Os debates presidenciais. Melhor dizendo, os duelos medievais... Quem venceu?!

Os portugueses tiveram a amostragem do show de horrores que é o político contemporâneo português.

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LUSA/JOSÉ FERNANDES

Assisto aos debates com olhar profissional, não como eleitora. Analiso postura, entoação de voz, olhar, expressão, roupa, conteúdo, segurança do candidato frente às câmaras e, claro, o moderador e as regras do debate.

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Assisto aos debates com olhar profissional, não como eleitora. Analiso postura, entoação de voz, olhar, expressão, roupa, conteúdo, segurança do candidato frente às câmaras e, claro, o moderador e as regras do debate.

Adianto-lhes que não farei uma análise de predileção política, mas de presença política dos candidatos frente à atividade do debate televisivo e sua importância na campanha eleitoral sob a ótica do eleitor.

O debate é a essência da atividade política. É debate de ideias e não o que vimos nos últimos dias nos três principais canais de televisão portuguesa. Aliás, penso que os portugueses tiveram a amostragem do show de horrores que é o político contemporâneo português.

Deparámo-nos com embates pessoais e superficiais onde o que eles “acham” ou “pensam” foi o parâmetro de discussão entre as senhoras e senhores que nos representam nas casas dos poderes.

Sem exceção, todos estão a fazer carreira política. A fazer dessa candidatura um trampolim para a estrada que cada um quer seguir, pois o resultado dessa eleição é premonitório e factível: Marcelo será reeleito.

 Mas vamos aos “concorrentes” e suas pretensões:

Ana Gomes

Ana Gomes realmente incorporou o papel de candidata, deixando de lado sua raiz de contestadora contundente para vestir uma “Ana Gomes Paz e Amor”. Penso ser ideia de algum assessor de plantão que a transformou em uma boneca ventríloquo, cheia de maquilhagem, retirando-lhe toda sua essência política. Isso é o que aparece na televisão! Para quê, não sei... Não vi nas sondagens ganhos que pudessem justificar isso.  Dra. Ana poderia estar para nós como Angela Merkel está para a Alemanha. Mas algo correu e corre mal nesse percurso. Uma mulher com sua história intimidou-se com a garganta de Ventura. Esperava-se da dra. Ana sua altivez e sua garra em colocar o dedo em riste e dizer-lhe fatos históricos que o miúdo desconhece. E pedir respeito.

André Ventura

O eleito pelos candidatos como protagonista da novela presidencial. Quem deu antena para o Chega e para o dr. André foram os adversários. Erro crasso de não se eleger o alvo correto. Mas atenção: ele diz o que quer e deve estar causando mal-estar em muita gente “por detrás das cortinas” pois garanto-lhes que muitos se assustam ao concordar com suas falas. Isto porque ele diz o que a voz silenciosa por parte da população sente no bolso, nas ruas e na alma, mas se envergonha de verbalizar. Mas será que era necessário esta claquete toda contra o rapaz? Fez o jogo dele... Agora não adianta reclamar, os números dele tendem a crescer cada vez mais. E não nas sondagens, mas nas eleições de facto. O carisma do presidente do Chega é oculto, por enquanto.

João Ferreira

Cara de bom moço que não rompe o momento crítico que Portugal e o mundo vivem. Essencialmente diplomático para um candidato do PCP. Um candidato de um partido comunista demanda mais energia. Uma energia do tipo do rapaz do Chega. É o espelho da crise profunda que o PCP atravessa. Posso dizer que não se fazem mais comunistas como antigamente. Os mais velhos hão-de concordar comigo.

Marcelo Rebelo de Sousa

O príncipe dos políticos, apesar da idade. Perdeu a prática de “pivô” da TV por estar presidente e fazer a cena de olhar 180º. graus para todas as câmaras. É de dar dó dos operadores de câmara dos debates que se perdem na sua movimentação excessiva. Mas, sejamos pragmáticos, com alguns dados na ponta na língua, é um galã à moda antiga que discorre sobre Portugal e sua administração de forma soberana. Sua retórica envolvente colocou Marisa em seus “braços”, Ana “Paz e Amor” Gomes em seu sorriso, João Ferreira em seu gabinete de melhores alunos...

