Processo de obra na Foz Velha termina com “vitória da sociedade civil”
No lugar do lar de luxo e de uma área de serviços com mais de 7 mil metros quadrados, serão construídos na Quinta do Montebelo, situada em área classificada, moradias unifamiliares com rés-do-chão e primeiro andar.
Já há um desfecho para o processo da Quinta de Montebelo que agrada a associação de moradores que contestava a empreitada projectada para aqueles terrenos. Depois do caso passar pelos tribunais, o promotor da obra de construção de um lar de luxo e de uma área de serviços com mais de 7 mil metros quadrados em terrenos localizados na Foz Velha, em zona classificada como Conjunto de Interesse Público, desistiu do projecto original para redesenhá-lo de forma a cumprir os requisitos da área geográfica em que se enquadra.
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Já há um desfecho para o processo da Quinta de Montebelo que agrada a associação de moradores que contestava a empreitada projectada para aqueles terrenos. Depois do caso passar pelos tribunais, o promotor da obra de construção de um lar de luxo e de uma área de serviços com mais de 7 mil metros quadrados em terrenos localizados na Foz Velha, em zona classificada como Conjunto de Interesse Público, desistiu do projecto original para redesenhá-lo de forma a cumprir os requisitos da área geográfica em que se enquadra.
“Uma vitória para a sociedade civil”, é assim que descreve este desfecho Francisco Vellozo Ferreira, advogado da Associação de Moradores e Amigos da Foz Velha (AMA – Foz Velha), que há cerca de cinco anos mobilizou-se para travar uma obra que não estaria de acordo com a portaria que classificava aquela área classificada do Porto.
Após suspensão da obra, recursos na justiça e processos paralelos, o promotor estrangeiro redefiniu as suas intenções para os terrenos da Quinta de Montebelo. Onde ia nascer um lar de luxo construído em altura e uma área de serviços que ocuparia 7 mil metros quadrados, vão agora ser construídas “moradias unifamiliares” com “rés-do-chão e primeiro andar”, cumprindo os requisitos do enquadramento geográfico em que se insere.
Termina assim nas últimas semanas o processo nos tribunais, onde chegou requerimento conjunto das partes - promotor, autarquia, Ministério da Cultura e AMA - por não haver mais matéria a decidir em sede de julgamento.
“Este é um processo que reflecte o que são as sociedades contemporâneas. Nas sociedades contemporâneas o Estado, por via das diversas entidades que têm obrigação de tutelar e defender estes interesses, muitas vezes não está lá e falha. E é a sociedade civil que se organiza para intervir e defender estes bens e estes valores que são constitucionalmente protegidos como é o caso do património ou do ambiente”, sublinha o advogado da associação de moradores que considera a mobilização da AMA um “caso lapidar de sucesso”, quando, afirma, “as entidades que o deveriam ter feito não o fizeram correctamente e em tempo”.
Câmara autorizou obra sem parecer da tutela
À data do início dos trabalhos, a obra avançou com autorização da câmara sem o parecer vinculativo favorável obrigatório por parte da Direcção Regional de Cultura do Norte e da Direcção Geral de Património Cultural. Na sequência do arranque da empreitada a associação de moradores alertou as entidades envolvidas antes de intentar acção judicial. Com a aprovação do loteamento por parte da autarquia, em 2018 a associação avançou por via judicial e intentou uma providência cautelar, decidida favoravelmente, levando à suspensão da obra. O promotor recorreu, mas o recurso confirmou a decisão da primeira instância.
Perante esta situação, explica Vellozo Ferreira, o promotor da empreitada “terá decidido prosseguir outra via”, abandonando o projecto original que punha em causa a paisagem urbana daquela zona, optando por projecto adequado à portaria da classificação. “O promotor desiste de fazer o que tinha anteriormente previsto e passa a fazer um projecto de construção de casas de rés-do-chão e primeiro andar”, avança. Obrigado está também a repor para o original parte da obra que já tinha avançado, nomeadamente no caso de uma das duas casas do terreno que já tinha sido parcialmente demolida.
“Em dado momento a câmara municipal permitiu a edificação de construções que não se coadunavam com o património classificado, recusou-se a defender esse património classificado e os cidadãos manifestaram-se junto de um tribunal que num estado de direito é quem assegura e acautela estas situações. O resultado agora está aqui”, conclui o advogado da AMA.
Contactada pelo PÚBLICO a autarquia diz que o acordo com o promotor foi possível pela aprovação deste novo projecto pelo município. Na sequência disso, “a associação desistiu integralmente de todos os pedidos formulados”. “Esta acção tinha como objecto a impugnação de um acto de licenciamento. No decurso da acção judicial, o proprietário e réu na acção veio apresentar um novo pedido de licenciamento, distinto do inicial, o qual foi aprovado e emitida a respectiva licença”, lê-se na resposta enviada pela câmara, que sublinha: “Foi o próprio requerente que alterou a sua pretensão relativamente ao edifício em causa”.
Autarquia insiste em processo contra presidente da associação da Foz Velha
O acordo para as obras nos terrenos da Quinta do Montebelo já chegou a um desfecho, mas há ainda um processo paralelo em recurso no tribunal. O alvo desse processo é Fernando Braga de Matos, presidente da direcção da Associação de Moradores e Amigos da Foz Velha (AMA – Foz Velha).
Já a associação se mobilizava para travar a construção do lar de luxo na quinta quando o promotor da obra faz chegar à autarquia uma queixa contra o presidente da associação por alegadamente ter levado a cabo construções ilegais no terreno da sua casa, situada junto à quinta. A câmara pediu vistoria à residência de Braga de Matos, que foi recusada pelo Tribunal Administrativo. A autarquia recorreu, mas o recurso voltou a confirmar a inconstitucionalidade do pedido.
Após declarações do presidente da AMA no JN e no PÚBLICO, na sequência desta queixa, a autarquia moveu um processo por ofensa colectiva à câmara. O Ministério Público decidiu arquivar o processo, mas a câmara requereu abertura de instrução. O juiz entendeu que o processo não devia prosseguir.
De acordo com a autarquia, o município recorreu do despacho de não pronúncia do arguido. O recurso foi admitido, por despacho de 4 de Setembro de 2020, tendo subido ao Tribunal da Relação do Porto, pelo que se encontra a aguardar o ulterior processual.