Que serviços de ecossistema se pretende remunerar?
Muitas explorações agrícolas e florestais estão hoje a atravessar dificuldades imensas, devido à total ausência de regulamentação do mercado de bens alimentares e agroflorestais.
As bases ecológicas de suporte ao sistema alimentar estão em degradação acelerada e a situação tende a agravar-se com a crise climática. Maiores riscos de degradação de solos, de secas extremas, de perdas de biodiversidade e de surgimento de mega-incêndios são apenas algumas das consequências das alterações climáticas, com enormes potenciais de destruição de capacidade produtiva. Com o avançar deste processo todo o território português perde resiliência e a agricultura será um dos sectores mais afetados. A crise climática exige a descarbonização de todas as atividades económicas, mas alguns dos seus efeitos já são impossíveis de evitar, o que obriga a medidas de adaptação ao novo clima que aí vem.
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As bases ecológicas de suporte ao sistema alimentar estão em degradação acelerada e a situação tende a agravar-se com a crise climática. Maiores riscos de degradação de solos, de secas extremas, de perdas de biodiversidade e de surgimento de mega-incêndios são apenas algumas das consequências das alterações climáticas, com enormes potenciais de destruição de capacidade produtiva. Com o avançar deste processo todo o território português perde resiliência e a agricultura será um dos sectores mais afetados. A crise climática exige a descarbonização de todas as atividades económicas, mas alguns dos seus efeitos já são impossíveis de evitar, o que obriga a medidas de adaptação ao novo clima que aí vem.
Ao nível da produção agrícola, além da melhoria da eficiência do uso de fatores de produção (pesticidas, adubos, etc.), é fundamental a redução de consumos e a sua substituição por processos ecológicos. Esta conciliação entre a atividade agrícola e a preservação de recursos naturais só é possível através da diversificação de culturas, com rotações e consociações. É a biodiversidade que confere capacidade adaptativa, resiliência a pragas e doenças, mas também à escassez de água, e que possibilita a reciclagem de nutrientes. Este caminho não é possível de se concretizar através de monoculturas de dimensões paisagísticas.
Num país onde a maioria da superfície agroflorestal e da produção é cultivada em sistemas extensivos de sequeiro e onde o clima mediterrânico não permite que seja diferente, ainda mais com as atuais projeções climáticas, é essencial garantir que uma grande parte da área não acaba abandonada por insustentabilidade social e económica, o que só agravaria as já grandes assimetrias territoriais.
Muitas explorações agrícolas e florestais estão hoje a atravessar dificuldades imensas, devido à total ausência de regulamentação do mercado de bens alimentares e agroflorestais. As grandes cadeias de distribuição montaram um cartel onde estabelecem os preços que entendem e colocam os produtores a vender frequentemente abaixo dos custos de produção. E por muito que a produção nacional se organize, será sempre pequena na relação de forças com as multinacionais da distribuição. Este é um problema transversal a toda a agricultura portuguesa e que os consecutivos Governos nunca tiveram a coragem de resolver.
O Bloco de Esquerda propôs há um ano a transposição urgente de uma Diretiva Comunitária de combate às práticas desleais de mercado, entre outras medidas, mas foram chumbadas pelo PS e pela direita, que não apresentaram qualquer alternativa. Em maio passará o prazo comunitário para a sua transposição.
Mas este problema não afeta todos por igual. É mais dramático no caso dos sistemas extensivos, frequentemente de sequeiro, com baixa produção de bens alimentares, mas com enorme produção de serviços de ecossistema, como são exemplo a preservação de biodiversidade, de património paisagístico ou a proteção de zonas habitacionais contra incêndios. No passado dia 3 de fevereiro, o Bloco de Esquerda levou a votos no Parlamento a proposta de que o Governo tomasse medidas para uma maior valorização destas produções e para valoração e remuneração de serviços de ecossistema que respondam ao interesse público através da produção de espécies e raças autóctones. Foram chumbadas, novamente com os votos contra do PS e da direita.
A Lei do Orçamento do Estado de 2020 prevê 100 milhões de euros para pagamento de serviços de ecossistema. Prevê-se que a nova PAC contemple também milhões de euros a aplicar até 2027 para este fim, através dos eco-regimes. Se este dinheiro não serve para remunerar serviços de ecossistema prestados por sistemas de produção extensivos e por espécies e raças autóctones, onde o pretendem aplicar estes partidos?