Quem regressa do Brasil “em voo humanitário” sem bilhete da TAP paga mais de 800 euros

O voo operado pela TAP para transportar brasileiros retidos em Portugal ou portugueses no Brasil com necessidade imediata de viajar é apenas para quem comprou bilhete na companhia portuguesa, ou compra agora por mais de 800 euros. Em 520 pessoas, com urgência em regressar para um e outro país, apenas 200 têm bilhetes da TAP.

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Paulo Pimenta

Para responder aos problemas causados pela suspensão dos voos entre Portugal e o Brasil, o Ministério dos Negócios Estrangeiros anunciou para o próximo sábado – 27 de Fevereiro – um “voo de apoio ao regresso do Brasil por razões humanitárias”. O gabinete do ministro Augusto Santos Silva acrescentou que este voo seria “operado pela TAP”. Seriam incluídos os portugueses e os estrangeiros residentes em Portugal retidos no Brasil e com necessidade imediata de regressar a Portugal.

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Para responder aos problemas causados pela suspensão dos voos entre Portugal e o Brasil, o Ministério dos Negócios Estrangeiros anunciou para o próximo sábado – 27 de Fevereiro – um “voo de apoio ao regresso do Brasil por razões humanitárias”. O gabinete do ministro Augusto Santos Silva acrescentou que este voo seria “operado pela TAP”. Seriam incluídos os portugueses e os estrangeiros residentes em Portugal retidos no Brasil e com necessidade imediata de regressar a Portugal.

Nesse voo que o Governo designa por “voo humanitário” – entende-se aqui critérios definidos pelas circunstâncias pessoais, de saúde ou de subsistência de cada passageiro – ​ficam excluídos os passageiros com bilhetes comprados nas operadoras brasileiras Azul e Latam. Entre estes, e para os que precisem de viajar esta semana, a TAP está a cobrar um valor de 837,90 euros. O avião fará a viagem para São Paulo no dia 26 de Fevereiro com 298 lugares. O mesmo acontecerá no regresso a Lisboa. Mais 298 lugares. Num universo de cerca de 520 pessoas que precisam de viajar entre os dois países no imediato, apenas cerca 200 têm os seus bilhetes comprados na TAP. 

Esse total aproximado de pessoas inclui também os cidadãos brasileiros (ou de outras nacionalidades residentes no Brasil) que planearam regressar definitivamente ao seu país em voos que não são da TAP antes de saberem que as ligações aéreas iriam ser fechadas. Entre eles, em Portugal, há largas dezenas de pessoas que deixaram os seus empregos e as casas que alugavam porque iam partir em Fevereiro. Algumas tiraram os filhos da escola porque haviam iniciado o seu processo de transferência para uma escola no Brasil, onde o ano lectivo começa no início de Fevereiro.

Bilhetes à venda 

Contactado nesta segunda-feira para esclarecer como um “voo humanitário” para atender às necessidades de passageiros viajarem por “razões humanitárias” é afinal apenas dirigido a quem comprou ou compra agora uma passagem de mais de 800 euros, o MNE encaminhou as perguntas para a Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas.

Na resposta, a secretaria de Estado confirma que “aos passageiros que já dispunham de bilhete desta companhia aérea [TAP], e apenas desta, é feita uma alteração gratuita do bilhete, desde que dentro da mesma classe tarifária”. E acrescenta: “Aos restantes aplica-se o preço para este voo praticado pela TAP.” Ou seja: os que ainda não dispunham de bilhete na TAP podem adquiri-lo. 

No entanto, acrescenta que este "voo da TAP de São Paulo para Lisboa, de dia 27, destina-se a apoiar o regresso a território nacional, por razões humanitárias, de cidadãos nacionais, da União Europeia e de países associados ao espaço Schengen, e seus familiares (...) tendo em conta, como referiu o senhor ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros na Comissão de Assuntos Europeus, ‘uma definição lata e humanista daquilo que são razões humanitárias'”.

E faz saber que “a transportadora aérea tem vindo a contactar os passageiros que, sendo portugueses ou cidadãos estrangeiros com autorização de residência em Portugal, manifestaram junto dos postos consulares portugueses no Brasil necessidade de regresso imediato a território nacional”.

Indignação na comunidade 

“Onde estão os ministros das Relações Exteriores? Onde estão os consulados?”, questiona indignado o presidente da Associação Brasileira de Portugal e dirigente do Conselho de Cidadãos Brasileiros em Lisboa, Ricardo Amaral Pessôa, há 30 anos a viver em Portugal. “Eles representam os seus cidadãos e limitam-se a apresentar uma proposta que não resolve o problema da maioria das pessoas nesta situação.”

Na lista que Ricardo Amaral juntou ao ofício enviado a um represente das Forças Armadas do Brasil, na tentativa de sensibilizar as autoridades de Brasília para o problema dos cidadãos em Portugal, onde representam a maior comunidade imigrante com mais de 150 mil residentes, estão mais de 300 signatários de uma petição para exortar o Governo brasileiro a agir.

Entre estes, 140 tinham voos marcados com a TAP, e a maioria (178) tinha comprado bilhetes da Latam ou da Azul, ficando impossibilitada de embarcar neste “voo humanitário”. No sentido inverso, e numa petição idêntica, enviada ao PÚBLICO por uma portuguesa no Brasil, Catarina Miranda, estão 160 pessoas. Destas, só 60 previram viajar pela TAP. 

Assim se estima em cerca de 520 o número de candidatos a um voo de apoio ao regresso imediato (e em ambos os sentidos), e 200 estão contemplados pela iniciativa anunciada por Portugal como um voo humanitário e pelo Brasil como um voo comercial extraordinário e privado. 

“A embaixada do Brasil em Lisboa e os Consulados Gerais em Lisboa, Porto e Faro informam que os governos do Brasil e Portugal, por meio dos respectivos ministérios das Relações Exteriores, negociaram a realização de um voo comercial extraordinário da empresa aérea TAP entre Lisboa e Guarulhos”, referia a nota publicada na sexta-feira ao fim do dia.

“Os interessados devem tratar directamente com a TAP” a marcação dos voos através de um formulário que será disponibilizado pela companhia no site da mesma, acrescentava a nota, que invocava ao “estado de emergência e às restrições vigentes em Portugal” o facto de só poderem entrar no aeroporto passageiros com bilhetes confirmados pela TAP.

No entanto, a companhia Latam está a organizar pelo menos dois voos com escala em Madrid sem custos adicionais para quem voaria nesta companhia antes da suspensão das ligações, diz Ricardo Pessôa, que diz comprovar-se assim ser possível resolver o problema. “As pessoas estão a ser contactadas pela Latam e nós na associação estamos a tentar encaminhar mais pessoas para esta Latam. Ainda não sabemos se a Azul fará o mesmo.” Sem custos adicionais, os passageiros saem de Lisboa num voo da Ibéria com destino a Madrid. Da capital espanhola seguem para o aeroporto de Guarulhos, São Paulo. 

Nesse voo, estará Aline Kelle Rodrigues, que tinha previsto viajar no dia 8 de Fevereiro com passagens compradas em Outubro. Para esta mãe de três filhos de três, 11 e 13 anos, viajar neste voo extraordinário operado pela TAP representaria um custo de mais de 3200 euros. Aline tem o dinheiro suficiente para os quatro testes à covid-19 e pouco mais. Com Luís Villalobos