liderado por António Costa provaram a importância de uma nova política.
Sem alianças políticas entre as forças de esquerda e o PS não é possível impedir a direita de governar nos ventos do neoliberalismo, tornando Portugal um país em que o Estado estará ao serviço da concentração da riqueza com a privatização dos serviços públicos mais rentáveis, tornando os multibilionários mais ricos, aumentando a precariedade, diminuindo os salários, subvertendo as leis laborais, em que os remediados empobrecerão e os pobres ficarão mais pobres. Como se o país fosse uma sociedade anónima.
Um partido com o passado do PCP de luta pela liberdade e pela democracia assumiu posições deploráveis em relação à URSS e ao campo socialista. O socialismo não pode ser um sistema com menos democracia que o capitalismo.
A ditadura do proletariado da URSS serviu para justificar a repressão sobre a oposição ao regime e inclusive a perseguição brutal aos próprios comunistas.
Um partido com este passado não pode ficar refém de um modelo que implodiu sem ninguém o defender. Esta posição do PCP impede a compreensão de milhares e milhares de portugueses e a aproximação e adesão ao partido.
Noutro plano, o PCP entregou o partido aos fiéis à direção, afastando deliberadamente ou pelo estilo de trabalho quem manifesta dúvidas quanto às orientações, deixando-o mais desligado da sociedade. Até nas publicações “oficiais” dos cem anos apagou dirigentes, como se não tivessem sido quem foram.
Os tempos são difíceis não só para o PCP, mas para todos os partidos comunistas que, aliás, como outros partidos de esquerda, recuam em vários pontos do mundo seja os que enveredaram por outra identidade e os que se fecharam no dogmatismo.
O futuro exige muita capacidade para dar atenção a tudo quanto é novo, sobretudo dos anseios juvenis que foram o baluarte do PCP nos anos 70 e 80. O discurso verbalista, oco, cheio de lugares-comuns, repetitivo e fugindo ao concreto não atrai. Reconfigurar o ideal, tendo em conta os novos tempos é crucial. Haja a coragem que noutras ocasiões houve.