Alvura, o novo parque na Maia que vai devolver o rio Leça a humanos e bichos

Com a associação entre os municípios por onde passa prestes a ser constituída, o antigo rio de má fama da Área Metropolitana do Porto começa a ganhar nova vida.

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O Rio Leça nasce em Monte Córdoba, no concelho de Santo Tirso, e percorre quase 45 quilómetros até ao mar Paulo Pimenta / PUBLICO

São apenas 90 dias de empreitada. Com um bocado de sorte, se a pandemia abrandar, talvez haja direito a festa quando o Parque Fluvial da Alvura, em Milheirós da Maia, estiver pronto. Se ainda há, como diz o engenheiro do ambiente Artur Branco, crianças das imediações que nunca passearam pelas margens do rio onde os avós aprenderam a nadar, o cenário está prestes a mudar. E, pelo meio, da nascente em Santo Tirso, à foz, em Matosinhos, o Leça vai passar a ter, como prometido, uma associação de municípios que o defenda e valorize de forma articulada. 

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São apenas 90 dias de empreitada. Com um bocado de sorte, se a pandemia abrandar, talvez haja direito a festa quando o Parque Fluvial da Alvura, em Milheirós da Maia, estiver pronto. Se ainda há, como diz o engenheiro do ambiente Artur Branco, crianças das imediações que nunca passearam pelas margens do rio onde os avós aprenderam a nadar, o cenário está prestes a mudar. E, pelo meio, da nascente em Santo Tirso, à foz, em Matosinhos, o Leça vai passar a ter, como prometido, uma associação de municípios que o defenda e valorize de forma articulada. 

A má fama ficou para trás. As águas ainda não são cristalinas mas o responsável, na Câmara da Maia, pela equipa do projecto Corredor Verde do Leça já nota melhorias significativas num rio onde, lembra, em 2008, quando chegou ao município, era raro ver-se um guarda-rios. Agora até há casais deles na zona da Alvura, bem como garças e até os corvos-marinhos se adentram por terra, para ir ali pescar, explicou ao PÚBLICO. 

É neste cenário, entre os antigos moinhos da Alvura, que o município está a avançar com a primeira parte do parque fluvial, na margem esquerda, com o compromisso, já assumido pelo presidente Silva Tiago, de o prolongar para a margem direita, ligando-as por uma ponte. Ali, num cotovelo de pouco mais de um hectare, está a nascer uma zona de lazer, mas também uma estação de serviços: para a bicharada, que ganhará refúgios, e para os habitantes da zona, que terão, neste mesmo parque, um sistema natural de controlo de águas pluviais do casario envolvente que ajudará a minimizar o caudal torrencial de Inverno do Leça e, esperam os técnicos, deverá poupar a zona de Parada, mais a sul, a algumas inundações. 

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Soluções de base natural

Segundo Artur Branco, estas bacias de retenção (as charcas, no desenho do projecto), com a capacidade projectada de 183 metros cúbicos, serão, em tempo seco, espaços utilizáveis por quem frequenta o parque. Mas estas depressões no terreno serão importantes, nos dias de chuva extrema, pois será para elas que as caixas de recepção de águas pluviais das ruas na envolvente drenarão, quando atingirem o limite da capacidade, retendo, por algum tempo, a água que engrossaria o caudal do Leça. 

Artur Branco explica que as soluções de base natural que vão ser postas em prática no parque de Alvura poderão ser replicadas noutros pontos da bacia e das margens do Leça. Com a Corredor Verde do Leça - Associação de Municípios prestes a ser constituída, Santo Tirso, Valongo, Maia e Matosinhos devem apresentar, até ao final de Março um masterplan e o programa estratégico para uma década que guiará as intervenções neste curso de água de 44 km que nasce no Monte de Santa Luzia e encontra o mar em Leixões, onde a construção do porto comercial lhe alterou, e muito, o aspecto. 

Se, na foz, o Leça perdeu o ar bucólico de outrora, há muitos pontos das suas margens onde a natureza resistiu à urbanização destes territórios, nota Artur Branco. Tanto assim que os quatro municípios pretendem, mesmo, vir a concretizar um corredor ribeirinho, acessível a pé ou de bicicleta, ao longo de todo o percurso daquele que já foi considerado um dos rios mais poluídos da Europa. 

Percurso de sete quilómetros liga Matosinhos à Maia

Para já, está em curso um projecto que abrange um troço de sete quilómetros, entre a Ponte da Pedra (Maia) e a Ponte de Moreira, e que este engenheiro do Ambiente considera que para além de ser um corredor para actividades de lazer e contacto com a natureza poderá também servir para incrementar a mobilidade suave nesta zona entre os dois concelhos. Isto tendo em conta a existência, nas imediações do percurso, de vários pólos de emprego, como a sede da Sonae, a fábrica da Unicer, o Centro Empresarial da Lionesa, entre outros. 

O trabalho a quatro prevê a criação, em cada concelho, de um pólo principal do Leça, um ponto onde seja possível desenvolver múltiplas actividades e potenciar a relação com o rio. Na Maia, esse será o papel do parque da Alvura, cujo projecto prevê, por exemplo, a construção de uma pérgula natural, uma espécie de dome criada pelo entrelaçamento dos ramos de vários salgueiros, à sombra dos quais adultos e crianças reaprenderão a viver com o rio onde os avós aprenderam a nadar, e a defendê-lo. 

Graças à iniciativa das Cem mil Árvores para a Área Metropolitana do Porto, a zona já tinha sido alvo de acções, muito participadas pela comunidade, de desbaste de exóticas e plantio de espécimes autóctones ajustadas a um leito de cheias. Agora vão ser plantados mais amieiros e freixos, sabugueiros e pilriteiros, mas, também, vai ser dado espaço para a regeração natural deste coberto, adianta o chefe da equipa multidisciplinar do Leça na Maia. 

Fazer dos habitantes guarda-rios

Em paralelo com este esforço de reabilitação ambiental e paisagística, a Maia, como os municípios vizinhos, pretende fazer das populações os outros guarda-rios do Leça, para tentar, com isso, acabar com as descargas que, aqui e ali, o sujam, e com algumas situações de depósito de entulhos nas margens, que ainda acontecem. Para isso, assume Artur Branco, é preciso que os habitantes deixem de estar de costas voltadas para o rio, e possam, em segurança, frequentá-lo. O que vai começando a acontecer. 

Na Área Metropolitana do Porto, este é o segundo projecto intermunicipal na área do Ambiente. A Corredor Verde do Rio Leça, que envolve não as autarquias mais mais de uma dezena de parceiros, desde a universidade a associações, segue os passos da cooperação entre os municípios de Valongo, Gondomar e Paredes, que deu origem ao Parque das Serras do Porto. Num como noutro, as câmaras associadas juntam esforços, partilham recursos humanos e procuram financiamentos mais robustos para desenvolver o trabalho no terreno, com uma equipa própria dedicada a concretizar os objectivos. 

Para o presidente da Câmara da Maia, a reabilitação do Leça tornou-se uma prioridade para o município. “Não só porque obedece à estratégia municipal de adaptação às alterações climáticas, mas, também, porque é urgente devolver o Leça, com toda a sua riqueza ecológica e identitária, ao usufruto das populações”, insiste numa nota alusiva ao lançamento da obra do Parque de Alvura.