Quatro vias de trânsito tornam Rua de Campolide, em Lisboa, ainda menos amiga dos peões
Excessos de velocidade sempre houve, mas moradores e comerciantes sentem que a situação piorou e há quem duvide da eficácia dos semáforos. Medina promete “empenho pessoal na resolução do problema”.
Cláudia Baltazar lembra-se do dia em que viu uma vizinha idosa ser mortalmente atropelada enquanto atravessava a passadeira. Foi em 2015. A bem dizer, o episódio não saiu da memória de quem reside no troço da Rua de Campolide entre a Av. Miguel Torga e a Quinta José Pinto. “Sempre aqui houve excesso de velocidade”, lamenta.
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Cláudia Baltazar lembra-se do dia em que viu uma vizinha idosa ser mortalmente atropelada enquanto atravessava a passadeira. Foi em 2015. A bem dizer, o episódio não saiu da memória de quem reside no troço da Rua de Campolide entre a Av. Miguel Torga e a Quinta José Pinto. “Sempre aqui houve excesso de velocidade”, lamenta.
As obras que transformaram a rua numa larga artéria com quatro vias de trânsito e separador central parecem ter agravado o problema. Há semáforos junto às passadeiras, mas eles ainda não estão a funcionar correctamente. E mesmo quando trabalham bem são precisos mil cuidados. Num dia de Janeiro, relata Cláudia, saiu para caminhar com os dois filhos pequenos e teve de os puxar para trás quando já davam os primeiros passos na passadeira. “Estava verde para os peões e um carro não parou.”
Desde que a rua foi aberta com a sua actual configuração, há mais de dois meses, que quem aqui vive reclama à Câmara de Lisboa que ponha os semáforos a funcionar rapidamente porque a sensação de insegurança aumentou para os peões. Devido à pandemia e ao confinamento há menos carros a circular, o que propicia velocidades maiores.
“Passam a muita velocidade”, queixa-se João Vilaverde, dono da famosa Tasquinha do Lagarto. “Agora o alcatrão está novo, está liso, facilita muito o acelerar. Por acaso ainda não aconteceu nada”, comenta. “Eu saio de casa, ando 30 metros para o lado e tenho uma passagem de peões, só que o semáforo não está a funcionar”, conta Hermes Palma. “Felizmente, mais de metade dos condutores param para me deixar passar. Deve ser por eu já ter cabelos brancos”, ri-se.
Os semáforos estiveram desligados várias semanas porque, devido a problemas de comunicação entre a câmara e a EDP, o necessário ramal de electricidade ainda não está instalado. A autarquia fez uma puxada para pôr dois dos três sinais a funcionar, mas isso é uma solução temporária que não dá garantias de segurança aos transeuntes.
Moradores e comerciantes reconhecem que a rua melhorou com as obras. O largo passeio de um dos lados estava permanentemente ocupado por carros que dificultavam a circulação pedonal – e isso acabou. Foi instalado um ecoponto enterrado que, espera-se, vai minimizar os problemas de higiene urbana. As árvores e os arbustos plantados no separador central dão outro ar à zona.
“A obra era inequivocamente ansiada e traz melhorias”, resume André Brito. “No que toca à segurança rodoviária é que há coisas que ainda têm de ser salvaguardadas”, diz este residente que é o primeiro subscritor de uma petição com 160 assinaturas que pede à câmara uma acção urgente.
Na semana passada, André participou na reunião pública da autarquia e ouviu de Fernando Medina a garantia de que se ia envolver pessoalmente no assunto. “Terá todo o meu empenho pessoal na resolução deste problema”, disse o autarca. “Foi imediatamente a seguir a assumir funções, em 2015, que se tomou a decisão de se fazer as obras na Av. Miguel Torga, que era palco de um triste e terrível registo de atropelamentos”, lembrou.
Há anos que tanto a Miguel Torga como a Rua de Campolide estão identificadas pela câmara como “pontos negros” de atropelamentos na cidade. Como permitem a ligação entre o Eixo Norte/Sul e as Amoreiras, as duas artérias são muito procuradas por automobilistas e o trânsito, além de ser muito, faz-se frequentemente a velocidades pouco indicadas para uma zona residencial e onde subsiste algum comércio de proximidade.
Esta foi uma preocupação que os residentes tentaram expressar em Setembro de 2019, quando a Sociedade de Reabilitação Urbana (SRU) fez uma reunião em Campolide. A empresa municipal, que não foi responsável pelas opções de projecto mas apenas pela contratação e gestão da empreitada, informou então que estavam previstas três passadeiras com semáforos – que existem – e a sobrelevação da estrada junto ao Jardim da Amnistia Internacional – que não existe.
Perto desse local funciona um jardim-de-infância da Santa Casa, que por ora está fechado. Em frente existe uma passadeira com um semáforo que é activado por um radar de velocidade instalado uns metros mais atrás. “Às vezes estou aqui à porta e vejo os carros a virem com muita velocidade e a passar o amarelo. Quando o sinal fica vermelho já o carro passou”, diz João Vilaverde. “Há um aumento excessivo de velocidade já em cima do semáforo para passar o laranja”, alerta André Brito.
Por isso, mesmo quando todos os semáforos estiverem a trabalhar devidamente, receia-se por aqui que não seja suficiente. “Os semáforos por si só não chegam. Claramente que as soluções que ali estão não servem”, diz Cláudia Baltazar. “Isto não são os Cabos d’Ávila, é uma zona residencial. É impensável numa capital europeia com este posicionamento que haja velocidades acima de 50 km/h numa zona residencial”, diz André Brito.
“Iremos fazer tudo aquilo que for necessário para garantir que este troço ganhe segurança, ainda para mais quando a via assumiu um papel mais pesado em matéria de mobilidade e com mais risco”, afirmou Medina na semana passada. “Se for necessário ter lá a polícia, teremos.”