Vacinação contra covid-19: lares já estão a recolher, enviar dados e a acautelar consentimentos
Nem representantes de lares, nem tutela adiantam números concretos sobre quantas instituições foram contactadas e pessoas que querem ser vacinadas, mas processo está em curso.
O levantamento dos dados sobre os utentes e funcionários dos lares, que começarão a ser vacinados contra a covid-19 em Janeiro, está em curso. Dentro do sector, há quem já tenha enviado às entidades competentes dados sobre as pessoas que querem ser imunizadas, estando ainda a recomendar-se, por iniciativa de algumas estruturas representativas do sector, a existência de consentimentos em declarações assinadas. Há, no entanto, relatos de que o processo não está a ser “uniforme” em todas as regiões do país.
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O levantamento dos dados sobre os utentes e funcionários dos lares, que começarão a ser vacinados contra a covid-19 em Janeiro, está em curso. Dentro do sector, há quem já tenha enviado às entidades competentes dados sobre as pessoas que querem ser imunizadas, estando ainda a recomendar-se, por iniciativa de algumas estruturas representativas do sector, a existência de consentimentos em declarações assinadas. Há, no entanto, relatos de que o processo não está a ser “uniforme” em todas as regiões do país.
O presidente da Associação de Apoio Domiciliário de Lares e Casas de Repouso (ALI), João Ferreira de Almeida, já respondeu, “na passada sexta-feira, que era a data limite”, ao email do Centro Distrital de Lisboa da Segurança Social, com dois mapas em excel, pedindo informações sobre os utentes e funcionários do lar que dirige em Oeiras. Entre outros aspectos, foi-lhe perguntado “se tinham comorbilidades”, se estavam acamados, e se aceitavam ser vacinados. “Estive a ver com o nosso médico, pessoa a pessoa, o quadro clínico de cada utente. No meu caso, todos os utentes têm indicação para serem vacinados. E tinha uma coluna em que tínhamos de declarar se as pessoas aceitavam ou não. Todos aceitaram, mas é uma situação delicada no caso das pessoas com demência, foram os familiares a indicarem se queriam.” No lar que dirige, com 16 utentes, metade sofre de demência. A ALI “recomendou a todos os membros que obtivessem da parte dos utentes ou familiares e funcionários uma declaração escrita, e assinada, a dizer se autorizam ou não a administração da vacina”.
O gabinete de imprensa do Instituto da Segurança Social esclareceu que, “tendo em vista o início do processo de vacinação covid-19, e a definição dos respectivos grupos prioritários, em que se incluem os residentes em lares e os profissionais que neles trabalham, o Ministério da Saúde (MS), através das ARS [administrações regionais de saúde], solicitou aos centros distritais de Segurança Social o envio da listagem de utentes e funcionários dessas estruturas”: “Neste momento, os centros distritais estão a contactar todos os lares do sector social e lucrativo. O processo de vacinação terá início no mês de Janeiro”, lê-se na resposta enviada ao PÚBLICO.
A esta informação, o MS acrescentou que “todas as estruturas residenciais para idosos (ERPI) serão contactadas pelas unidades de saúde públicas, pelos cuidados de saúde primários, pelos serviços da segurança social ou por outras entidades, de modo a garantir que todos os residentes em ERPI sejam convocados para a vacinação”. E que o MS “respeitará as normas em vigor actualmente aplicáveis às matérias de consentimento informado”.
O presidente da União das Misericórdias Portuguesas, Manuel Lemos, nota que, apesar de “a maior parte dos pedidos que chegaram às misericórdias” terem sido para se “fazer um levantamento do número de utentes e de funcionários”, por ser necessário “uma análise mais fina” sobre estes dados, foi aconselhando as instituições a, “paralelamente”, obterem também o “consentimento das pessoas”: “No caso das pessoas que têm representantes legais, os lares das misericórdias já estão a contactar esses familiares. Os serviços jurídicos de cada misericórdia preparam o documento necessário para as pessoas assinarem.”