Sua estirpe diplomática sobreviveu aos ataques do candidato visceral e gladiador, André Ventura e, por pouco, também sobreviveu ao Tiago Mayan, o que julgo ser o candidato que nada tem a perder nem a ganhar, que quer apenas alguns minutos de antena para dizer aos vizinhos e clientes que por lá passou... Enfim, para quê desgastar-se se já tem mais de 60% de intenção de votos... É só aparecer e fazer ouvidos moucos

Marisa Matias

Uma política que carrega todos os atributos para representar Portugal seja no Parlamento Europeu, seja na Assembleia. Entretanto, tanto ela como os outros candidatos dessa eleição precisam ser preparados. E quando digo preparados, digo preparados por equipe técnica de especialistas competentes das mais diversas áreas: saúde pública, educação de base, educação superior, tecnologia de informação, segurança nacional, mobilidade, recursos humanos, recursos hídricos, tudo, absolutamente tudo. Não foi bom para a candidata que em cada aparição tinha uma máscara, e não estou a falar da máscara de proteção ao vírus covid-19. Esse é um dos problemas desse formato de “debates”.

Tiago Mayan

A verdade de cada um é a sua verdade. Mas Mayan foi um exemplo da arrogância indiscriminada dos que só falam e não querem ouvir nada e nem ninguém. Não foi o único, é verdade. Mas fez um papel de “poste” ao tentar cimentar sua presença no eu existo. No Brasil dizemos que só faltou colocar uma melancia na cabeça!

Vitorino Silva

As eleições, muitas vezes, pregam-nos piadas e nos trazem figuras que aliviam as tensões dos embates políticos. O sr. Vitorino é uma dessas figuras. Leve, brincalhão, de bem com a vida, mas de olho clínico aos problemas reais da sua comunidade, sabe ser crítico e também leve nas suas aparições. Sua pureza da aldeia nos dá esperança de que tempos bons hão-de voltar. A nostalgia aconchega o coração.

Classifico todos os encontros como duelos e não debates. De certa forma, em geral, mais desfavoreceram os candidatos, revelando suas piores vertentes do que os favoreceram.

Ana Gomes não foi a Ana Gomes; André Ventura teve audiência e tornou-se o exterminador de adversários, sem contar no deboche aos candidatos; João Ferreira expôs toda a falta de experiência e imaturidade política; Marisa Matias parecia uma atriz de novela, cada dia uma novela; Tiago Mayan, não tenho como analisá-lo, é candidato kamikase; e Vitorino Silva esteve contente em aparecer na TV sempre que pôde. Quem esteve em situação de conforto foi sempre Marcelo Rebelo de Sousa. Mas, se não fosse a larga vantagem, a sua presença nos duelos seria outra.

Ao término de cada duelo televisivo uma, três... dez análises eram publicadas, de forma que, os candidatos pautaram-se a cada apresentação pelo que os analistas diziam e não no entendimento do eleitor.

Os candidatos e suas equipes de marketing político devem ter em conta que o debate é o momento final de decisão do voto. E que, no bom marketing eleitoral, o conteúdo político do candidato é o eixo do discurso e de toda a estratégia política. O debate é o show ao vivo em que o eleitor se depara com o candidato real e pode assim analisá-lo em profundidade e decidir: qual é o Presidente que eu quero para mim, para minha família, para o meu país.

Por isso, o objetivo é fazer com que o candidato fale o que seja preciso ser dito. Apareça e porte-se da forma que seja necessário. Que se comporte do jeito que os eleitores desejam.

Este é o show da política. Então, diga-me o leitor, quem foram os vencedores destes “debates”, ou melhor, destes duelos?