“Nô mindjeris”: retratos de uma ponte entre Portugal e a Guiné-Bissau para combater a excisão
Projecto de cooperação apoia trabalho contra mutilação genital feminina e práticas nefastas tradicionais na Guiné-Bissau. Em Portugal, ainda “há muitas mulheres que continuam sozinhas”.
Antes daquele dia, Aisha, como lhe chamaremos, não se sentia “à vontade para falar e nem tão pouco esperava ouvir alguém a falar assim na primeira pessoa”. “A minha primeira experiência foi um bocadinho chocante”, recorda. Naquela palestra, Fatumata Djau Baldé, presidente do Comité Nacional para o Abandono das Práticas Tradicionais Nefastas à Saúde da Mulher e da Criança da Guiné-Bissau (CNAPN), “explicou tudo” o que lhe aconteceu desde que foi submetida ao fanado, o ritual de mutilação genital feminina (MGF) feito por algumas etnias no país. “Fiquei chocada, chorei bastante... Foi a primeira vez”, explica Aisha. “Depois comecei a conhecer mais pessoas e a falar e agora já falo naturalmente, sem aquele choque, aquela dor que eu sentia.”
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Antes daquele dia, Aisha, como lhe chamaremos, não se sentia “à vontade para falar e nem tão pouco esperava ouvir alguém a falar assim na primeira pessoa”. “A minha primeira experiência foi um bocadinho chocante”, recorda. Naquela palestra, Fatumata Djau Baldé, presidente do Comité Nacional para o Abandono das Práticas Tradicionais Nefastas à Saúde da Mulher e da Criança da Guiné-Bissau (CNAPN), “explicou tudo” o que lhe aconteceu desde que foi submetida ao fanado, o ritual de mutilação genital feminina (MGF) feito por algumas etnias no país. “Fiquei chocada, chorei bastante... Foi a primeira vez”, explica Aisha. “Depois comecei a conhecer mais pessoas e a falar e agora já falo naturalmente, sem aquele choque, aquela dor que eu sentia.”
Aisha, 38 anos, nasceu na Guiné-Bissau, a maior comunidade com prevalência da prática em Portugal, e vive na região de Lisboa há dez anos, com dois filhos. Está há cerca de dois anos integrada no projecto “Meninas e Mulheres: Educação-Saúde-Igualdade-Direitos”, promovido pela organização portuguesa P&D Factor – Cooperação sobre População e Desenvolvimento e o CNAPN, com o apoio da Secretaria de Estado para a Cidadania e Igualdade de Portugal e da Cooperação Portuguesa em Bissau. A sua filha, de quatro anos, não foi submetida à prática nefasta do corte genital.
Em Bissau, o projecto permite dar apoio ao trabalho do CNAPN, por exemplo, em acções junto de encarregados de educação, líderes religiosos ou até de ex-“fanatecas”, nome dado às mulheres que praticam a excisão nas meninas. O trabalho levado a cabo em dez bairros de Bissau onde havia mais comunidades com prevalência de práticas nefastas é retratado na exposição “Nô mindjeris i nô forsa di transformason/As nossas mulheres são a nossa força de transformação”, com registos de três fotógrafos voluntários, LUZIA, Maria Manuel Andrade e Tiago Lopes Fernandez, que acompanharam algumas das deslocações da P&D Factor à Guiné-Bissau e retrataram o trabalho no terreno, contactando com as populações locais dos bairros e tabancas. Inaugurada no início de Janeiro, na sede da P&D Factor, em Lisboa, a exposição vai manter-se itinerante em Portugal, antes de seguir para a Guiné-Bissau.