Manuel Lemos diz, porém, que os pedidos que chegaram às misericórdias não serão todos iguais: “Nós até pedimos ao Ministério Trabalho, Solidariedade e Segurança Social que pedisse ao MS para os uniformizar. Isto não é uma crítica. Uns pedidos são mais complexos do que outros. Não vi os pedidos todos, são 392 misericórdias, mas sei que divergem, uns pedem mais dados do que outros.”
De qualquer forma, considera que o processo está “em boa velocidade”: “Muitas misericórdias, diria que a maioria, já foram contactadas e até já enviaram dados para as ARS, mas, para já, só o levantamento de quantas pessoas lá residem e trabalham, embora já se esteja a perguntar quem quer ser vacinado. [As instituições] são autónomas, a união tem um papel de aconselhamento, para poupar tempo disse para perguntarem já quem quer ser vacinado.”
O presidente da Confederação Nacional das Instituições de Solidariedade (CNIS), Lino Maia, diz que, de acordo com as informações de que dispõe, o processo “não está a ser uniforme em todo o país”: “Os lares estão a ser contactados para identificar números de utentes e colaboradores para serem vacinados. Não em todo o país, no Norte as coisas estão mais demoradas. No Centro, Sul e na zona do Porto já está a acontecer, mas no interior norte penso que avançará nestes dias.”
Ainda de acordo com a informação que tem sobre as instituições abarcadas pela CNIS, os lares estão a responder aos pedidos das ARS para se “quantificar” o número de pessoas residentes e colaboradores. Ao mesmo tempo, a CNIS acautelou, por sua iniciativa, a questão do consentimento, enviando já um modelo às instituições para as pessoas ou os representantes assinarem. Apesar de reconhecer que a questão “não é consensual”, a CNIS decidiu avançar com um modelo, “para não haver problemas”: “Nas pessoas com demência, alguém tem a tutela sobre a pessoa e, nesse caso, será a pessoa que acompanha que presta a declaração”, diz Lino Maia. Porém, ressalva: “A CNIS forneceu o modelo de consentimento informado. Agora cada instituição é que faz o contacto directo com as ARS, enviando os dados pedidos e, se assim o entenderem, perguntando já às pessoas se querem tomar a vacina. A CNIS não orienta o processo.”
Reunião com ministra
Lino Maia está, no entanto, “confiante” de que o processo de vacinação vai decorrer bem: “Estou esperançado, é evidente que me apetecia usar a célebre frase de que prognósticos só no fim…”, diz, sublinhando que, na última reunião, na segunda-feira, que tiveram com o Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, na qual marcaram presença a União de Misericórdias, a Confecoop [Confederação Cooperativa Portuguesa], e a União das Mutualidades Portuguesas, esteve presente a ministra da Saúde. Abordou-se também o tema da vacinação e a CNIS informou que já estava a avançar com uma declaração de consentimento.
Os pormenores deste processo de vacinação deverão ser definidos numa norma da DGS, incluindo a possibilidade de ser pedido um parecer ao Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida sobre o consentimento esclarecido das pessoas com demência – uma recomendação ao Governo do coordenador da task force. Na segunda-feira, ao PÚBLICO, fonte do Ministério da Saúde afirmou que “as questões de consentimento livre e esclarecido” serão consideradas naquela norma, e que a DGS “submeterá a respectiva proposta de audição da CNECV, caso o considere necessário e/ou adequado”.
Em entrevista ao PÚBLICO, Francisco Ramos já tinha afirmado que se pretende “ir a todos os lares em Janeiro e Fevereiro”: “A expectativa é que, só em Janeiro, se consiga atingir 75% das pessoas residentes em lares”.
Segundo dados avançados anteriormente, o 1.º grupo, prioritário, deverá ser constituído por 250 mil funcionários e residentes em lares ou internados em unidades de cuidados continuados, 300 mil profissionais de saúde, das forças de segurança, das Forças Armadas e de outros serviços críticos e 400 mil pessoas a partir dos 50 anos com doenças de risco, como insuficiência cardíaca.