A adaptação é o segredo do sucesso da revolução europeia dos transportes

O plano de recuperação europeu inclui um pacote de incentivos de 1,8 biliões de euros para apoiar esta reconstrução, e o sector do transporte será um dos beneficiários. Projectos com valor acrescentado a nível social, ambiental e económico serão considerados prioritários para os vários fluxos financeiros.

Ver os aviões carregados de vacinas sobrevoarem o Atlântico há uns dias foi como começar de novo. Com o nascer do sol, renasceu igualmente a confiança do mercado e um novo sentimento de optimismo.

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Ver os aviões carregados de vacinas sobrevoarem o Atlântico há uns dias foi como começar de novo. Com o nascer do sol, renasceu igualmente a confiança do mercado e um novo sentimento de optimismo.

Ultrapassámos os dias negros da primavera, quando camiões partiam da Lombardia, na altura o epicentro do coronavírus no nosso continente, transportando kits de testes para onde quer que fossem necessários. E eram necessários em muitos lugares, por toda a Europa. Esses camiões foram uma tábua de salvação para o sistema de saúde, ajudando-o a fazer face à nova realidade.

Apesar da mudança praticamente diária das restrições internacionais de viagem, os navios continuaram a atracar em portos europeus, carregados com os componentes e as matérias-primas de que as fábricas europeias necessitavam para manter as linhas de produção a funcionar. 

Podia fazer uma lista interminável dessas situações; só afirmaria o que é evidente: o transporte é a espinha dorsal da nossa economia e fortalece o nosso mercado único. 

Pode ter sido a imagem de aviões que nos deu esperança, mas não esqueçamos que estes são parte de uma indústria que ainda não vê a luz ao fundo do túnel

Em 9 de Dezembro, lançámos a nossa estratégia de mobilidade sustentável e inteligente, criando as condições para reformas fundamentais no nosso sistema de transportes. Muitos podem perguntar-se se esta é realmente a altura ideal para as fazer. 

A verdade é que muitas vezes a crise despoleta a mudança, ao revelar-nos os defeitos de um sistema. Como dizia Churchill, com bastante cinismo, “nunca desperdiçar uma boa crise”. 

Agora que estamos a reconstruir, temos de encarar o processo de reconstrução como uma oportunidade de mudança. Uma mudança que dê à industria europeia nas diferentes cadeias de valor a possibilidade de se modernizar, criar novos empregos de alta qualidade, desenvolver novos produtos e serviços e aspirar a uma posição de liderança mundial.

O plano de recuperação da Europa da UE inclui um pacote de incentivos de 1,8 biliões de EUR para apoiar esta reconstrução, e o sector do transporte será um dos beneficiários. Projectos com valor acrescentado a nível social, ambiental, económico e da UE serão considerados prioritários para os vários fluxos financeiros.

Contudo, a Europa já é líder em certas tecnologias de transporte. 

A industria da aviação procura, por todo o mundo, alcançar uma maior eficiência, e um sistema inovador de gestão do tráfego aéreo reduziria tanto os custos como as emissões. A Europa é pioneira na digitalização da gestão do tráfego aéreo, e Örnsköldsvik, no norte da Suécia, é o primeiro aeroporto a utilizar uma torre de controlo digital. Os centros de controlo virtuais não têm o estilo arquitectónico icónico das torres aeroportuárias, mas isso é compensado pelas suas tecnologias de ponta. Na prática, câmaras de alta definição posicionadas no aeródromo, combinadas com sensores e gráficos sobrepostos, constroem uma imagem “fora da janela” dos aeroportos (por exemplo, indicando a presença de bandos de pássaros) que é usada pelos controladores. Esta tecnologia pode ser uma ajuda decisiva para os aeroportos mais pequenos e aos aeroportos regionais, que são hoje particularmente vulneráveis, uma vez que têm de manter o controlo do tráfego aéreo apesar de não haver tráfego praticamente nenhum.

A nossa estratégia define o objectivo de reduzir as emissões dos transportes em 90% até 2050. Contudo, o mercado já transformou estas aparentes restrições em oportunidades. A Airbus anunciou em Setembro três conceitos para a primeira aeronave comercial sem emissões do mundo – ZEROe – e prevê ter pelo menos uma pronta para ser utilizada até 2035. 

Estima-se que 14,4 milhões de aviões descolarão em 2035, pelo que a ZEROe e a gestão virtual do tráfego aéreo, para citar apenas duas inovações europeias no sector da aviação, não são apenas uma mera ambição, mas sim uma necessidade. 

Em 2019, a Bélgica testou uma embarcação não tripulada. Esta é outra inovação que nos ajudará a alcançar os nossos objectivos de sustentabilidade e digitalização e, ao mesmo tempo, a demonstrar a competitividade do nosso sistema de transportes. O grupo de transporte De Cloedt dirigiu o navio sem tripulação pela rota do canal Diksmuide-Ostend a partir dum centro de controlo. 

Desde fabricantes de navios e aviões a produtores de combustíveis alternativos, desde portos a entusiastas da inteligência artificial, todos estão a considerar o seu papel no sistema de transportes do futuro. E todos terão um papel a desempenhar: todos os modos de transportes continuarão a existir, uma vez que todos são fundamentais para a conectividade europeia e para manter o mercado europeu único e as cadeias de abastecimento a funcionar. Contudo, como a estratégia deixa claro, todos os modos de transporte têm de modernizar as suas frotas.

Apoiaremos a renovação das frotas para ajudar a manter a prosperidade de ecossistema de fabrico em áreas onde a Europa tem uma vantagem tecnológica estratégica, como as indústrias de fabrico de aviões, comboios e navios. Isto aumentará a possibilidade de se criar uma capacidade de produção e cadeias de valores adequadas na indústria transformadora europeia, preservando assim a nossa liderança tecnológica.

Como disse Charles Darwin, “Não é a espécie mais intelectual que sobrevive; não é a espécie mais forte que sobrevive. A espécie que sobrevive é aquela que é capaz de se adaptar e de se ajustar melhor ao ambiente em constante mudança em que se encontra”. O mundo empresarial não é muito diferente. É preciso coragem para alterar uma fórmula vencedora, mas as empresas europeias têm de demonstrar esta coragem à medida que a procura e a tecnologia mudam. Se o fizerem, a maioria terá lugar no sistema de transportes inteligente e sustentável do futuro.