Que país vai encontrar o futuro Presidente da República?
A ausência de estratégia para a superação da crise é uma realidade muito preocupante.
Foi sob este mote que participei, há dias, num debate na TSF. Porque é uma pergunta pertinente, quero partilhar o que penso. Vai encontrar um país tal como existe há vários anos, com o agravamento e as incertezas resultantes da pandemia atual: um país empobrecido e desigual, dividido, sem enquadramento solidário e sem estratégia para a superação da crise.
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Foi sob este mote que participei, há dias, num debate na TSF. Porque é uma pergunta pertinente, quero partilhar o que penso. Vai encontrar um país tal como existe há vários anos, com o agravamento e as incertezas resultantes da pandemia atual: um país empobrecido e desigual, dividido, sem enquadramento solidário e sem estratégia para a superação da crise.
O empobrecimento resulta não só da crise económica mas também do facto de não existirem linhas de rumo para o desempobrecimento, ou erradicação da pobreza. As desigualdades podem acentuar-se, devido não só à tendência que vinha de trás, mas ao facto de a crise originar novas discriminações, como por exemplo: entre quem perdeu rendimentos, ou outros bens, com a crise, e quem não perdeu ou lucrou com ela; entre os beneficiários e os excluídos das ajudas estatais e comunitárias; entre quem se instala em empregos de prestígio, mesmo improdutivos, e quem se debate com o desemprego ou com trabalhos mal remunerados...
O país está bastante dividido, em consequência não só das desigualdades acabadas de referir, mas também por força de posicionamentos políticos, de realidades territoriais e do peso dos interesses dominantes. A falta de enquadramento solidário mais profundo e consistente resulta de não se: informar, regularmente, o país sobre a situação social e económica; coordenar as entidades públicas, privadas, com e sem fins lucrativos, e o voluntariado social a favor da convergência para objetivos comuns; nem assegurar um rendimento mínimo (com esta ou outra designação), em tempo oportuno, próximo do limiar da pobreza e acessível a todas as pessoas dele necessitadas.
A ausência de estratégia para a superação da crise é uma realidade muito preocupante; na verdade, muito embora existam o “Plano de Recuperação e Resiliência", bem como financiamentos e orientações provenientes da UE, não foram criadas condições para que todas as localidades estejam envolvidas neste esforço nem para que todos os cidadãos possam participar como agentes e como destinatários; tal falta de estratégia poderá contribuir para que a distribuição dos meios financeiros provenientes da UE se efetue mais em função das capacidades de aplicação que das necessidades a atender.
Mas a pergunta anterior fez-me suscitar outra: como poderá o futuro Presidente da República contribuir para um inflexão considerável, a favor da justiça e do bem comum. Conseguiria isso, em meu enteder, se tomasse dois tipos de iniciativas. O primeiro consiste na influência, junto do Governo e de outras entidades, para que assegurem uma informação regular, pelo menos quinzenal, sobre a situação social e económica do país, com vista à solução dos diferentes problemas que vão surgindo; esta informação poderia ser análoga à que é difundida sobre a pandemia, em termos sanitários, e deveria incluir, além do mais, as estatísticas relativas ao atendimento social praticado em todo o país pelo sector público, sobretudo o Instituto da Segurança Social e as autarquias locais, pelas IPSS e pelos grupos de voluntariado social; a coordenação, a nível de freguesia, de município e nacional, de todas as entidades que atuam no domínio social, a fim de se otimizar o aproveitamento das suas capacidades e evitar que alguns casos sociais graves fiquem excluídos.
Parece indispensável que funcione, junto do Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, um órgão consultivo integrado por representantes de alguns ministérios, das autarquias locais (de município e de freguesia), das IPSS e da Confederação Portuguesa do Voluntariado; a adequação do regime do rendimento social de inserção com vista a abranger, em tempo oportuno e com um montante próximo do limiar da pobreza, todas as pessoas que dele necessitem, pelo menos enquanto se registarem os efeitos da pandemia. Esta medida, de caráter geral, poderia evitar a excessiva dispersão e burocratização de regimes particulares para determinados grupos; o cumprimento do disposto no art.º 90.º da Constituição da República sobre os “planos de desenvolvimento económico o social”, tendo em conta os planos de desenvolvimento local, a partir das freguesias e municípios, e visando a erradicação da pobreza e o pleno emprego (cf. os artºs. 9.º, alíneas d) e g), e 58.º).
O segundo tipo de iniciativas presidenciais consistiria no patrocínio, ou promoção, de um evento anual centrado na situação social do país, com realce para a pobreza, o desemprego e a exclusão social. Nele participariam, nomeadamente, representantes das entidades atrás referidas e visar-se-iam três objetivos: i) a consciência coletiva dos problemas sociais; ii) a identificação de caminhos e a assunção de compromissos para as respetivas soluções; iii) a integração de tais soluções nos processos – nacional, sectorial, regional e local – de desenvolvimento do país.
Presidente da Confederação Portuguesa do Voluntariado
O autor escreve segundo o novo acordo ortográfico