Cerca de 600 portugueses tornaram-se também espanhóis em 2019
Efeito “Brexit” fez disparar emigração para o Reino Unido, enquanto Angola e Alemanha se tornaram países menos atractivos. Neste último caso fenómeno estará relacionado com regressos.
Houve quase 600 portugueses que também se tornaram espanhóis em 2019, revela o mais recente Relatório da Emigração, apresentado esta segunda-feira no Ministério dos Negócios Estrangeiros pelo coordenador científico do Observatório da Emigração, Rui Pena Pires. Espanha permite nestes casos a dupla nacionalidade.
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Houve quase 600 portugueses que também se tornaram espanhóis em 2019, revela o mais recente Relatório da Emigração, apresentado esta segunda-feira no Ministério dos Negócios Estrangeiros pelo coordenador científico do Observatório da Emigração, Rui Pena Pires. Espanha permite nestes casos a dupla nacionalidade.
Não sendo, em termos absolutos, o país que mais portugueses escolheram como de adopção, Espanha é claramente aquele que mais cresceu nessa matéria: em 2018, o número de portugueses que haviam adquirido a nacionalidade espanhola tinha totalizado apenas 377, mesmo assim mais 179.3% do que no ano anterior. Em 2019 esse crescimento é da ordem dos 58%, muito acima dos restantes principais destinos da emigração portuguesa – Reino Unido, França e Alemanha. A explicação para o sucedido não é clara, nem sequer para Rui Pena Pires: “Não sabemos muito bem o que se está a passar”.
Explicando que a emigração portuguesa para Espanha se faz em contraciclo com os outros destinos europeus - uma vez que os cenários económicos dos dois países têm evoluído a par e passo -, o investigador adianta uma hipótese: a de parte destes emigrantes serem, afinal, luso-descendentes nascidos na Venezuela e empurrados para o país vizinho pela crise que grassa por terras de Nicolás Maduro.
Mas o destino que mais lusitanos recebeu no ano passado, ultrapassando a barreira das dez mil entradas, foi mesmo o Reino Unido, muito pelo efeito do “Brexit” - aquilo que Rui Pena denomina como “tentativa de emigração de última hora”. Já a Suiça perdeu a sua atractividade: desde 2001 que o número de portugueses entrados neste país não era tão baixo.
“Em comparação com o ano anterior, verificou-se um aumento no número de entradas superior a 30% no Reino Unido, país este que tinha verificado uma diminuição constante no número de entradas de portugueses desde 2015. Aumentou igualmente, embora em valores menos expressivos, o número de entradas de portugueses para a Holanda (18.4%), Brasil (11.7%) e Dinamarca (11.4%). No extremo oposto há que destacar Angola (menos 35.5%) e a Alemanha (menos 19.7%). Espanha, que manteve uma ordem crescente desde 2014, sofreu, pela primeira vez desde esse ano, uma quebra no número de entradas de portugueses (-4.5%)”, pode ler-se no relatório.
E se no caso da Alemanha o fenómeno pode ser explicável pelo facto de o número de portugueses que estão a entrar anualmente neste país não compensar retornos e fenómenos de re-emigração, já no de Angola tudo parece ficar a dever-se aos efeitos recessivos da crise dos preços do petróleo e suas consequências sobre os sectores do mercado de trabalho para onde se dirigia a emigração portuguesa.
Voltando aos pedidos de nacionalidade, no Reino Unido, que é o terceiro país do mundo onde residem mais portugueses emigrados, o número de portugueses que adquiriu a nacionalidade britânica no ano passado totalizou os 2227, o que representa um aumento de 16.8% em relação a 2018. Mas merece também destaque atendendo ao número de expulsões registadas. De acordo com dados oficiais das autoridades britânicas, em 2019 foram expulsos ou afastados um total de 223 cidadãos portugueses, mais 74 que em 2018. Este número inclui expulsões por antecedentes criminais (no final do cumprimento das respectivas penas ou ao abrigo de mecanismos de libertação antecipada) e expulsões administrativas (resultantes do não preenchimento dos requisitos para o exercício da livre circulação de pessoas, designadamente a falta de meios de subsistência).
Rui Pena Pires estima que o coronavírus possa trocar as voltas às tendências migratórias que vinham a fazer-se sentir nos últimos anos, e que apontam para cerca de 75 a 80 mil saídas anuais. Mas vai preciso esperar por Janeiro, pelas estimativas do Banco Mundial, para saber se a redução das remessas dos emigrantes já começou a fazer-se sentir, como sucedeu em 2009, na sequência da crise que se fez sentir.
Da mesma forma, também é expectável que a imigração para Portugal desça como consequência da pandemia. Portugal já tem, de resto, uma taxa muito baixa de residentes nascidos fora do território nacional, se comparado com outros países europeus, sublinhou Rui Pena Pires: apenas 6%. Há membros da União Europeia em que essa fasquia se situa nos 15%. “Portugal tem uma enorme margem de crescimento da sua imigração”, observou o coordenador científico do observatório.
O relatório diz mesmo que a conjugação de alta emigração e baixa imigração, em termos acumulados, “situa Portugal no conjunto dos países europeus de repulsão”, onde se encontram também a Lituânia, Roménia, Bulgária e Polónia.