“Isso não é amor”: em vésperas de S. Valentim, há uma campanha para #NamorarSemViolência
A Secretaria de Estado para a Cidadania e a Igualdade uniu-se a tiktokers, instagrammers e youtubers para uma campanha contra a violência no namoro. Mais de metade dos jovens até ao 12.º ano reportam já ter sofrido pelo menos uma forma de violência, segundo estudo da UMAR.
“O Dia de S. Valentim está aí a chegar. Namoras com alguém? Essa pessoa não te deixa ver tiktoks sozinha? Não te deixa escolher que páginas seguir? Controla os vídeos e fotos que publicas nas redes sociais? Isso não é amor.” As palavras são de Beatriz Rosa, uma das tiktokers desafiadas pela secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade, Rosa Monteiro, para fazer parte da campanha #NamorarSemViolência.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
“O Dia de S. Valentim está aí a chegar. Namoras com alguém? Essa pessoa não te deixa ver tiktoks sozinha? Não te deixa escolher que páginas seguir? Controla os vídeos e fotos que publicas nas redes sociais? Isso não é amor.” As palavras são de Beatriz Rosa, uma das tiktokers desafiadas pela secretária de Estado para a Cidadania e a Igualdade, Rosa Monteiro, para fazer parte da campanha #NamorarSemViolência.
É que, apesar de para muitos ser claro que estes são indicadores de uma relação abusiva, 67% dos jovens portugueses consideram estes e outros comportamentos como naturais, segundo o Estudo Nacional de Violência no Namoro deste ano, da União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR). O mesmo estudo mostra que 58% dos jovens até ao 12.º ano reportam já ter sofrido pelo menos uma forma de violência.
Por isso mesmo, e apesar de neste S. Valentim as atenções estarem voltadas para a pandemia, a habitual campanha do Governo contra a violência no namoro volta a decorrer. Rosa Monteiro estabelece, aliás, um paralelismo, como refere ao P3: “Desde Março, quisemos pôr o tema da violência doméstica, contra as mulheres e no namoro em paralelo com o da pandemia – porque a violência é uma pandemia persistente e que afecta a esmagadora maioria das mulheres e raparigas.”
E não há altura melhor para o fazer do que numa data em que se destacam os valores “do amor das relações saudáveis”. Esta é a oportunidade ideal para “relembrar aquilo que ainda falta alcançar”: “Que as relações saudáveis não sejam um privilégio de apenas algumas, mas que possam ser transversais na sociedade.”
Para ajudar a espalhar a palavra, a campanha é, este ano, apadrinhada pelo cantor Agir, e conta com um conjunto de tiktokers, instagrammers e youtubers, como Madalena Aragão, Miguel Luz, Beatriz Rosa, Mário Lourenço, Laura Mourinho e Carolina Castelinho. A ideia é “passar a mensagem, divulgar as linhas de ajuda e desconstruir estes comportamentos e atitudes”, chegando, com a ajuda dos convidados, às camadas mais jovens e de diferentes faixas etárias, em que os números são preocupantes.
Além da campanha a decorrer nas redes sociais, esta sexta-feira, 12 de Fevereiro, às 10h, será realizado um webinar que se enquadra no programa da presidência portuguesa do Conselho da União Europeia na área da cidadania e da igualdade. A sessão de abertura vai contar com a participação da ministra de Estado e da Presidência, Mariana Vieira da Silva, e a de encerramento com Rosa Monteiro. Nesta sessão serão divulgados os dados do Estudo Nacional de Violência no Namoro, o estudo anual da UMAR, e os dados do Observatório da Violência no Namoro da Associação Plano I.
Este último, que incide sobre a população universitária, mostra que 53,8% dos jovens já sofreram pelo menos um acto de violência no namoro. E, tanto estes como os números da UMAR apontam para uma elevada prevalência de formas de violência psicológica, violência exercida em redes sociais ou de controlo (sobre o vestuário, hábitos de convívio ou outros).
O confinamento, que aumentou em cerca de 70% o uso da Internet, veio evidenciar ainda mais os riscos e a exposição a novas formas de violência online, segundo dados do Instituto Europeu para a Igualdade de Género. “Sabemos que muitas situações de violência são praticadas com recurso a meios digitais. A facilidade com que são enviadas fotografias, são manipuladas fotografias, é feita chantagem... são problemas novos que passam para a ordem do dia no momento em que a nossa vida passou para o online”, afirma a secretária de Estado para a Cidadania e Igualdade.
Esta é, de facto, uma questão que tem dado que falar. Esta segunda-feira, 8 de Fevereiro, a deputada não inscrita Cristina Rodrigues propôs uma pena de prisão de dois a cinco anos para quem divulgar fotografias ou vídeos de cariz sexual ou nudez sem consentimento da vítima.
Mas, em Portugal, “do que sabemos do Relatório de Cibersegurança do Observatório de Cibersegurança de 2019, há uma menor preocupação do público em geral relativamente ao discurso online”, em comparação com a média europeia. Há “muita invisibilidade e não-reconhecimento deste fenómeno”. Assim, Rosa Monteiro considera crucial “alertar, mas também reforçar o conhecimento, a informação e aumentar a literacia digital como um meio para prevenir muitas destas situações”.
Em 2020, as estruturas que integram a Rede Nacional de Apoio às Vítimas de Violência Doméstica, coordenada pela Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG), registaram 4180 atendimentos a pessoas com idades entre os 18 e os 25 anos. “Quase 82,5% eram pedidos de mulheres”, tornando evidente a necessidade de pôr termo à normalização e à prática deste tipo de acções.
Para isso, é necessário “combater as percepções de género tradicionalistas e os estereótipos de género que permitem cristalizar assimetrias profundas de poder entre o universo masculino e o feminino”. Como? “Costumo dizer que vem da água que se bebe”, afiança Rosa Monteiro.
A educação “formal e não formal”, desde criança, é essencial para “romper com a afirmação de masculinidades que passam pela violência, agressão, posse e exercício de poder sobre as mulheres e raparigas”. Por isso, a secretária de Estado reafirma a importância de programas já em curso, como a de “formação de pessoal docente e não docente para este trabalho permanente de educação” e de “educação para a cidadania em contexto escolar para a desconstrução destes comportamentos”, bem como de outros, mais recentes, como o novo projecto da Associação Plano I, apoiado pela CIG, que “intervirá em 34 escolas da região norte, sobre masculinidades não violentas”. O objectivo é “aumentar a capacidade de percepção dos próprios jovens e de quem contacta com eles de forma mais directa, de modo a erradicar estas relações assimétricas entre homens e mulheres”.
Afinal, como diz a Convenção de Istambul, citada por Rosa Monteiro, “as raízes da violência contra as mulheres são a posição de subordinação na sociedade das próprias mulheres”. E “viver numa relação de violência é viver numa relação onde não existe liberdade e respeito pela dignidade da pessoa”. Esta campanha quer devolvê-las às vítimas.