Israel vai a eleições pela quarta vez em dois anos
A campanha será muito diferente das três anteriores pela descida do partido de Benny Gantz. A grande incógnita é se algum candidato de um partido de média dimensão irá emergir como o principal concorrente contra Netanyahu.
Israel vai ter eleições antecipadas depois de não ter havido acordo para aprovar o orçamento deste ano. Falhou ainda a tentativa de separar a aprovação do orçamento da dissolução imediata do Parlamento. À meia-noite de terça-feira (22h em Portugal continental), terminou o prazo para haver entendimento e o Parlamento dissolveu-se, abrindo caminho a eleições antecipadas. Vão ser as quartas em dois anos.
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Israel vai ter eleições antecipadas depois de não ter havido acordo para aprovar o orçamento deste ano. Falhou ainda a tentativa de separar a aprovação do orçamento da dissolução imediata do Parlamento. À meia-noite de terça-feira (22h em Portugal continental), terminou o prazo para haver entendimento e o Parlamento dissolveu-se, abrindo caminho a eleições antecipadas. Vão ser as quartas em dois anos.
Yohanan Plesner, presidente do Israel Democracy Institute (IDI), lamentou que Israel esteja a ganhar “a medalha de ouro da instabilidade política”, numa conferência por zoom com jornalistas para analisar as próximas eleições de 23 de Março. “Quando olhamos para a frequência de eleições parlamentares desde 1996, Israel está em primeiro com 2,3 anos de tempo médio entre eleições, seguido de Espanha com três anos, 3,8 anos o Reino Unido e 4,4 a Itália, que tem uma reputação de instabilidade política.”
O que está a levar a esta instabilidade é, por um lado, o próprio sistema eleitoral de Israel, que na sua opinião devia ser reformado, e por outro, ao actual primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu. “O processo de corrupção contra Benjamin Netanyahu é o factor dominante na política israelita nos últimos dois anos. Foi a razão para termos tido três eleições consecutivas, e é a razão para a quarta”, sublinhou Plesner.
“Não queríamos eleições, mas vamos ganhar”, reagiu Netanyahu, que tem como alcunha “o mágico”, por conseguir vencer, ou empatar, eleições em que se previa a sua derrota.
Ainda que daqui até Março haja muitas incógnitas, é até agora claro que “vamos entrar nesta eleição com uma vantagem clara para a direita, por um lado, mas também, por outro, com a possibilidade cada vez maior de uma coligação que se recuse a cooperar com Netanyahu”, nota Plesner.
A grande diferença desta quarta eleição para as três anteriores é o desaparecimento de um concorrente óbvio de Netanyahu, Benny Gantz. A coligação com Netanyahu e as divergências internas do seu partido, Azul e Branco, deixam antever o mau resultado e as sondagens apontam o partido em trajectória descendente (a mais recente dá-lhe apenas entre quatro a cinco deputados, nas eleições anteriores elegeu 30 em 120).
“Há um campo muito pouco heterogéneo de partidos médios que estão num campo “anti-Bibi” (Netanyahu é conhecido pelo diminutivo do primeiro nome) e não é claro se vai emergir de algum destes um concorrente claro” como foi Gantz nas eleições anteriores, sublinha o analista. Entre eles estão três antigos aliados de Netanyahu. As atenções têm-se concentrado no mais recente a avançar, Gideon Saar, que foi até Dezembro do mesmo partido, o Likud (e antes desafiou Netanyahu em primárias, que perdeu), e agora fundou um novo partido. E há ainda Naftali Bennet e Avigdor Lieberman, da direita nacionalista, que fizeram parte de Governos de Netanyahu para depois se tornarem seus rivais amargos. Finalmente no campo do centro-esquerda está Yair Lapid, que teve uma aliança com Gantz.
Em Janeiro deverá haver intensas negociações entre os partidos para potenciais fusões, cisões, ou listas conjuntas antes da entrega obrigatória das listas no início de Fevereiro. Lieberman tem pressionado para uma união da oposição contra Netanyahu.
Se tivesse de apostar, Plesner arriscaria nomear Gideon Saar, que saiu do Likud no início do mês, depois de há um ano ter sido o candidato contra Netanyahu para liderar o partido e “acabar com o impasse”. Plesner nota, no entanto, que se isto acontecer será uma situação “estranha” porque Saar é semelhante a Netanyahu, muito associado a uma direita apoiada pelos colonos, e defende muitas das coisas que Netanyahu defende neste momento, “incluindo uma reforma da Justiça embora sem os elementos destrutivos da abordagem de Netanyahu”, que pretende influenciar o processo contra ele.
Mas mesmo numa posição “anti-Bibi”, “o nível de compromisso” com esta ideia será também sempre submetido a teste no dia seguinte às eleições, lembra Plesner – foi a quebra desse compromisso de Gantz uma das razões para algumas saídas do seu partido e para a sua perda de importância.
A partir de agora, Netanyahu será, de novo, primeiro-ministro de um governo de transição. No entanto, por causa do cauteloso acordo de coligação com Gantz, Bibi só poderá mexer na sua parte do Governo, mantendo-se Gantz encarregado da metade do seu partido, até que tome posse um novo Governo.
A campanha decorrerá simultaneamente com o processo judicial, que recomeça no início de Fevereiro e em que são esperadas audiências em “três de cinco dias da semana”, portanto será possível que “os israelitas vejam o primeiro-ministro a entrar no tribunal” enquanto faz campanha, o que torna “o conflito de interesses cada vez mais presente”, sublinha o responsável do IDI.
Esta quarta-feira foi anunciado que a juíza encarregada do processo, Rivkah Friedman-Feldman, está infectada com o coronavírus e tem uma versão com sintomas ligeiros de covid-19. Friedman-Feldman terá de estar isolada pelo menos até 1 de Janeiro, mas do decorrer da doença depende se poderá manter-se a sessão de 13 de Janeiro, que seria a última antes de começarem a ser chamadas testemunhas.
Haverá ainda uma outra diferença em relação às campanhas anteriores: “O facto de Donald Trump já não estar na Casa Branca retira a Netanyahu um dos seus ‘trunfos’, que o ajudaram nas campanhas anteriores”, refere Plesner. Ainda que Netanyahu e Joe Biden tenham uma relação antiga, “ainda vamos ter de ver até que ponto” é que Biden decidirá intervir nas eleições.
A pandemia, o factor mais óbvio de influência nas eleições, poderá mudar, já que o país está a levar a cabo uma grande campanha de vacinação e se estima que em Março a maioria das pessoas de maior risco estarão vacinadas. Mas por outro lado ainda não é certo se não terá de haver mais medidas de confinamento, que afectarão ainda mais a economia – esta segunda-feira, registaram-se mais 3594 novos casos de infecção. Finalmente, ainda que a aprovação da gestão da crise da covid-19 de Netanyahu seja baixa, os 37% que tem agora são mais do que os 29% que registou entre Julho e Setembro.