APA – A exterminadora implacável do Ambiente em Portugal
Ao emitir uma Declaração de Impacto Ambiental favorável ao projecto do novo porto de Leixões, a APA insistiu em desempenhar, tal como tem feito nos últimos anos, o único papel para o qual parece inspirada: ser a exterminadora implacável dos meios de defesa do Ambiente em Portugal.
Insidiosamente, a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) deu mais um passo assinalável na degradação do ambiente em Portugal, ao emitir uma Declaração de Impacto Ambiental (DIA) favorável ao projecto do novo porto de Leixões, contrariando as recomendações do Parlamento e da sociedade civil que se tem mobilizado contra mais este atentado ambiental.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Insidiosamente, a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) deu mais um passo assinalável na degradação do ambiente em Portugal, ao emitir uma Declaração de Impacto Ambiental (DIA) favorável ao projecto do novo porto de Leixões, contrariando as recomendações do Parlamento e da sociedade civil que se tem mobilizado contra mais este atentado ambiental.
Este projeto, que contempla na verdade, além do novo terminal de contentores, as acessibilidades marítimas e o prolongamento do quebra-mar exterior do porto de Leixões, aumenta a capacidade portuária em 44% e a capacidade contentorizada em mais de 73%. Mais grave, a APA e o Governo permitem uma vez mais tratar um único grande projeto dividindo-o em três, de forma a camuflar os impactes ambientais cumulativos, mesmo sabendo que tal prática é ilegal, conforme o Tribunal de Justiça da UE já reiteradamente sentenciou.
Os dois Estudos de Impacte Ambiental (EIA) feitos para o prolongamento do quebra-mar em 300 metros e aprofundamento da baía de rotação apontam riscos para o ambiente, designadamente a deterioração da qualidade da água, do ar e dos solos, a alteração morfológica da praia e o aumento dos níveis de ruído e do tráfego rodoviário.
A excessiva contentorização, a ameaça direta à qualidade da praia e aos desportos náuticos – o surf, forte factor de dinamização local, ficará em risco – estiveram na origem de um abaixo-assinado, enviado à Assembleia da República em julho de 2019. O Parlamento aprovou, já em outubro de 2020, quatro projetos de resolução, recomendando ao Governo a suspensão ou a reavaliação da ampliação do quebra-mar de Leixões, em Matosinhos. Mas a obra já foi adjudicada e deverá ser consignada em Fevereiro, de acordo com a Administração dos Portos do Douro, Leixões e Viana do Castelo (APDL).
O Governo português é um dos 14 executivos que integram o Painel de Alto Nível para uma Economia Sustentável do Oceano, tendo assinado no início do mês o compromisso de gerir de forma sustentável 100% do oceano sob jurisdição nacional já em 2025, com o objectivo de usar os recursos marinhos de forma sustentável e no combate às alterações climáticas.
O Governo propôs-se ainda, juntamente com o Quénia, coorganizar a Conferência Mundial dos Oceanos, agendada para Junho de 2020 e adiada devido à situação de saúde pública. Sabendo que o tráfego marítimo tem um impacto substancial na sustentabilidade dos oceanos, não se compreende esta duplicidade governamental que promove, licencia e financia directa e indirectamente obras que contrariam os compromissos internacionais assumidos.
Um relatório recente do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (UNEP) demonstra, claramente, que mesmo com progressos tecnológicos sem precedentes, só com a redução da intensidade do tráfego marítimo e aéreo, sobretudo na próxima década, é que se torna possível mantermo-nos dentro dos limiares de segurança que permitirão assegurar a estabilidade climática. Mas o EIA pretende que, com esta obra, haverá uma diminuição das emissões de gases com efeito de estufa (GEE), embora o não demonstre. Aliás, o próprio estudo admite um substancial aumento do número anual de navios em Leixões.
A situação é alarmante. Em Portugal, as estatísticas mostram-nos que, em Janeiro de 2020, face ao período homólogo, o consumo de combustíveis fósseis em bancas marítimas, que já tinha crescido muito em anos anteriores, registou um aumento de 13,3%. De referir que, tal como a aviação, os combustíveis marítimos estão, entre nós, totalmente isentos do pagamento de impostos.
O cidadão incauto poderia pensar que a missão da APA passa pela promoção e defesa dos valores naturais, biofísicos e paisagísticos do país. Tal é assim descrito na sua missão, que inscreve, entre outros, o compromisso de contribuir para “um elevado nível de proteção e de valorização do Ambiente”.
Mas o que a acção da APA revela, DIA após DIA, da avaliação ambiental ao aeroporto do Montijo, à ausência de avaliação ambiental às obras de ampliação dos aeroportos de Lisboa e do Porto, ao aval dado às dragagens no estuário do Sado ou à permissão de prospecção de lítio e outros minérios em áreas protegidas, para somente citar alguns dos casos mais recentes e paradigmáticos da total ausência de preocupação ambiental, é precisamente o oposto. A APA evidencia aliás no seu currículo um palmarés invejável: nos últimos 25 anos, somente 6% das suas avaliações ambientais foram desfavoráveis ao dono da obra.
Culminando um ano tão difícil devido à pandemia do coronavírus, a APA insistiu em desempenhar, tal como tem feito nos últimos anos, o único papel para o qual parece inspirada: ser a exterminadora implacável dos meios de defesa do Ambiente em Portugal.
A autora escreve segundo o novo acordo ortográfico